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SIOUXSIE SIOUX - SOPROS DE VIDA

Grandes homens, assim como grandes tempos são um material explosivo interior do qual uma força imensa é acumulada (....)

“DISCO DA BANANA”- A OBRA PRIMA IGNORADA

Eu sabia que a música que fazíamos não podia ser ignorada

SEX PISTOLS - UM FENÔMENO SOCIAL

Os Sex Pistols foram uma das bandas de Rock mais influentes da história.

ATÉ O FIM DO MUNDO

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AFINAL, COMO SURGIU O CINEMA?

Um breve questionamento e historio sobre o assunto.

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WOLF CITY - AMON DUUL II

Wolf City é um dos maiores clássicos do Rock Progressivo. É um álbum que celebra magicamente este gênero musical, e que é foi gravado por artistas imensamente talentosos

sábado, 16 de março de 2024

COMO O DEVO E VOLTAIRE NOS AJUDAM A PENSAR SOBRE O MUNDO ATUAL

 Por Juliana Vannucchi

O Devo foi uma das bandas mais inovadoras dos anos setenta. Seus primeiros passos foram dados precisamente em 1974, e os embriões do grupo foram Gerald Casale e Mark Mothersbaugh, dois estudantes do curso de Arte da Universidade de Kent, em Ohio.

A grande chance do Devo engrenar veio com a trilha do curta-metragem no qual estrelaram, chamado “The Truth About De-Evolution”, que ganhou um prêmio no Festival de Cinema de Ann Arbor, em 1976. Quando o filme foi visto por David Bowie e Iggy Pop, os dois ficaram impressionados com o Devo e asseguraram para a banda um contrato com a gravadora Warner Bros. Foi assim que, com o produtor Brian Eno, o disco de estreia “Q: Are We Not Men? R: Qe Are Devo” ganhou vida. A partir disso, o grupo deslanchou numa carreira que foi feita mais de acertos do que de erros. De maneira geral, toda a trajetória do Devo foi brilhante e inspiradora.

No pano de fundo das origens do Devo, encontrava-se o conceito de “de-volução”, segundo o qual a humanidade, após chegar ao seu nível mais alto de evolução, iniciou um processo de declínio. Através de suas produções musicais, o Devo mostra que, de acordo com essa concepção, o ser humano, conforme vai se tornando mais decadente, apresenta um comportamento mecânico e pensamentos uniformes. Semelhantes a robôs, os homens da “de-volução” são revestidos por uma alienação comprometedora. Não mais pensam por si mesmos e não escolhem nada de maneira autônoma, sendo sempre condicionados por terceiros, além de estarem sempre imersos num estado de profunda alienação. Trata-se de um regresso preocupante. Numa entrevista concedida em 2019, Mark Mothersbaugh disse que na época em que essa ideia foi desenvolvida, ele pensava que a dupla estava paranoica. Contudo, lamenta perceber que tal concepção se concretizou e, na mesma entrevista, Gerald Casale comenta que as previsões que fizeram não apenas se efetivaram, mas também simplesmente superaram os seus medos. O baixista ainda reflete a respeito de nossos tempos: “(...) são 7 bilhões de pessoas no planeta e o caos reinando como o principal fator de como as pessoas tomam decisões - o caos e o medo”. Mark complementa a consideração filosófica de seu colega de banda e emenda: “E está se multiplicando rapidamente. São 7 bilhões de pessoas, indo cada vez mais rápido, e não estamos aprendendo nada."

 

O conceito de de-volução trabalhado pelo Devo parece ter canalizado com maestria o temor de Voltaire, ao mostrar que o ser humano está perdendo sua capacidade de reflexão autônoma.
 

Voltaire, um dos maiores nomes do Iluminismo, viveu muito antes de os meninos do Devo. Em suas obras, o espirituoso pensador francês não abordou a “de-volução”, no entanto, ele sempre se mostrou preocupado com a incapacidade que alguns de seus contemporâneos tinham de pensar por si mesmos, sem serem instrumentalizados por instituições como o Estado e a Igreja. Voltaire prezava pela liberdade de pensamento e pelo fortalecimento do senso crítico, que poderiam ser alcançados se as pessoas fizessem bom uso da razão. Não à toa, certa vez escreveu: “Ouse pensar, amigo” – frase simples, curta, mas arrebatadora! Por meio de seus livros, tinha como um de seus principais objetivos fazer com que as pessoas despertassem e, dessa forma, rompessem as amarras que escravizavam suas mentes. Voltaire ensina que para exercitar o racionalismo crítico seria preciso vencer a superstição, que ele caracteriza como sendo uma “doença do espírito”, e o fanatismo, definido como uma espécie de seita que torna o homem firmemente convicto sobre algo, deixando-o tolo, horrível e beirando a irracionalidade. Além disso, prega que devemos sempre exercitar a tolerância, definida por ele como o “apanágio da humanidade” e cuja prática, em suma, consiste em não ser impiedoso, não perseguir nem transformar o diferente em inimigo. Tolerar é apaziguar discórdias e perdoar a própria tolice, pois segundo o iluminista francês, todo ser humano está sujeito ao erro, a fraquezas e à mutabilidade. É neste ponto que o célebre iluminista e a banda se encontram: o conceito de de-volução trabalhado pelo Devo parece ter canalizado com maestria o temor de Voltaire, ao mostrar que o ser humano está perdendo sua capacidade de reflexão autônoma, sendo cada vez mais controlado pelo sistema tradicional vigente que existe ao seu redor e mostrando-se cada vez mais cego em seu fanatismo, alienado em sua superstição e mais intolerante. 

O que Voltaire não imaginava era que o ser humano não seria unicamente dirigido por instituições como Igreja e Estado, mas também por novos “ídolos”, como consumismo e tecnologia. Isso porque em nossos tempos, além das instituições tradicionais que nos prendem, também somos asfixiados pelas mídias sociais e pelo sistema capitalista. De acordo com o conceito de “de-volução”, estamos cada vez menos civilizados e sentindo o efeito desumanizador da tecnologia. O homem carece cada vez mais de autenticidade, e vemos as pessoas cada vez mais “enlatadas”, isto é, mais parecidas umas com as outras, mais “robóticas” - não à toa o Devo utilizava uma estética futurista em suas apresentações, justamente para mostrar o quanto os homens seriam todos iguais futuramente. Acertaram em cheio: os padrões de beleza, as intervenções estéticas, as roupas e a internet tendem a padronizar não apenas a aparência das pessoas, mas seus comportamentos e pensamentos. Elas parecem sair programadas de fábricas. 

Aqui, vale citar que Voltaire também atribuía um valor imenso à dúvida e ao espírito questionador. Pode-se dizer que, para ele, duvidar era mais revolucionário do que responder. Hoje, entretanto, as massas fazem cada vez menos perguntas e reproduzem cada vez mais aquilo que lhes é despejado como certeza (vide as assombrosas fake news que, aliás, serviram para consolidação da extrema-direita... Bolsonaro, numa tentativa de normalizá-las chegou, inclusive, a declarar que elas “são parte da vida”). 

A crença cega e irracional em tantas “supostas verdades” é um marco de nosso mundo. A maior parte das pessoas não está ousando pensar, não está sendo assolada pelo páthos, não confronta a realidade, não filtra e não refuta informações.  Simplesmente “copia” e “compartilha” informações sem consultar sua razão. É, Voltaire, lamento dizer, mas a realidade atual é assombrosa. 

Mestres incontestáveis do gênero art rock, o Devo criou uma prestigiosa fusão entre a atmosfera da ficção científica e um clima futurista, que contou com pinceladas surrealistas e experimentalismos sonoros. Essas combinações tão singulares confrontavam a essência da maior parte das bandas da mesma época, que seguiam a trilha do punk rock e, por isso, podemos considerar que o Devo foi uma verdadeira vanguarda musical. Ainda que tenha surgido mediante a eclosão do punk norte-americano e certamente tenha herdado alguns elementos desse movimento, a banda era excêntrica e outsider, aspectos que a levaram para outro caminho. E se tem uma coisa que acredito que ficou clara neste texto é que a banda, além de toda a primazia estética digna de admiração, postulou um alerta e fez um diagnóstico preciso de nossos tempos que, definitivamente, merece ser levado em conta. Por outro lado, temos a obra de Voltaire. Ela está aí, à nossa disposição há séculos para alertar sobre os problemas oriundos da falta da liberdade de pensamento.  É simples: “Ouse pensar, amigo”. Desconstrua, questione, ao menos tente sair da caverna! 

Referências:

DURANT, Will. A Filosofia de Voltaire. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001.

PIMENTA, Jussara Santos. Voltaire: O Versejador, o Literato, o Comunicador. PUC – Rio. Revista Eletrônica UFSJ, 2002.

RUSSELL, Bertrand. História do Pensamento Ocidental. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017.

VOLTAIRE. O Filósofo Ignorante. Porto Alegre: L&PM Editores, 2013.

VOLTAIRE. Dicionário Filosófico. São Paulo: Editora Escala, 2008. 

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2009/apr/30/devo-art-punk-80s-revival

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2010/jun/17/devo-something-for-everybody-cd-review

https://web.archive.org/web/20071011183248/http://clubdevo.com/mp/bio.html

https://kcpr.org/2019/10/21/gut-feeling-an-interview-with-devo-the-band-that-predicted-the-future/
https://www.britannica.com/topic/Devo


sexta-feira, 8 de março de 2024

OUÇA O QUE ELAS DIZEM, VEJA O QUE ELAS FAZEM: 47 MULHERES INSPIRADORAS QUE MARCARAM A HISTÓRIA DO ROCK

Por Juliana Vannucchi (organizadora e idealizadora) 

Colaboradores e músicos especialmente convidados

Felizmente, ao longo do tempo, o rock and roll nos presenteou com uma série de mulheres transgressoras, talentosas e verdadeiramente revolucionárias. Nesse contexto, há incontáveis femele bands que construíram identidades próprias, revigoraram o rock e, assim, se transformaram em verdadeiras lendas. Aqui, podemos citar honrosamente alguns desses grupos, como The Shangri-Las, The Shirelles,  Bikini Kill, The 'B' Girls, The Ronettes, Ace Of Cups, The Bangles, The Slits, The Crystals, The Runnaways e várias outras bandas arrebatadoras representadas por mulheres. Nessa lista tão especial, produzida coletivamente, listamos algumas vozes femininas que certamente são capazes de inspirar qualquer coração, transformando-se em musas, heroinas e referências a quem quer que seja. Confira!

