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segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

CRASS: A BANDA ANARCO-PUNK QUE NOS ENSINA A SERMOS NOSSA PRÓPRIA AUTORIDADE

 Por Juliana Vannucchi
 

You must learn to live with your own conscience,
your own morality,
your own decision,
your own self.
You alone can do it.
There is no authority but yourself

Crass
Yes Sir, I Wil


Formada na Inglaterra, em 1977, ano de efervescência máxima do punk rock, a banda CRASS se tornou um dos maiores expoentes desse gênero musical. Em seus primórdios, teve bastante influência de música vanguardista e também do The Clash. Foi fundada por Penny Rimbaud e Steve Ignorant.

A banda se caracterizou por seu forte ativismo político e social, que se refletia tanto na estética do grupo como em suas ações. Visualmente, era comum o público ver os integrantes do grupo utilizando roupas militares, aspecto este que, de acordo com o público, era uma maneira de se postar contra o "culto à personalidade", ideia que, aliás, está presente também no logo da banda, que faz referência ao Nazismo, ao Cristianismo e à bandeira do Reino Unido, "autoridades" públicas soberanas que, conforme o pensamento proposto na identidade visual da banda, tendem a se deteriorar e se autodestruírem. Nos anos oitenta, a militância da banda a levou a participar de ações do Greenpeace e apoiar e impulsionar a Campanha pelo Desarmamento Nuclear (CND).

A banda CRASS também sempre defendeu e se identificou com o anarquismo e constantemente distribuía ao seu público panfletos informativos sobre o assunto.  


"Nós éramos extremamente independentes, você sabe. Não faríamos entrevistas à imprensa e não nos envolveríamos de forma alguma com grandes gravadoras (...)"
 

É importante citar que o grupo elevou a ideologia D.I.Y., componente básico e essencial do movimento punk em patamares práticos extremos e muito inspiradores. Exemplo disso é que integrantes da banda chegaram a viver na Dial House, uma casa de campo do século XVI, na qual desfrutavam de um estilo de vida autônomo muito semelhante ao dos hippies. Penny encontrou esse espaço num certo dia, enquanto andava de moto pela região, e começou a alugar a casa. As pessoas que lá viviam plantavam, colhiam e consumiam seus próprios alimentos. A respeito do local, ainda ativo nos dias de hoje, consta no portal Radical Guide: “Desde 1967, a Dial House tem sido uma casa aberta anarquista-pacifista e a base de operações para uma série de projetos culturais, artísticos e políticos que vão desde eventos de jazz de vanguarda até ajudar a fundar o Free Festival Movement” (https://www.radical-guide.com/listing/dial-house/). Atualmente, qualquer pessoa é bem-vinda no local e pode chegar na Dial House sem aviso prévio, tendo apenas que contribuir de alguma maneira, seja através da jardinagem, da produção artística, da escrita, ou de outra maneira. Ademais, não há nenhuma regra vigente na comunidade.  Além desse estilo de vida livre e alternativo, houve ao longo da história da banda outras atitudes ligadas ao D.I.Y., como o fato de que os membros do Crass criaram seu próprio selo para que pudessem gerir suas produções de maneira autônoma sem depender de gravadoras. Sobre o alcance e o legado da banda, Penny Rambou refletiu numa entrevista concedida ao Huck Mack: “Quando Steve e eu começamos, não tínhamos ideia de que a banda seria algo além de nós dois mijando na sala de música. Mas à medida que a coisa se expandia, todos nós vimos as possibilidades políticas... O punk inicialmente não era nada mais do que uma expansão do rock and roll. Era um pouco mais travesso e um pouco mais antissocial, mas muito dentro do contexto da indústria da música... Mas nós éramos extremamente independentes, você sabe. Não faríamos entrevistas à imprensa e não nos envolveríamos de forma alguma com grandes gravadoras. É por isso que montamos a [CRASS Records], que nos permitiu vender discos por um terço do preço comercial... Queríamos compartilhar essa [autonomia].” Cabe citar também que o próprio lema da banda, “There Is No Authority But Yourself”, que inspirou o título deste conteúdo, traduz a essência do D.I.Y. Penny ainda declarou na mesma entrevista acima citada: “Nós defendemos o faça-você-mesmo. E, na verdade, isso está acontecendo cada vez mais agora”. Na mesma entrevista, o vocalista ainda disse: “Nosso interesse é quebrar barreiras e redefinir; dizer às pessoas: ‘Qualquer um pode fazer o que quiser, mas você precisa realmente sair e fazer isso’… Encontre uma maneira de viver incondicionalmente”. 

 

 

Dial House.
 

Outro marco da história do CRASS é a artista Gee Vaucher, cujos trabalhos sempre tiveram como foco temáticas de cunho social e político. Essa artista nascida em Essex foi responsável pela criação de algumas capas icônicas de álbuns do CRASS, e também se tornou um dos nomes mais venerados e influentes de toda a estética punk. Foi ao lado dessa incrível mulher que Penny começou a alugar a Dial House e escrever a história mágica desse local. De acordo com a Vaucher, a casa possuía o intuito de ser um ambiente acolhedor e livre: “As pessoas sabem que, se não tiverem nada, podem pelo menos vir aqui por uma noite, recuperar as forças, ser alimentadas e regadas e, com sorte, sair com o coração melhor", comentou Vaucher numa entrevista concedida ao jornal britânico The Guardian. Vale citar que a própria mãe da artista foi enterrada na Dial House, de tão forte que foi a ligação de Vaucher com a casa de campo.

Que fique a lição... O CRASS é capaz de mudar vidas e incentivar qualquer pessoa, em qualquer aspecto possível. É uma banda necessária que abre nossas mentes e nos ajuda a construir uma visão de mundo mais crítica.

Referências:

https://www.ainfos.ca/02/nov/ainfos00589.html

https://thequietus.com/articles/05258-penny-rimbaud-crass-interview

https://www.radical-guide.com/listing/dial-house/

https://www.theguardian.com/culture/2014/jul/19/gee-vaucher-crass-penny-rimbaud

https://www.huckmag.com/art-and-culture/music-2/crass/

https://en.wikipedia.org/wiki/Crass

https://web.archive.org/web/20110604190525/http://www.music.ucsb.edu/projects/musicandpolitics/archive/2010-2/cross.pdf




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