 


 

1 - Alice Bag (Juliana Vannucchi)

A enérgica Alice Bag ganhou notoriedade nos anos setenta, durante a eclosão do punk rock norte-americano. Ao lado de duas outras mulheres dignas de destaque, Alicia Armendariz e Patricia Morrison, formou a banda The Bags, da qual foi vocalista. 

Em sua adolescência, a jovem e tímida Alice foi vítima de bullying quando estava no Ensino Médio, e isso a levou a um estado de isolamento social, no qual contava apenas com a companhia de seus heróis musicais, como Elton John e David Bowie. Nesse âmbito, a música - tanto ouvida, quanto produzida por Alice - foi uma garantia de salvação e uma tranquilizante válvula de escape. Além dis palcos, Bag, ao longo de sua vida, se afeiçoou por outras áreas, graduando-se em Filosofia e trabalhando como professora, ministrando aulas de Inglês. 

Certa vez, num evento de cunho social no qual participou como ativista, declarou que o lugar do punk no movimento feminista consiste em manter-se sempre desafiador, chamando a atenção para coisas erradas que estão, infelizmente, enraizadas na sociedade: "O punk nos permite falar o que pensamos."  Ademais, vale citar que no decorrer de sua admirável trajetória, já publicou alguns livros. Cabe nos atermos especificamente a um deles, chamado “Violence Girl” no qual, dentre outras abordagens, Bag comenta sobre como casos de violência doméstica a fizeram envolver-se com o feminismo e querer lutar contra a opressão sofrida pelas mulheres. Isso porque a violência doméstica foi tragicamente presenciada por Bag no decorrer de sua prórpia infância.

Além de tudo que já foi mencionado, a incansável Alice Bag criou e ministra um acervo digital no qual há entrevistas com diversas mulheres que marcaram presença na primeira onda da cena punk do sul da Califórnia na década de setenta. É um arquivo composto por materiais históricos vastos e preciosos, no qual há conteúdos sobre diversas personalidades, como fotógrafos, músicos e escritores que fizeram parte dessa geração.

 

Patricia Morrison e Alice Bag em ação.

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2 - Gina Birch (Neder de Paula)

Birch co-fundou a banda de pós-punk The Raincoats, em 1977, tornando-se uma figura importante na cena musical alternativa. Sua abordagem única ao baixo e sua voz distintiva contribuíram para o som inovador e experimental, que influenciou gerações subsequentes de artistas. Além de seu trabalho com a banda, Gina Birch também se envolveu em projetos solo, consolidando seu impacto duradouro na música alternativa.

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3 - Siouxsie Sioux (Juliana Vannucchi)

As contribuições culturais de Siouxsie Sioux, desde os anos 70, influenciam inúmeras pessoas nos quatro cantos do globo, seja em aspectos ideológicos, visuais ou musicais.

Os inúmeros feitos da vocalista dos Banshees são admiráveis e foram muitos. É válido mencionar alguns deles para, quem sabe assim, tentar justificar sua incomparável grandeza: Siouxsie superou muitos arquétipos, pois liderou uma banda composta por homens num período e contexto nos quais as mulheres ainda não tinham tanto espaço em cima dos palcos – sim, já existiam mulheres nos vocais, mas basta pesquisar e/ou conhecer um pouco sobre a Sioux para saber que ela deu um passo adiante nesse quesito. Foi um ícone da moda, apresentando ao público um visual ilustre, dotado de criatividade, que até hoje inspira muitas pessoas. Certamente foi uma das compositoras mais brilhantes que já conhecemos, pois as letras que escreveu abrangem temas extremamente originais e simplesmente únicos. Já colaborou com músicos grandiosos, tal como Yoko Ono, Angelo Badalamenti, Pam Hogg, Morrissey e outros.

Além disso, sempre se mostrou versátil enquanto compositora e vocalista, uma vez que os álbuns dos Banshees são bastante diversificados entre si no que tange ao aspecto sonoro e lírico e, além disso, ao lado de Budgie, no The Creatures, seguiu um rumo musical deveras peculiar – sem contar sua carreira solo, que também, em essência, se distancia tanto da musicalidade dos Banshees quanto do The Creatures.

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4 - Patricia Morrison (Fabi Bellentani) 

Ela emergiu como uma figura icônica na cena musical. Considerada um símbolo de empoderamento para uma geração de mulheres, Patricia Morrison foi mais do que apenas uma musicista talentosa: ela personificou a independência e a autoexpressão feminina.

Sua participação em bandas como The Gun Club, The Sisters of Mercy e The Damned não apenas elevou sua visibilidade, mas também proporcionou um espaço para que mulheres encontrassem sua voz em uma indústria desde sempre dominada por homens.

Também compositora, suas letras exploravam assuntos como poder, liberdade e autoafirmação, oferecendo uma narrativa alternativa à cultura dominante. Com sua combinação única de punk, rock gótico e elementos de música alternativa, ela cativou públicos com sua sonoridade distinta e suas letras provocativas.

Patricia é uma das mulheres que, sem dúvida, estão eternizadas na história da música.

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5 - Chrissie Hynde (Neder de Paula)

Ela deixou uma marca duradoura no cenário do rock como guitarrista e líder da banda The Pretenders. Hynde é aclamada por sucessos como "Brass in Pocket" e "Back on the Chain Gang", destacando-se pela combinação única de talento musical e presença carismática no palco. Sua contribuição para a música e seu papel como uma figura influente continuam a inspirar gerações de fãs e músicos.

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6 - Ann Wilson e Nancy Wilson (Juliana Vannucchi)

Uma das maiores lendas do rock and roll, Ann Wilson deixou seu nome na história por seu talento como flautista e vocalista da banda Heart. Sua irmã Nancy Wilson, foi guitarrista do mesmo grupo e também fez sucesso ao criar riffs simplesmente memoráveis. Explosivas nos palcos e refinadas no manejo de seus respectivos instrumentos, as meninas dominaram as rádios e programas de TV durante décadas, tendo hits de sucesso nos anos 70, 80 e 90. 

A banda Heart, com mais de dez álbuns de sucesso lançados ao longo de seu percurso, fez muitas pessoas chacoalharem a cabeça e, com certeza, ajudou a curar muitos corações despedaçados, tornando-se, por tais aspectos, um nome verdadeiramente consagrado no rock.

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7- Kim Gordon (Juliana Vannucchi)

Kim Gordon destacou-se especialmente como baixista do Sonic Youth, e geralmente a conhecemos somente sob tal rótulo. Contudo, acabamos por nos limitar se a considerarmos apenas através dessa perspectiva, pois ela também merece ser lembrada pela sua carreira como artista visual, na qual mostra um enorme talento. Aliás, cabe dizer que numa entrevista concedida em 2022, Gordon chegou a dizer que sempre se reconheceu mais como artista do que musicista. E em sua autobiografia, fala que se sentia limitada como cantora, sendo que justamente por isso optou por fazer uso de uma abordagem vocal falada e rítmica. Embora nunca tenha se visto como uma boa cantora ou musicista, lembra aos leitores que (...) desde o início, o rock and roll nunca teve base em formação musical ou técnica, assim como o punk rock nunca teve a ver com ser um bom músico”. (p. 137, 2015). Ainda nesse contexto, explica: “O melhor tipo de música vem quando você é intuitivo, inconsciente de seu corpo, perdendo a cabeça, de certo modo (...)”.

Certa vez, Kim fez a seguinte declaração: “As mulheres são anarquistas e revolucionárias naturais, porque elas sempre foram cidadãs de segunda classe e tiveram que fazer o seu próprio caminho”. Na autobiografia, a baixista, que sempre mostrou envolvimento com o feminismo, comenta que em geral as mulheres não têm realmente permissão para “mandar ver”, para agir como gostariam e ser o que desejam. A esse respeito, escreve: “(...) Culturalmente nós não permitimos que as mulheres sejam tão livres quanto elas gostariam e isso é assustador. Nós ou rejeitamos essas mulheres ou as consideramos loucas (...) No final do dia é esperado que as mulheres sustentem o mundo, não que o aniquilem”. (p. 137, 2015). 

Kim Gordon é uma mulher inteligente e inventiva. Devemos vê-la como uma verdadeira guerreira, sempre preparada para a luta, e sempre repleta de disposições artíticas que estão sempre pulsando dentro de seu espírito. Ela é um verdadeiro ícone cultural e provavelmente é a artista mais intelectual surgida do universo punk. É fundamental que a vejamos sob essa perspectiva que não se limita aos palcos. Precisamos de músicos militantes, pensantes, ousados e criativos como Kim.

 

Duas das principais baixistas de todos tempos: Kim Gordon e Kim Deal, respectivamente.

 

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8 - Kim Deal (Juliana Vannucchi)

Kim Deal é uma das baixistas mais conceituadas da história do rock e foi responsável por ajudar a criar alguns dos hits mais célebres da banda Pixies, aclamado grupo de rock alternativo noventista que viveu seu auge justamente no período em que Kim esteve na banda, sendo inegável que ela foi o ponto forte responsável por alavancar o grupo americano. A baixista participou das gravações dos discos “Come on Pilgrim” (1987), do glorioso e memorável “Surfer Rosa” (1988), do popular (e talvez mais qualificado da banda) “Doolittle” (1989), do primoroso “Bossanova” (1990) e, por fim, do “Trompe le Monde” (1991), sendo esse último, em termos gerais, já bem menos cativante e original do que os outros. Posteriormente, a banda se dissolveu, mas o que importa é que Kim Deal deixou em nossas memórias, uma série de inesquecíveis melodias de baixo que ela gravou com a referida banda e que são capazes de elevar qualquer ouvinte a um estado de êxtase. Seu talento é fora da curva, seu domínio instrumental e suas ideias são simplesmente extraordinários.

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9 - Marianne Faithfull (Juliana Vannucchi)

A ex-companheira de Mick Jagger foi uma das mulheres mais aclamadas e inspiradoras dos anos sessenta. Esse relacionamento com o astro dos Stones rendeu-lhe bastante fama, mas o verdadeiro sucesso obtido por Marianne Faithfull foi fruto de sua vasta e original discografia, composta por um total de mais de vinte álbuns de estúdio, nos quais encontram-se ritmos e melodias notavelmente diversificados que são maravilhosamente preenchidos pela voz de Faithfull. Em suas incontáveis letras autorais, ela descreve desejos, conflitos, sexo, perdas e outras vivências que acumulou ao longo de sua conturbada trajetória de vida. 

Força é algo que não falta a essa mulher: a incrível Marianne Faithfull já superou um câncer de mama, além de também ter enfrando um quadro grave de hepatite C, e sobrevivido a uma queda que a fez quebrar seriamente o quadril. A vigorosa e sempre motivada fera inglesa também já sobreviveu a uma grande infecção e venceu um sério quadro de anorexia. Faithfull  possui uma história de vida muito impressionante. Ela foi do glamour ao inferno, dos palcos aos suburbios... mas o fato é que ela sempre se manteve afastada das regras sociais, esteve longe do convencional e, sobretudo, das normas de comportamento esperadas para uma mulher dos anos 60, sendo assim, uma figura cujo comportamento foi absolutamente vanguardista. Essa donzela decadente nos ensina a sermos mais corajosos, a suportarmos dores que parecem insuperáveis e, claro, a transformarmos todos os pesares, aflições e calamidades existenciais em poesia. 

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10 - Elisabeth Fraser (Juliana Vannucchi)

Elisabeth Fraser nasceu em Grangemouth, na Escócia, cidade que já descreveu como “industrial, escura e sufocante”. Ela era a caçula de seis irmãos e seu pai era fabricante de ferramentas. O talento musical se manifestou cedo, sendo que ela tinha duas tias com habilidades vocais. Porém, certamente ninguém – nem a própria Fraser– imaginava que ela fosse chegar tão longe e fascinar o mundo com sua peculiar voz angelical. Na adolescência, gostava de escutar bandas como Sex Pistols e Siouxsie & The Banshees.

Liz se juntou ao Cocteau Twins quando tinha 17 anos, depois que Robin Guthrie, cofundador da banda, observou-a dançando numa boate. Assim, acabou se tornando o grande nome da banda - segundo um relato seu de 1983, o que a impediu de seguir o sonho de ser garçonete. Elisabeth Fraser sempre se destacou especialmente por sua voz etérea e suas letras enigmáticas e abstratas que, na maior parte das vezes, foram compostas numa linguagem inventada por ela. Esse instigante aspecto lírico gera muito debate e especulação, mas Fraser já declarou que ouvintes devem se ater às melodias e vivenciar uma experiência subjetiva com elas, ao invés de tentar interpretar suas frases. Ademais, para ela, nunca foi estranho escrever numa língua inventada e a vocalista garante que isso sempre aconteceu de maneira espontânea. No site oficial da banda, encontramos uma declaração a esse respeito: “Eu ganhei muito [inventando a linguagem]. Eu não esperava que fosse uma experiência tão gratificante, no início foi uma tática de evasão. Mais que isso. Mas devo ter me dado permissão ao longo do caminho para realmente ir em frente e não me preocupar com a opinião das pessoas”.

Em relação ao seu processo criativo, uma matéria do jornal britânico The Guardian descreveu o seguinte: “Ela compõe (...) começando com frases ou melodias únicas, gravando-as e passando-as para outra pessoa para adicionar mais camadas, seja o baixista ou o tecladista, antes de trabalhar mais nelas, como um pintor voltando constantemente para uma tela. O processo em si é o que importa, a coisa criativa, ela diz a si mesma, e se as músicas algum dia vão ser lançadas no mundo não é essencial, embora, logicamente, ela queira que as pessoas as ouçam. Apesar de sua fama e reconhecimento global, sempre foi uma pessoa reclusa, tímida e discreta, buscando se manter longe dos holofotes e evitando entrevistas".

Há alguns anos, a vocalista começou a estudar escrita criativa e poesia. Atualmente leva uma vida discreta ao lado do marido. Além do sucesso com o Cocteau Twins, gravou com outras bandas bem sucedidas e inspirou grandes nomes da música, como Prince, Madonna e Michael Jackson, além de também ter David Lynch como fã declarado. 

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11 - Ari Up (Juliana Vannucchi)

Poderíamos inserir nessa lista todas as meninas da banda The Slits, mas vamos optar por colocar Ari Up em evidência como forma de homenageá-la em função de sua morte precoce.

Ari Up é uma inesgotável fonte de inspiração. Foi uma personalidade carismática e bem-humorada, talentosa como vocalista e guitarrista e que impressionava por sua aparência peculiar, caracterizada por vestimentas excêntricas e por penteados inusitados.

Musicalmente falando, Ari Up foi inovadora por levar influências do reggae ao punk. Lançou um total de quatro álbuns de estúdio com a banda The Slits, sendo que o mais popular, intitulado “Cut”, de 1979, é considerado uma das melhores produções da vasta e preciosa história do punk rock. Nessa época, a formação base e clássica da banda era o trio Viv Albertine, Ari Up e Tessa Pollitt. A impactante capa do “Cut”, com as três integrantes da banda despidas da cintura para cima, se tornou icônica. A esse respeito, Albertine declarou certa vez ao The Guardian: “Queríamos uma postura guerreira, queríamos ser uma tribo (...) Sabíamos, como não estávamos vestidas, que tínhamos que parecer confrontadoras e duronas. Não queríamos ser convidativas ao olhar masculino”. De fato, a nudez presente na imagem do álbum não possui apelo sexual, e pode-se dizer que tem um viés essencialmente artístico, simbolizando a força e a liberdade femininas. Uma faixa em especial foi explosiva e se tonou o grande hino da banda: “Typical Girls”, cuja letra descreve o comportamento enlatado, fútil e previsível de garotas convencionais, que são as que não se rebelam, não reagem ao que lhes incomoda e gastam seu tempo com futilidades – convenhamos, o nosso mundo atual ainda está cheio de “garotas típicas”. A letra indaga: quem criou esse tipo clichê de garota? E fica a sugestão de que a invenção dessa personalidade vazia é simplesmente um intencional jogo um jogo de marketing.

Cabe observar que a cena punk à qual a banda The Slits pertenceu, foi um movimento de contestação de tradições, quebra de tabus, rejeição das normas vigentes e que, como consequência dessas características, conseguiu desbancar o domínio masculino do rock, consolidando a igualdade sexual e abrindo portas para que as mulheres tivessem voz ativa, liderassem bandas, lutassem por seus direitos e, de modo geral, se arriscassem em projetos e iniciativas que não eram usuais para a época. A esse respeito, Ary Up, em depoimento na Dirty Laundry TV, comentou que o punk, como um todo, foi "um movimento essencialmente revolucionário que conseguiu mudar completamente o mundo culturalmente, filosoficamente, politicamente e musicalmente".

Albertine, certa vez declarou que Ari Up era essencialmente revolucionaria e que foi a mulher mais dinâmica que ela conheceu.

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12 - Gillian Gilbert (Juliana Vannucchi)

A glamourosa tecladista e guitarrista do New Order foi uma mulher vanguardista em seu percurso musical, cujas produções sonoras são repeltas de originalidade e emoção. Em função disso, não é exagero algum afirmar que as melodias geradas por seus instrumentos são os maestros que conduzem os rumos das canções do New Order. Na verdade, convenhamos, essa feiticeira dos teclados sempre foi a principal alavanca de sua banda, sendo a grande responsável por dar vida aos detalhes que geram o encanto das faixas criadas pelo grupo de Manchester. 

A título de curiosidade, vale dizer que antes de se juntar ao New Order, Gillian Gilbert, ainda muito inexperiente, fez parte de um trio punk composto somente por mulheres. Em relação a esse feito, chegou a declarar: "Nenhuma de nós conseguia tocar sequer uma única nota, apenas pensamos que seria legal poder dizer que estávamos em uma banda como todo mundo". Sabemos que foi mais ou menos por intermédio dessa fórmula que muitos grupos e músicos brilhantes surgiram... Gilbert e tantos outros gênios do punk rock, no final das contas, nos ensinam que a atitude e a coragem devem anteceder a habilidade! 

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13 - Joan Jett (Mônica Lopes)

Joan Jett, nascida Joan Marie Larkin, em 22/09/1958 na Pensylvania, é um ícone do rock ́n ́roll e uma grande inspiração para nós, mulheres. Foi uma das primeiras personalidades femininas a ter sucesso na indústria musical como cantora, compositora e guitarrista na banda The Runaways que era formada somente por garotas.

Em sua carreira solo, participou de gravações com artistas como Sex Pistols, Paul Cook e Steve Jones. Ao lado de Kenny Laguna produziu um álbum solo que foi rejeitado por gravadoras em 23 ocasiões, o que a levou fundar sua própria gravadora a Blackheart Records e se tornar a primeira mulher a começar uma gravadora.

Não bastasse todo esse pioneirismo no cenário musical, Joan também se destaca como defensora dos direitos dos animais sendo, inclusive, vegetariana. Além disso, é acionista de uma equipe de basebol feminino chamada The Long Island Ducks.

Das muitas canções de sucesso de sua carreira eu destaco “Bad Reputation” como um hino de liberdade feminina em que ela grita que não se importa com o que os outros pensam sobre ela. Já outra canção que merece destaque a meu ver é “I Hate Myself for Loving You” em que ela expressa o conflito entre amor e ódio, uma vulnerabilidade que pode permear relacionamentos amorosos.

Joan Jett é chamada de Rainha do Rock não à toa. Sua vida, sua carreira e sua determinação ratificam esse título. Desde 2015 seu nome está gravado ao Rock and Roll Hall Fame. Acho justíssimo!!

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14 - Gaye Advert (Neder de Paula)

Foi econhecida por seu papel fundamental no movimento punk nos anos 1970. Membro da banda punk The Adverts, Gaye contribuiu para o som distinto da banda com seu estilo de tocar baixo energético e presença de palco carismática. Sua imagem punk e atitude rebelde solidificaram seu status como uma figura importante na contracultura da época. O legado de Gaye Advert persiste como parte integrante da história do punk rock.

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15 - Cynthia Ross (Juliana Vannucchi)

A baixista e poetisa canadense respira arte desde a tenra idade, sendo que foi ainda durante a infância que aprendeu a tocar piano. Cynthia, mais tarde, vivenciou o período mais explosivo do punk rock norte-americano, acompanhando de perto o surgimento e amadurecimento das principais bandas do C.B.G.B, e formando nessa época seu próprio grupo autoral, chamado The ‘B’ Girls, composto somente por mulheres. A banda de Cynthia Ross se dissolveu em pouco tempo, mas a canadense permaneceu firme e ativa nos palcos e na produção de poesias ilustres, repletas de sentimento e paixão. Seu modo de escrever é mágico e profundo, travando um diálogo direto com a alma do leitor que simplesmente se desvencilha do mundo material para experimentar as celebrações metafísicas oferecidas pelas poesias de Cynthia. A realidade é mais emocionante e menos amarga quando temos uma caprichada dose de poesia para nos embriagar e Ross oferece esses instantes através de seu dom!! Pra mim, sua habilidade poética se sobressai e faz dela uma verdadeira sibila que nos proporciona uma vivência mística e alucinante.

Cabe dizer aqui que sua vida, além de ter sido amplamente dedicada ao universo artístico, também foi marcada por seu nobre envolvimento com diversas causas sociais. Esse vasto e inspirador ativismo engloba ações diversificadas: Cynthia já trabalhou com imigrantes e refugiados, foi assistente social, conselheira de dependentes químicos, já desenvolveu programas de acesso à moradia para famílias que saíram de abrigos, liderou iniciativas de empreendedorismo social e treinamento, trabalhou no desenvolvimento de parcerias para grandes redes de habitação social e revitalização comunitária, dentre outras atividades relacionadas e essas inúmeras que foram elencadas.

Cynthia Ross, com tantas realizações preciosas e dignas de admiração em sua produtiva bagagem, é certamente uma das mulheres mais inspiradoras da nossa lista.

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16 - Viola Smith (Juliana Vannucchi)

Antes de surgirem alguns bateristas monstruosos que você provavelmente conhece, tal como Ian Paice,  Keith Moon, John Bonham e tantos outros, existiu uma visionária feroz na bateria, chamada Viola Smith, considerada a primeira mulher a ser uma baterista profissional. Essa verdadeira deusa das baquetas nasceu em 1912 e faleceu em 2020, aos 107 anos. Seu nome atravessou o tempo e ela obteve um grandioso reconhecimento pelas apresentações memóraveis que fez ao lado de imortantes orquestras e que, inclusive, renderam-lhe o título de "baterista mais veloz do mundo". A respeitada Viola Smith também foi pioneira no uso do bumbo duplo.

Em 1942, essa talentosa percurssionista escreveu um interessante texto intitulado "Give Girls Musicians a Break", que foi publicado numa revista americana voltada ao jazz, no qual apresentava ideias e provocações simplesmente revolucionárias que, em suma, afirmavam que as mulheres tinham plena competência para fazer música e, por isso, jamais deveriam ser colocadas em segundo plano. Leiamos aqui algumas de suas palavras: "Nestes tempos de emergência nacional, muitos das estrelas instrumentistas de grandes bandas estão sendo recrutados. Em vez de substituí-los por um talento que pode ser medíocre, por que não deixar algumas das grandes mulheres musicistas do país tomarem seu lugar?'' (trecho reproduzido pela Wikipédia).

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17 - Sister Rosetta Tharpe (Juliana Vannucchi)

Tharpe foi uma guitarrista brilhante e perseverante, que ajudou o rock and roll a tomar forma. Essa consagrada mulher, surgiu no cenário da música gospel, mas seu virtuoso manejo do referido instrumento, logo a fez trilhar o caminho do blues e do rock. Inventiva e revolucionária, Ssiter Rosetta Tharpe foi pioneira no uso da distorção e tecnicamente falando, foi imensamente habilidosa. Para se ter uma ideia do tamanho de sua relevância, vale citar que ela influenciou fortemente a composição e a carreira de grandes músicos, como Chuck Berry, Little Richard e até mesmo Elvis Presley. Esses grandes gênios, ouso dizer, certamente nem sequer existiriam ou teriam sido o que foram se Rosetta não tivesse feito o que fez! Portanto, essa fera das guitarras foi, sem dúvida, um verdadeiro pano de fundo embrionário para que o rock se consilidasse e fosse escrito do jeito que foi!

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18 - Courtney Love (Juliana Vannucchi)

A polêmica companheira de Kurt Cobain tornou-se popular no universo do rock and roll através de suas produções com a banda Hole, que deslanchou durante os anos noventa, transformando Courtney Love numa cultuada musa dessa geração. Mas antes de se destacar com o grupo Hole, ela já vivia imersa na música e, a título de curiosidade, vale dizer que, inclusive, chegou a ser vocalista do Faith No More. Contudo, o refinado talento de Courtney nunca se resumiu aos vocais, pois a norte-americana também toca baixo e é uma ótima guitarrista.

Courtney Love também é famosa por seu ativismo no campo político e social. É uma defensora militante dos direitos da comunidade LGBGQIA+, tendo declarado em 1997, algo que permanece atual: “Precisamos respeitar os outros e também nós mesmos, respeitar quem somos e que somos, e não ter medo de ser o que somos (…)”. Além disso, Courtney é uma feminista ativa. Falando nisso, com certeza, aqui há espaço para uma observação de importância atemporal, escrita por Kurt Cobain, q que está presente no encarte de um dos mais populares álbuns do Nirvana: “Se você é racista, sexista, homofóbico ou basicamente um babaca, não compre esse CD. Não me importo se você gosta de mim, eu te odeio pra caralho”. 

 

Courtney Love e Kim Gordon: duas estrelas dos anos noventa.

 

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19 - Kira Roessler (Juliana Vannucchi)

A conceituada Kira Roessler foi, durante um período, baixista da banda Balck Flag e se consolidou, por tal feito, como uma das personalidades femininas mais importante da história do punk rock. Além de ser contrabaixista, ela é formada em Engenharia pela UCLA. Ademais, Roessler também esteve à frente de outros grupos, como "Dos" e criou a arte da capa do disco de estreia de Mike Watt.

Atualmente, Roessler trabalha como roteirista e está por trás da construção de diálogos de filmes famosos, tais como "Sob o Sol de Toscana", "Mente Perigosa" e outros. Ademais, ela também participou da equipe de edição de som do longa "Mad Max: Fury Road", fato que, inclusive, lhe rendeu um Oscar.

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20 - Nico (Juliana Vannucchi)

A alemã Christa Päffgen, popularmente conhecida como Nico, é uma estrela atemporal que mudou para sempre os rumos do rock and roll e se eternizou como uma grande musa da vanguarda musical dos anos sessenta. Embora sua fama tenha sido edificada principalmente em decorrência de sua passagem pelo The Velvet Underground, a vocalista alemã também teve uma carreira solo simplesmente ilustre. Sua voz é ímpar, inconfundível, penetrante, hipnótica e divina. Em função dessa unicidade vocal, podemos seguramente dizer que todas suas produções musicais sempre foram simplesmente impecáveis.

Cabe citar que a cantora alemã também aventurou-se no fasciante universo da Sétima Arte, marcando presença no cultuado longa "La Dolce Vita", de 1960, dirigido por Federico Fellini, além de ter atuado também em inúmeros filmes do diretor francês Philippe Garrel.

A voz dessa femme fatale tem grife e a alemã mais querida rock deixou ao mundo um valioso e relevante legado artístico, repleto de obras-primas grandiosas.

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21 - Dolores O'Riordan (Juliana Vannucchi)

Com sua voz poderosa e marcante, essa incrível cantora tocou muitos corações e cativou várias gerações. Falecida em 2018, aos 46 anos, Dolores O'Riordan deixou saudade no mundo todo, embora seu legado musical seja atemporal.

A paixão de Dolores pela música começou cedo. Conta-se que antes mesmo de aprender a falar, a charmosa irlandesa já sabia cantar, e seu talento foi precocemente percebido na tenra idade, quando ainda estava na escola. Aos dez anos, ela já se apresentava em bares e mais tarde, como sabemos, esse talento inato revelou-se ao mundo todo.

Dolores O'Riordan é uma lenda encantadora que por meio de sua voz angelical, compartilhou com o público sua sensibilidade, seus anseios e sofrimentos. Felizmente, ainda podemos celebrar sua história por meio da música que ela nos deixou!

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22 - Janis Joplin (Rikk Maldito)

A jovem Lyn certamente não tinha noção do que carregava em sua bagagem. Não sabia que a aura gritante de quem percorria loucamente o mundo em busca de liberdade, movida por uma fúria indomável, iria contagiar toda aquela geração dos meados dos anos 60's. Com uma voz impar, e arenosa proeminente do blues-jazz , a lá  Leadbely e Bessie Smith, Janis  só  terminou de escancarar as portas da percepção daquelas guerreiras de ébano da  Soul music norte-americana que deram o ponta pé inicial e embrionário daquele cenário repleto de rebeldia, revolução, e do oxigênio contra cultural libertário para o rock'n'roll.

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23 - Debbie Harry (Juliana Vannucchi)

A belíssima Debbie Harry não apenas consolidou sua fama como o maior símbolo da new wave, mas também obteve sucesso como atriz, tendo participado de mais de sessenta filmes. Por isso, podemos assegurar que a vocalista do Blondie é uma verdadeira referência cultural. Conhecida e respeitada em todos os cantos do mundo, suas canções agradáveis e vibrantes ainda arrancam suspiros de muitas pessoas e tocam constantemente em várias rádios e discotecas. 


Debbie Harry e Pam Hogg.


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24 - Tina Turner (Juliana Vannucchi)

A charmosa “Rainha do Rock & Roll” não poderia faltar em nossa lista. Turner teve uma carreira absolutamente elogiável e sempre próspera, que lhe rendeu mais de cem milhões de discos vendidos. A cantora, que no decorrer de sua vida profissional transitou com maestria entre o pop, o rock e o R&B, produziu mais de dez álbuns de estúdio e sempre realizou performances empolgantes e agitadas, repletas de uma energia contagiante que levava seu público a um glorioso estado de êxtase.

Mas não foi apenas na música que ela mesteres sua grife, pois vale lembrarmos que Tina Turner também deixou sua marca no mundo do cinema, tendo participado de vários filmes, dentre os quais destaca-se “Tommy”, a fantástica adaptação da ópera-rock do The Who. Nesse musical, Turner se eternizou como a “Acid Queen”.

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25 - Bilinda Butcher (Pedrinho Sangrento & Juliana Vannucchi)

Uma das guitarristas e compositoras mais aclamadas de todos os tempos, a criativa Bilinda cravou sua marca na história através das composições poéticas feitas na banda alternativa My Bloody Valentine. De modo geral, podemos afirmar que ela foi o grande motor do grupo, a principal fonte de ideias e uma verdadeira maestra. A banda conta também com a incrível Debbie Googe, uma baixista à altura de Kim Gordon, cuja marca são seus movimentos frenéticos que lembram a essência dos pioneiros do punk rock, como MC5, e que apresenta um look de rockstar dos anos 90 completamente icônico e incomparável. 

O MBV é uma banda muito importante, pois foi praticamente responsável por criar o que veio ser a segunda onda de shoegaze do começo dos anos 90, e o toque feminino mágico de  Bilinda com os elementos sonoros brutais como a bateria selvagem com viradas de metralhadora de Colm, e a guitarra de serra elétrica melódica de Kevin, em conjuto deram luz a uma das bandas mais autênticas e influentes da década de 80. E como vimos, o mais importante é que trata-se de uma banda com um toque feminino.

 

Kim Gordon e Bilinda. Mulheres com ideias musicais desconstrutivas e originais.

 

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26 - Grace Slick (Juliana Vannucchi)

Grace Slick foi vocalista da banda Jefferson Airplane, grande expoente do rock psicodélico. Sua sofisticada voz está por trás de algumas das músicas mais clássicas do rock and roll e sua presença nos palcos hiponotizava o público. Não à toa, Slick tem sido uma personalidade amplamente cultuada por todos os amantes desse gênero musical.

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27 - Stevie Nicks (Fabi Bellentani)

Stevie Nicks é uma das figuras mais emblemáticas da música. Falar dela em poucas palavras é um desafio gigante, pois ela é uma das maiores influências para as mulheres dentro do rock and  roll, e seu curriculum é extenso.

Seus maiores sucessos musicais, tanto como vocalista do Fleetwood Mac quanto em sua carreira solo, são testemunhos de sua habilidade única de contar histórias e evocar emoções profundas. Canções como "Dreams", "Rhiannon", "Landslide" e "Edge of Seventeen" se tornaram hinos para muitos, capturando a essência da experiência humana com uma honestidade brutal e uma beleza transcendental. 

Nos anos 70 e 80, Nicks já era uma figura de inspiração e empoderamento. Sua presença dominante desafiava as normas tradicionais de gênero, enquanto sua autenticidade e vulnerabilidade a tornavam acessível e tangível para seus fãs.

Além de sua música, Stevie Nicks também é conhecida por sua moda distintiva e seu estilo de palco único, que continuam a inspirar fashionistas e artistas até hoje.

Nicks causou um impacto sem tamanho na indústria musical e na cultura popular como um todo. Sua música ainda toca corações e almas, e ela sempre será considerada uma das pioneiras na luta do reconhecimento de mulheres na indústria da música, nosso ícone feminino, e fonte de inspiração para as gerações futuras.

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28 - Lydia Lunch (Juliana Vannucchi)

A desconcertante rainha da no-wave norte-americana, porta um amplo repertório cultural, sendo que tudo que ela fez foi executado com classe e qualidade. E, aliás, Lydia Lunch já fez um pouquinho de tudo: participou de filmes, escreveu poesias, publicou livros, gravou spoken words, lançou álbuns solos primorosos e também colaborou com grandes lendas do rock, como Thurston Moore, Rowland Howard, Nick Cave e inúmeros outros nomes... praticamente todas os mitos do punk e do pós-punk sempre tiveram interesse em gravar, tocar e performar ao lado de Lunch. Em todas essas diversas empreitadas, Lydia sempre foi uma mulher destemida que procurou quebrar paradigmas e conduzir sua vida e sua arte com liberdade, escolhendo agir e manifestar-se sempre como desejava, independente das consequências controversas que suas ações poderiam gerar.

Lydia Lunch é uma demolidora selvagem de qualquer tipo de censura. É uma artista essencialmente desconstrutiva, desafiadora, ousada, inovadora e digna de respeito em função de enriquecedora herança cultural que já nos deixou, e que continua a edificar de maneira incansável.
 
 
Siouxsie Sioux e Lydia Lunch reunidas.

 

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29 - Jacqui McShee (Juliana Vannucchi)

O Pentagle é uma banda de folk simplesmente primorosa que já serviu como fonte de inspiração para incontáveis músicos e bandas famosos, tal como Pete Townshend, que é um do muitos apreciadores do grupo e, certa vez, declarou que eles foram muito “inovadores” em seu modo de compor e tocar.

Todos os membros do Pentagle foram influentes e imensamente talentosos, mas sem dúvida, Jacqui McShee com sua voz doce e incomparável, foi o ponto mais forte da banda. Seus timbres alucinantes carregam os ouvintes de volta para a Idade Média e sua docura melódica orquestra os fantásticos rumos das músicas tocadas pela banda. Ademais, além de ter cravado seu nome na história do rock, ela teve um papel social e político importante durante a eclosão da contracultura dos anos 60, posicionando-se abertamente contra o uso de armas nucleares.

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30 - Lisa Gerrard (Juliana Vannucchi)

A gloriosa e habilidosa vocalista da banda australiana Dead Can Dance é uma sibila que conduz os ouvintes para um universo mágico e divino situado além do tempo e do espaço. Sua voz celestial proporciona sempre uma viagem verdadeiramente mística e emocionante. Não à toa uma crítico musical, certa vez escreveu a seu respeito: “A voz de Lisa não é desse mundo”. De fato, as técnicas vocais de Gerrard são um grande destaque e são elogiadas constantemente por especialistas. Nesse contexto, cabe mencionar aqui um depoimento de Jon Pareles, do The New York Times, em relação ao uso que Gerrard faz da sua técnica: "Ela usa vozes distintas que se inspiram em tradições distantes: por vezes, utiliza um tom opalescente da ópera barroca, às vezes um toque agudo do estilo folclórico celta, encontramos também uma abordagem nítida e trêmula da música feminina dos Balcãs, notas azuis dobradas como o de Billie Holiday”.

Curiosamente, vale mencionar que em algumas canções e composições, Lisa, desde a infância, faz uso da idioglossia, uma linguagem própria inventada por ela. Sobre esse fenômeno presente em sua carreira musical, ela declarou numa entrevista: “Eu canto na língua do coração. É uma língua inventada que eu tenho há muito tempo. Eu acredito que eu comecei a cantar quando eu tinha uns 12 anos. E eu acreditei que eu estava falando com Deus, quando eu cantava nesse idioma". Eu também acredito que ela estava, pois hpa, de fato, algo profundo e divno em sua voz!

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31 - Tina Weymout (Juliana Vannucchi)

Tina Weymout eternizou-se pelas originalidade com a qual conduziu a criação de suas linhas de contrabaixo ao longo de sua admirável carreira musical. Ela enfeitiçou o mundo inteiro com a famosa canção “Psycho Killer”, um hino visceral do Talkinh Heads que é deliciosamente orquestrado pelo contrabaixo de Weymout. Aliás, sua composição instrumental no single mencionado, levou-a a ser eleita a melhor baixista do mundo, um posto merecidíssimo. Nos palcos, Tina sempre cativou o público com seus movimentos corporais e faciais, que alternavam-se entre danças, pulos, sorrisos tímidos e olhares enigmáticos, garantindo à plateia ótimas performances.

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32 - Poison Ivy (Mau Carlakoski )

Poison Ivy lidera o rock selvagem no meu coração com seus riffs e sua postura sem igual. Ela é puro rock and roll! Seu jeito de tocar, seus trajes, seu olhar... tudo nela é absolutamente brilhante e fascinante. Ela foi o par perfeito para Lux, eles eram o casal ideal para fomentar aquela barulheira do The Cramps que nós tanto amamos! Definitivamente, o casal mais memorável do rock! Ivy é totalmente única. Sem paralelos!

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33 - Lita Ford (Juliana Vannucchi)

A elegante compositora e guitarrista da banda The Runnaways é, com toda certeza, uma das mais aclamadas estrelas do rock and roll. Além do sucesso nos palcos, Lita Ford acumula experiências como atriz e já foi até mesmo personagem de um jogo de videogame “Brütal Legend”.

Ford começou a tocar violão quando tinha 11 anos e logo foi desenvolvendo suas habilidades e dominando cada vez mais o instrumento. Atualmente, é uma referência como guitarrista e uma grande heroína da história do rock. Convém citar aqui um trechinho interessante extraído de sua autobiografia, que certamente iluminará e motivará muitas mulheres: “Uma crítica disse que éramos ‘garotas tentando agir como garotos’. Ela entendeu errado. Éramos garotas tentando ser melhores que os garotos. E eu estava determinada a fazer todos entenderem isso”. 

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34 - Shirley Manson (Juliana Vannucchi)

A escocesa Shirley Manson, vocalista da banda Garbage, foi um ícone significativo durante os anos noventa e marcou a geração dessa década com uma série de hits memoráveis. Nos palcos, Shirley sempre teve muita atitude e carisma, e fora do universo musical, é uma personalidade feminina engajada em causas sociais e políticas, sempre se manifestando a respeito desses temas na sua conta do Instagram. 

Recentemente, durante uma entrevista, Manson revelou que ainda há uma discrepância enorme entre homens e mulheres na indústria musical e na ocasião, comentou sobre como cantoras famosas da atualidade são meras marionetes de homens que as manipulam por trás desse universo: “Beyoncé, Lady Gaga, Katy Perry e Billie Eilish são extremamente poderosas, mas isso é um centésimo da indústria da música. Na maioria das vezes ainda é um produtor masculino, chefe de gravadora, escritor”. Ao site "Papel Pop", em relação a esse mesmo assunto, a cultuada vocalista escocesa, brilhantemente refletiu: “Até que possamos virar a chave do desejo, da ambição masculina, vamos continuar sofrendo nas mãos do patriarcado e tudo o que há em torno dele. Por isso é significativo que encorajemos nossos governos futuros a abraçar a diversidade na representação geral, incluindo em seus projetos a comunidade queer, os negros, os povos indígenas, pessoas de todos os sexos, gêneros, credos e religiões”. 

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35 - Pam Hogg (Gregory Ferraz)

Embora Pam busque a perfeição , ela prefere sempre encontrar a beleza da imperfeição. Em suas memórias afetivas, fala que quando não se tem nada, é possivel enriquecer-se com contos e invenções, que se coloque num rádio mistérios e suspenses para tocar, e que sempre sobrevivamos e floresçamos com o poder da imaginação.

Original, inventiva, criativa, provocativa, audaciosa, entre diversas outras qualidades, Pam Hogg é uma designer de moda/musicista/cineasta de uma força caleidoscópica e de uma exuberância caótica que dificilmente se consegue observar em uma única pessoa, devido à intensidade e obstinação que são requeridas para sê-la. 

Pessoalmente, acho que um momento divino é quando uma pessoa me retira da ignorância, e essa é a Pam, uma pessoa sempre disposta a “dar-lhes o que eles não sabem que querem”, por isso creio não haver possibilidade de se deparar com a obra de Pam Hogg sem ser arrebatado. Se no presente ela se dirige na entrega do não óbvio, de remover barreiras do normativo e quebrar as regras que podem nos sufocar e enrijecer como sociedade realmente, não há outra forma de abordar Pam a não ser pelo senso de agradecimento. Qualquer um que busque viver nessa vida de forma intensa, real e acordada pra realidade, sabe o quanto é custoso os incômodos do caminho, e nos deparar com o ritmo alucinante da Pam é nos deparar com uma grande guerreira que tem uma jornada de muita reclusão autoimposta e que tem como caminho uma jornada através da escravidão e restrição, até uma iluminação espiritual individual e coletiva.  Um grande salve para a querida Pam Hogg.

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36 - Jordan Mooney (Juliana Vannucchi)

Jordan Mooney foi uma das mulheres mais revolucionárias do punk rock. Durante a juventude, não se interessava pelos padrões femininos vigentes e na época em que frequentava a escola, se espantava com a quantidade de meninas cujo objetivo central e definitivo de vida era simplesmente casar e ter filhos. Ela almeja mais: buscava rupturas e queria autonomia e liberdade. Mais tarde, encontrou tudo isso na Sex, icônica loja gerida por Vivianne Wostwood e Malcom McLaren, na qual ela trabalhou como modelo, ajudando a criar e consolidar a moda punk. “Nunca quis me encaixar”, disse ela. “Quando eu saí da escola primária, eu sabia que ia fazer algo diferente com a minha vida”. Na época, Mooney chocou a população londrina com sua aparência tão peculiar e exuberante. Segundo a modelo inglesa, as pessoas sempre tinham algum tipo de reação quando a viam pelas ruas e muitas ficavam enfurecidas ou até mesmo amedrontadas com a jovem, cuja ousadia causou um rebuliço na classe conservadora.

Além do universo fashion, vale mencionar que Jordan se dedicou ao cinema e também à música. Fora do meio artístico, teve uma vida reclusa e destacou-se especialmente por seus trabalhos veterinários - sempre amou os animais e fez muito por eles.

Mooney faleceu no início de abril, aos 66 anos. Sejamos claros e sucintos aqui: devemos muito a ela. Há quem diga, afinal, que foi ela que inventou o punk rock!

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37 - Patti Smith (Juliana Vannucchi)

Patti Smith, a grande poeta do rock and roll, foi uma das precursoras do movimento punk norte-americano. Suas performances e seu lirismo sempre estiveram repletos de romantismo, emoções e sentimentos inetnsos, com os quais muitas pessoas se identificam. No livro "Mate-me Por Favor", declara em relação ao seu processo criativo: "Comecei a fazer sucesso escrevendo aqueles poemas longos, quase poemas de rock and roll (...) Escrevo pra ter alguém. Há um motivo por trás de tudo que escrevo (...) Outra coisa é que, através da performance, alcanço certos estados nos quais sinto minha mente muito aberta - cheia de luz, enorme (...)". Não há dúvida de que os ouvintes e espetactadores captam e entram nessa sintonia esplêndida da  poderosa "rainha underground".

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38 - Lora Logic (Juliana Vannucchi)

A saxofonista, cantora e compositora britânica Lora Logic ficou em evidência durante os anos setenta, no período de eclosão punk inglês. Sua notoriedade se deu principalmente pela passagem que teve na prestigiada banda X-Ray Spex, na qual permaneceu por pouco tempo, até deixar o grupo devido a algumas desavenças com a vocalista Poly Styrene. A conceituada e talentosa baixista Gina Birch, da banda The Raincoats, prestou um breve depoimento para um livro biográfico sobre Poly, lançando em 2021, no qual mostrou seu apreço pelo dinamismo sem paralelos de Lora e Poly nos palcos: “Quando a Lora tocava com ela era incrível. É triste que ela não tenha permanecido”. 

Apesar de ter saído da banda de uma forma tão precoce, sua colaboração musical foi legada no lendário disco “Germfree Adolescents”, que utilizou arranjos criados pela saxofonista. De qualquer forma, mesmo distante do X-Ray Spex, a carreira musical de Lora Logic foi frutífera, seguiu em alta e, ao longo do tempo, além de ter dado vida a um elogiável projeto musical autoral chamado “Essential Logic”, a saxofonista também gravou e contribuiu com grandes bandas como The Stranglers, com a própria The Raincoats e também com Boy George.

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39 - Suzi Quatro (Juliana Vannucchi)

Baixista, guitarrista, compositora e atriz norte-americana, a multitalentosa Suzi Quatro popularizou-se imensamente durante os anos 70, tornando-se um verdadeiro ícone dessa geração. É reconhecida como uma notável expoente do glam rock, mas também costuma ser associada ao hard rock. Essas diferentes categorizações se dão em função de sua incrível versatilidade musical.

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40 - Mary Ford (Juliana Vannucchi)

Essa ilustre guitarrista e estilosa cantora, cuja voz tinha um potencial imenso e único, foi amplamente reconhecida por seu relacionamento com o famoso e habilidoso guitarrista Les Paul, ao lado qual fez sucesso e atingiu imensa popularidade durante o início dos anos cinquenta, se consolidado, assim, como uma das mulheres mais famosas desse período e tendo, por isso, um papel decisivo no desenvolvimento do rock and roll. 

Vale dizer que os pais da diva Mary Ford eram envolvidos com músicas da igreja da qual faziam parte, e todos os irmãos da cantora também se dedicaram a esse mesmo universo artístico. Ford, portanto, respirou música desde a infância até o final de sua vida, tendo se firmado como uma mulher verdadeiramente revolucionária na história do rock and roll.

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41 - PJ Harvey (Juliana Vannucchi)

PJ Harvey é uma personalidade transgressora, excêntrica e que gosta de desafiar os ouvintes com seus experimentos musicais lúgubres e com os caminhos inusitados pelos quais conduz suas produções artísticas. Ela deu os primeiros passos de sua carreira no final dos anos oitenta, mas o amadurecimento artístico, o reconhecimento mundial e as premiações vieram somente na década seguinte, período no qual Harvey resignificou o rock, destoando do que era comumumente feito e migrando por estilos diversos e influências variadas em suas instigantes composições.

As músicas de PJ Harvey e seus trejeitos  singulares de cantar, tocar guitarra e dançar escapam de qualquer regra que em algum momento tenha guiado e moldado o rock. Por tais aspectos, podemos dizer que uma mulher tão forte e livre como ela, sem dúvida alguma, é uma inesgotável fonte de inspiração. Certa vez, Courtney Love fez uma declaração bastante elogiosa a respeito de PJ Harvey:  “A única estrela do rock que me faz saber que sou uma merda é Polly Harvey. Não sou nada perto da pureza que ela experimenta”.

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42 - Poly Styrene (Juliana Vannucchi)

Poly Styrene, lider da banda X-Ray Spex, foi uma das personalidades mais respeitadas e memoráveis do punk rock britânico. É reconhecida como uma mulher forte e autêntica que, por meio de sua música e de sua imagem, afastou-se completamente dos clichês femininos de sua época e, assim, firmou sua própria personalidade, independente dos padrões vigentes: usava aparalho dentário e não ostentava um corpo hollywoodiano, demolindo, esteticamente, a sexualização barata e medíocre que sempre acorrentou tantas mulheres. Em decorrência disso, Poly sofreu ataques raciais e machistas e foi alvo de preconceito devido à sua aparência, mas, ao invés de se entregar ao sofrimento que tudo isso lhe causava, ela simplesmente escreveu uma série de letras ácidas que atacam a sociedade pós-moderna e seus principais componentes, como a alienação, a opressão e o consumismo. 

Além disso, Poly Styrene vivia na prática a ideologia D.I.Y, pois ela mesmo confeccionava suas  roupas, elaborava os cartazes dos shows de sua banda. Suas história e seus feitos são imensamente relevantes para os dias atuais.

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43- Vi Subversa (Juliana Vannucchi)

Vi Subversa, a lendária voz por trás da banda Poison Girls foi uma grande questionadora do papel das mulheres na socidade. Através de suas letras e de sua postura anárquica, refutava as normas convencionais que acorrentavam as mulheres e contestava o machismo vigente. Muitas ideias presentes nas letras das bandas reverberam em lutas atuais. Conforme consta no site oficial do grupo: "O impacto político da banda ressoa mais forte do que nunca. Suas ideias e mensagens ainda são desafiadoras. Suas letras são tão relevantes e conflituosas quanto no dia em que foram escritas". Vejamos um trecho da faixa "Abort The System", no qual tal essa atemporalidade das abordagens do grupo fica explícita: 

 

"A mulher tem um corpo
que ela deve chamar de seu
Mas eles a tratam como um vaso de flores
feito por uma semente que ele plantou

(...)

Eles a aleijam com espartilhos
e coisas que a tornam fraca
E crucifique seus pés
e mancham a bochecha dela com tinta
Então eles a soltam no
mercado para comprar e ser vendida
Ela é o recipiente vazio

(...)

Já que falamos na Vi e fizemos referência ao grupo Poison Girls, aproveitamos a ocasião para convidar o Ulixo, produtor do zine "DF Caos" e administrador do perfil "Punk Music 77" para falar um relato sobre a banda "Hagar The Womb", formada em 1980, em Londres e que, em seus primórdios teve um empurrãozinho justamente de dois grupos lendários e bem conhecidos por aqui: Poison Girls, que foi citada acima, e Crass. 

Sua formação original era exclusivamente feminina, com o propósito de dar voz as mulheres que sempre tiveram uma grande participação nas bandas anarcho punk da época. Elas começaram bem, fazendo seu primeiro show com o The Mob e com o Zounds e  sua primera demo, que incluia a faixa “for the ferryman” foi lançada em 1984 pela gravadora Mortarhate records da banda Conflict. O primeiro EP, 12", saiu também pela Mortarhate Records, "The Word Of The Womb”, em 1984 e o segundo, que também é 12” foi lançado pela Abstract Records, em 1985.
 
Eu consegui esses EPs muito tempo depois do lançamento original e sempre fico fascinado quando os ouço. É uma bandas bandas que mais aprecio, acredito que a escuto quase toda semana. Aliás, quando fui convidado para escrever algo para o Dia Internacional das Mulheres aqui no Fanzine, eu estava justamente ouvindo a música “Idolization”, por isso me veio a ideia de escrever sobre essa banda e homenageá-la.

Tive o prazer de ver um show delas ao vivo ano passado, em 2023 e nem acreditei que aquilo estava acontecendo. Foi sensacional, especialmente porque minha filha Bianca, que sempre está comigo nesses shows, adorou e ficou contagiada com a felicidade que as meninas da banda transmitem. Nós ainda conhecemos a “Emily Flea” que tem seus próprios projetos, tocou com seu pai na ocasião e é baixista do Rubella Ballet. Ela assistiu o show conosco e, embora ela certamente sempre acompanhe esses gigs, percebemos que ela ficou contagiada pela alegria daquele momento. No show do Zounds eu conversei com elas e quando as meninas viram na minha jaqueta que eu tinha pintado a logo delas, fizeram uma grande festa, me deixando muito feliz e me levando a perceber o que sempre imaginei: que a cena anarchopunk é, dentro do vasto universo punk, a cena que mais respeita as pessoas e, além disso, nesse cenário a luta em favor das mulheres é algo muito forte e sempre presente. (Ulixo punk, convidado especial do Fanzine Brasil)

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45 - Brix Smith Start (Juliana Vannucchi) 

A guitarrista e vocalista do The Fall esbanjou um enorme talento musical durante sua carreira, recebendo sempre muitos elogios por parte da crítica especializada. Brix teve participação ativa na produção de algumas da faixas de maior sucesso da banda e, além dessa marcante passagem pelo The Fall, ela também teve uma brevíssima experiência colaborativa com a banda Hole, liderada por Courtney Love, e também esteve com o Bangles. 

Nos últimos anos, Brix Smith Start tem se dedicado à moda e já apareceu algumas vezes em programas televisivos nos quais foi consultada por ser considerada uma verdadeira especialista no assunto.

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46 - Jill Bryson e Rose McDowall (Juliana Vannucchi)

Essa querida dupla escocesa fecha nossa lista. Juntas, as meninas deram vida ao Strawberry Switchblade, oferecendo ao público um pop saboroso e atemporal que, por vezes, flerta ligeiramente com uma atmosfera dark. Suas músicas apaixonantes são obras-primas capazes de fisgar qualquer ouvinte e tranformar dias ruins em experiências mais glamourosas. Esse patrimônio feminino da pop music não poderia passar em branco. De certa maneira, as bruxinhas escocesas Rose McDowall e Jill Bryson usaram seus dons musicais de forma bem autônoma porqu conseguiram atribuir uma assinatura única para suas músicas, se desprendendo dos modismos da época.



BILINDA BUTCHER TRANSFORMOU DOR EM POESIA E REVOLUCIONOU O ROCK

 Por Pedrinho Sangrento

Pouco se sabe sobre a vida pessoal da discreta Bilinda Butcher, mas o pouco que sei me prova que ela é alguém que você também deveria conhecer. Bilinda viveu  teve um filho em sua adolescência, de quem ela cuidava sozinha, sem contar com a ajuda de um pai. Isso acorreu antes mesmo de ela se juntar ao My Bloody Valentine. As letras de "No More Sorry", escritas por Butcher são como uma carta muito pessoal de Bilinda ao seu filho Toby, e parecem relatar experiências um tanto traumáticas de seu passado. Numa entrevista, certa vez Bilinda disse: "A terapia da hipnose me fez lembrar de coisas da minha infância que me explicaram o porquê de eu estar vivendo com um parceiro tão abusivo, e eu percebi que muito do que aconteceu na minha infância não deveria ter acontecido nunca. Muito disso aparece nas minhas letras. Muito desse desconforto". 

 

Bilinda foi o ingrediente final na receita que criou uma banda praticamente mitólogica.

A jovem Bilinda foi capaz de transformar memórias dolorosas que ela queria esquecer numa poesia surreal, caracterizada por um toque de mistério e melancolia que enriqueceram o som do MBV e que, em conjunto, formaram a cara da banda. Aliás, não é a toa que o rosto de Bilinda é capa do EP "Feed Me With Your Kiss", de 1988. E essa seria a única (até então) vez em que a banda usaria uma capa com o rosto de um membro aparecendo com tanta nitidez. O My Bloody Valentine conta também com outra mulher incrível, a Debbie Googe, uma baixista à altura de Kim Gordon, cujos movimentos frenéticos que lembram os pioneiros do punk rock, como o MC5 e, além disso, ela tem um look de rockstar dos anos 90 completamente icônico. 

O MBV é uma banda muito importante, pois foi praticamente responsável por criar o que veio ser a segunda onda de shoegaze do começo dos anos 90, e o toque feminino mágico de Debbie e Bilinda com os elementos sonoros brutais como a bateria selvagem com viradas de metralhadora de Colm e a guitarra de serra elétrica melódica de Kevin, em conjuto deram luz a uma das bandas mais autênticas e influentes da década de 80. E o mais importante, vale ressaltar, é uma banda com um rosto feminino. 

Bilinda Butcher é tão importante para o MBV, quanto Debbie Harry para o Blondie, e sua influência continua sendo enorme nos dias de hoje. Ela foi o ingrediente final na receita que criou uma banda praticamente mitólogica. Bilinda, seja lá quem ela é for por trás da sua obra, é uma verdadeira heroína. Definitivamente, uma estrela que brilha no rock and roll.

domingo, 3 de março de 2024

THE STONE ROSES: UM TEMPLO SAGRADO CAPAZ DE ELEVAR QUALQUER CORAÇÃO

 Por Juliana Vannucchi

No final dos anos 80 e início da década seguinte, quando o punk rock já não era mais uma novidade, a cidade de Manchester abrigou uma efervescente onda de bandas de rock que despontavam numa fascinante maré de criatividade. Esse período histórico e as características sonoras dessa geração de grupos emergentes ficou conhecido como “Madchester”. Foi justamente nesse contexto que surgiu o The Stones Roses, grupo formado em 1983, que contava com o talentoso Ian Brown nos vocais, John Squire na guitarra, Mani no contrabaixo e tinha Reni como baterista. 

O primeiro álbum da banda, intitulado “The Stone Roses” foi lançado somente em 1989. Alguns anos mais tarde, em 1994, o quarteto de Manchester presenteou o mundo com o segundo e último disco de estúdio, chamado “Second Coming”. Os integrantes ficaram juntos até meados da década de noventa, quando, por fim, se separaram. Posteriormente, em 2011, anunciaram uma turnê e chegaram até mesmo a produzir novos materiais. No entanto, a carreira da banda nesse retorno não emplacou tanto como quando o debut que chamou a atenção do mundo todo foi lançado. Esse memorável álbum de estreia carrega um total de 11 faixas e possui uma aura imensamente original, cuja musicalidade desvinculava-se tanto do punk rock, quanto do pós-punk, gêneros mais populares do período em que foi gravado. Em função desses diferenciados aspectos criativos e de sua peculiaridade estética, a banda é considerada representante do “alternative rock”, uma vez que foi essencialmente transgressora, escapando dos padrões de sua época e conseguindo aventurar-se em novos terrenos sonoros.

 

Escutar essa banda é uma viagem fantástica, um deleite libertador
 

O “The Stone Roses” é album que possui um carisma atemporal e cativante. Suas melodias grudam na cabeça e fisgam o coração, enquanto os sentimentos melancólicos despejados por Ian Brown soam como um sagrado templo acolhedor. É um disco extremamente qualificado em todos os sentidos possíveis, com variadas influências estilísticas e, em função desse conjunto de elementos, é improvável encontrar alguém que não se encante quando o ouve. Escutar essa obra-prima é uma viagem fantástica, um deleite libertador e repleto de mágica! O ouvinte simplesmente se perde por completo na  experiência sonora profunda das faixas desse apaixonante disco.

Vale citar que a icônica capa desse aclamado álbum chegou, com justiça, a ser eleita pela revista “Q” como uma das "100 melhores capas de discos de todos os tempos". No artigo da “Q” a respeito da arte da capa, o guitarrista Squire, que a criou, revelou: “Ian certa vez conheceu um artista francês quando ele estava viajando pela Europa. Esse cara estava presente em tumultos e contou a Ian como limões foram usados ​​​​como antídoto para gás lacrimogêneo. Havia um documentário com uma ótima cena no início, de um cara jogando pedras na polícia. Gostei muito da atitude dele”. Essa história contada por Squire, não apenas serviu como pano de fundo para a criação da capa do álbum, mas também inspirou uma letra da música "Made Of Stone". 

Essa banda tão inovadora nos deixou como herança um álbum catártico que é capaz de transformar qualquer momento da vida numa experiência atípica e verdadeiramente cinematográfica. O The Stones Roses oferece a trilha sonora ideal para dar sabor a essa existência estranha, que por vezes é tão amarga e indigesta.

domingo, 25 de fevereiro de 2024

PIXIES: ENTRE O INDIE E O INEXPLORADO

 Por Neder de Paula

O mundo do rock independente foi profundamente marcado nos anos 80 e 90 por uma banda que, mesmo não conquistando inicialmente os holofotes comerciais, moldou o cenário musical com sua abordagem única e visceral. Estamos falando dos Pixies, uma banda que deixou sua marca indelével na história do rock alternativo.

Formada em 1986 em Boston, Massachusetts, os Pixies eram compostos por Black Francis (vocal e guitarra), Joey Santiago (guitarra), Kim Deal (baixo e vocal) e David Lovering (bateria). Desde o início, eles desafiaram as convenções, misturando elementos de punk, surf rock e indie em um som cru e inovador. 

Os Pixies atingiram seu auge com os álbuns "Surfer Rosa" (1988) e "Doolittle" (1989). Faixas como "Where Is My Mind?", "Debaser" e "Monkey Gone to Heaven" tornaram-se hinos do movimento alternativo. A voz intensa de Black Francis, as letras surreais e as mudanças bruscas de dinâmica contribuíram para a singularidade da banda.

 

Os Pixies continuam a influenciar gerações de artistas, com suas contribuições ao rock alternativo reverberando em bandas contemporâneas.

No início dos anos 90, conflitos internos e pressões comerciais começaram a surgir. Após o lançamento de "Trompe le Monde" (1991), a banda entrou em hiato. Kim Deal deixou o grupo, e os membros seguiram caminhos separados.

Houve, no entanto, um retorno triunfal: os Pixies surpreenderam os fãs em 2004, anunciando seu retorno com uma turnê mundial. Em 2014, lançaram "Indie Cindy", o primeiro álbum de estúdio em 23 anos. Embora tenha recebido críticas mistas, mostrou que a chama criativa ainda queimava.

Os Pixies continuam a influenciar gerações de artistas, com suas contribuições ao rock alternativo reverberando em bandas contemporâneas. A fusão de elementos barulhentos, melódicos e poéticos permanece uma referência inegável.

A jornada dos Pixies é um conto de resiliência e reinvenção. Do cenário independente aos grandes palcos e de volta ao estúdio, eles deixaram uma marca indelével. A discografia diversificada e o impacto duradouro atestam que os Pixies não são apenas uma banda, mas um ícone do rock independente que transcendeu gerações. Seu legado, agora entrelaçado com os altos e baixos da vida musical, continua a inspirar e influenciar, perpetuando o espírito inovador que os colocou no mapa musical há décadas.

Audição sugerida (leia-se indispensável)

1. Surfer Rosa (1988)

2. Doolittle (1989)

3. Bossanova (1990)

4. Trompe le Monde (1991) 

5. Indie Cindy (2014)

6. Head Carrier (2016)

7. Beneath the Eyrie (2019) 8. Doggerel (2022)

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

METAL: UMA JORNADA PELO MUNDO DO HEAVY METAL

 Por Juliana Vannucchi

Jaquetas de couro, camisas pretas, cabelos longos… esses são alguns dos aspectos visuais que compõe a aparência clássica de uma das tribos urbanas mais presentes e cultuadas do mundo: os metaleiros, ou mais apropriadamente dizendo, os “headbangers”. É comum nos depararmos com eles andando pelas ruas, mas geralmente não conhecemos a cultura que se esconde por trás dessa aparência e, tampouco, costumamos conhecer suas reais influências sonoras e raízes históricas. Em 2005, um antropólogo canadense chamado Sam Dunn, que faz parte dessa tribo urbana, e decidiu realizar um documentário que mostrasse ao mundo a verdadeira face do heavy metal e de seus admiradores e representantes. Dunn se apaixonou pelo gênero musical aos 12 anos e conta que chegou a escutar o disco "The Number Of The Best", 25 vezes num único dia! Desde seu esse contato com o mundo do heavy metal, tornou-se um verdadeiro fã. O documentário de Dunn, de forma geral, foi muito bem recebido em todo o mundo. O antropólogo procurou realizar uma produção que desvendasse as origens históricas desse tipo de música, a ideologia, a cultura, seus efeitos sociais, e também as controvérsas existentes ao redor desse gênero.

O documentário de Dunn desenvolveu-se a partir da seguinte questão:“Por que o heavy metal até hoje é um gênero musical tão descriminado e estereotipado?” Para responder a essa pergunta, o canadense frequentou vários países diferentes e realizou filmagens em shows de bandas clássicas de metal, além de entrevistar seguidores do gênero e aclamadas figuras que formam esse universo. Ronnie James Dio, vocalista das bandas "Dio" e "Heaven And Hell", Tony Iommi, considerado um dos maiores guitarristas da história do rock, Bruce Dickinson, vocalista do Iron Maiden, e outros grandes nomes do metal, como Tom Araya, Dee Snider e Vince Neil são alguns dos personagens que cederam depoimentos para o produtor. Afim de relacionar esses artistas e bandas dentro de um amplo contexto, Dunn apresenta uma árvore genealógica que explora as vertentes do heavy metal e, assim, a partir desse aspecto vai desenvolvendo e organizando sua pesquisa, enquanto ele próprio narra seu roteiro que é mesclado com depoimentos desses músicos e de fãs do gênero.

Dentro dessa estrutura e em busca de respostas para e questão proposta, o filme é dividido em capítulos que dão uma pincelada por vários aspectos importantes do heavy metal, explorando desde seus primórdios, até o preconceito que existe contra esse universo. Dessa forma, o documentário vai tornando-se cada vez mais completo ao apresentar o amplo repertório de bandas desse meio, além de  assumir um caminho nitidamente bilateral na medida em que aborda de forma imparcial não apenas questões técnicas  e processos de criação sonora de músicas do gênero, mas assuntos mais sombrios e delicados, como, por exemplo, a linha de pensamento e ideologia de bandas de metal que tem afinidade com o satanismo e que, de certa forma, foram responsáveis por firmar um estereótipo já antigo que esse estilo musical e seus seguidores carregam. São discutidos também, assuntos como o machismo presente dentro do gênero, e como se deu, ao longo dos tempos, a inserção das mulheres dentro desse meio. Dunn também questiona ídolos do metal quanto a assuntos gerais, como religião, figurino, e retoma também como uma de suas temáticas, um dos momentos mais memoráveis da história do rock and roll, que foi quando Dee Snider, vocalista da banda Twisted Sister, depôs no Conselho de Pais, que foi criado pelo Senado norte-americano sob comando da reacionária Tipper Gore (esposa do ex-vice presidente dos Estados Unidos, Al Gore), com a grotesca finalidade de fazer diversas acusasões contra o heavy metal e outros gêneros (Prince e Madonna, por exemplo, também foram considerados imorais e acabaram envolvidos no caso). Nessa ocasião, Snider deixou a mídia, Gore, e todo o Senado boquiabertos com a qualidade e fundamentos de seus argumentos. Foi um dos momentos mais expressivos  e emocionantes da história do rock and roll. Em função desse acontecimento, até hoje, podemos ver o músico como um grande mito do rock e verdadeiro símbolo de resistência. Vale dizer também que esse cenário nos leva a reconhecer a rebeldia que o heavy metal carrega em seu DNA agressivo.


O heavy metal e seus fiéis seguidores sobrevivem e com certeza, sobreviverão com, ou sem esse julgamento.

Apesar de toda a qualidade da produção e da visão ampla que Dunn busca expor, considero que talvez ele pudesse ter valorizado e examinado um pouco mais a fundo a faceta histórica do metal, explorando melhor as bandas que formam o primórdio e as raízes estilísticas desse tipo de música. Possivelmente, a meu ver, isso fortaleceria ainda mais o trabalho do jovem antropólogo. Mesmo assim, o resultado final é incrível, emocionante e apresenta ao espectador o heavy metal como algo apaixonante, como uma espécie mundo paralelo acolhedor que está sempre de portas abertas para que qualquer um possa entrar nele. Independente de qualquer crítica por parte da sociedade ou até mesmo do Senado, o heavy metal e seus fiéis seguidores atualmente sobrevivem e, com certeza, sobreviverão sempre, apesar do constamente julgamento que sofrem, pois, afinal, a paixão musical que nutrem se sobrepõe a qualquer possível obstáculo que esse tipo de música e os headbangers possam enfrentar.

EU BEBERIA COM ESSES CARAS #02 - ANDY & ERON

 Por Juliana Vannucchi

E cá estamos nós, para mais um texto dessa coluna tão importante do Fanzine Brasil, através da qual homenageamos determinados artistas. E dessa vez… eu beberia com Andy e Eron, a fantástica dupla que dá vida ao The Edwoods, duo paulistano de macabrerock. Com certeza, nesse encontro tão especial, eu e os meninos teríamos muitos assuntos sobre os quais conversar e, certamente, daríamos muita risada juntos!! Eu tomaria somente uma água nessa ocasião, mas ofereceria, sem dúvida, boas doses de cachaça para os queridos amigos…

A princípio, iria homenagear a loucura descabida que estrutura a imagem do duo. Esse seria o pontapé inicial do nosso papo, pois, afinal, sempre me questionei: “Como será que Andy e Eron ficaram esquisitos assim? Bem, penso que, ou eles leram muitos livros do Nietzsche ou, então, escutaram muito The Cramps. Caramba! Provavelmente foi a segunda opção porque, acabo de me lembrar que, embora Eron seja um estimado professor de Filosofia, Andy é um péssimo leitor, incapaz até mesmo de assimilar uma simples receita de bolo (ele fica com dor de cabeça quando lê). Por outro lado, sei que o professor Eron, no entanto, nutre uma admiração especial por duas obras brilhantes, escritas por seus escritores favoritos: “O Amor é Um Cão dos Diabos” de Charles Bukowski e “As Intermitências da Morte”, de José Saramago. Aposto que você desconhecia essas referências culturais e literárias de Eron!

Enfim… Considero que certas fusões de referências bizarras deram luz a esse duo incrível que parece ter saído de dentro de um filme de terror trash dos anos oitenta, daqueles gosmentos, sanguinários e que contam com efeitos especiais de segunda mão. Na verdade, seria magnífico se algum cineasta roteirizasse um longa trash e convidasse os meninos para compor a trilha sonora. E aí? Alguém se habilita? 

Isso posto, em nosso encontro eu diria aos rapazes que ambos são muito talentosos. Ressaltaria que eles tocam bem demais e criam músicas perfeitamente alucinantes! Não à toa, os meninos, é válido citar, farão uma turnê internacional em 2024 (o homem genial por trás dessa conquista é o Neri, do Mullet Monster Mafia, Frenetic Trio, Escalpo & etc, que é grande amigo dos meninos). Esse feito, convenhamos, é digno de elogio! Sabemos, afinal, que poucas bandas do universo underground brasileiro conseguem voar tão longe e ter esse privilégio.  


Andy (esq.) e Eron (dir.): A dupla The Edwoods fará uma turnê internacional este ano.
 

Na sequência, iria querer saber um pouco mais sobre a história de vida de cada um dos Ed boys. Sei que eles nasceram na capital paulista e se conheceram durante os anos noventa, de uma maneira bastante inusitada: nesse período, tocavam em bandas rivais. Andy, sempre vestido com uma jaqueta de couro legítimo, surrado numa calça jeans justa e com cabelos longos na altura dos ombros, tocava numa banda de heavy metal e Eron, por sua vez, vestido em trajes discretos, era guitarrista de uma banda de rock nacional, daquelas com letras engajadas e ritmos fáceis (mas não era o Jota Quest rs). As bandas competiam em diversos festivais e, de acordo com Andy, depois de Eron perder tantas competições, o pobre guitarrista rendeu-se pediu pra tocar com ex-rival. Eu sei que essa história é verdadeira, mas iria querer mais detalhes a respeito de tais circunstâncias… 

Além desses assuntos, conversaria muito com o Andy sobre futebol. Na verdade, isso seria somente uma extensão de um papo que, com certa frequência, já faz parte das mensagens que trocados de vez em quando. Nós dois somos palestrinos e carregamos conosco, além da paixão pelo rock, esse outro gosto em comum. Somos fãs de Ademir da Guia e Edmundo, sendo este último, um jogador que, conforme costumamos dizer é “uma versão futebolística esdrúxula do Sid Vicious”. Justamente por isso, é nosso ídolo esportivo. 

Também perguntaria aos rapazes algo que sempre me intrigou: Como será que o Andy consegue tocar bateria e cantar daquele jeito? Na verdade, recentemente ele me revelou que está pensando em comprar um desfibrilador para levar aos shows porque anda meio sem fôlego.

Essa bebedeira com Andy e Eron seria uma celebração verdadeiramente dionisíaca, ou seja, seria repleta de caos, loucura e irracionalidade, tal como é a própria banda! O The Edwoods merece ser honrado por sua valiosa contribuição para a perpetuação do bom e velho rock and roll, que eles tocam com maestria! Vida longa a esse duo expecional!



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