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SIOUXSIE SIOUX - SOPROS DE VIDA

Grandes homens, assim como grandes tempos são um material explosivo interior do qual uma força imensa é acumulada (....)

“DISCO DA BANANA”- A OBRA PRIMA IGNORADA

Eu sabia que a música que fazíamos não podia ser ignorada

SEX PISTOLS - UM FENÔMENO SOCIAL

Os Sex Pistols foram uma das bandas de Rock mais influentes da história.

ATÉ O FIM DO MUNDO

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AFINAL, COMO SURGIU O CINEMA?

Um breve questionamento e historio sobre o assunto.

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WOLF CITY - AMON DUUL II

Wolf City é um dos maiores clássicos do Rock Progressivo. É um álbum que celebra magicamente este gênero musical, e que é foi gravado por artistas imensamente talentosos

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

UM PANORAMA HISTÓRICO DO UNIVERSO ARTÍSTICO DE ANGÉLICA LIMA

 Por Juliana Vannucchi

Angélica Lima, nascida em Osasco, na região metropolitana de São Paulo, atualmente é uma das personalidades artísticas mais prestigiadas de Sorocaba, e uma das grandes responsáveis por alimentar o insaciável e fértil fogo da arte local, com o qual ela contribui ao realizar um trabalho artístico intenso e de alcance multidisciplinar. Esse reconhecimento que hoje Lima possui na região de Sorocaba, foi conquistado a partir de muita luta, determinação e talento, sendo que toda e qualquer dificuldade surgida no decorrer de sua trajetória foi vencida pela força que a artista extraiu de sua mente inquieta e criativa, que sempre a preencheu com ideias extraordinárias que foram caprichosamente, acolhidas e gravadas em papéis, camisetas, bottons e adesivos. Esse vasto universo artístico de Lima, ganha vida a partir do uso de técnicas notavelmente diversificadas, como a aquarela natural, o guache – que muitas vezes conta com a finalização refinada do lápis de cor -, ou, enfim, as variadas técnicas mistas que a ilustradora explora com maestria.

“A intenção das minhas aquarelas de fauna e flora é levar o espectador a acessar sua criança interior".
 

A arte invadiu o coração de Angélica ainda na tenra idade e, desde a infância, a artista sempre teve afinidade com o desenho, sendo que até hoje, carrega lembranças do significado da arte nessa época precoce de sua vida. Lima mudou-se para Itapevi quando ainda era nova e foi lá que passou a maior parte de seus anos. Recorda-se de rabiscar a carteira da escola, de admirar as aulas de educação artística que envolviam pintura, desenho e recorte e da amorosa afeição e familiaridade que possuia com essa área, o que fazia com que muitos colegas solicitassem sua ajuda durante as aulas: “Eu era uma aluna um tanto preguiçosa, não gostava de estudar desenho, apenas desenhava o que me dava vontade ou algo que envolvesse alguma referência específica que me interessasse”. Angélica contou que no ambiente em que cresceu, a conquista de uma carreira profissional estável após a conclusão dos estudos, era a grande prioridade e, nesse âmbito, a vida universitária era pouco incentivada: “A mentalidade era arrumar um emprego e seguir a vida. Faculdade era algo muito difícil de se obter, então eu nem nutria expectativas nesse sentido e, além disso, não me considerava uma pessoa muito inteligente ou com capacidade para o mundo acadêmico. Apesar de ter tido boas notas no período escolar, as provas me deixavam nervosa. Por fim, ao me formar, aceitei esse destino convencional e simplesmente comecei a vida em empregos bem comuns”. A Fortuna, no entanto, guardava outra rota para a jovem de Itapevi, mesmo que ela ainda não soubesse disso. O fato é que, após concluir os estudos, Angélica ingressou no mercado de trabalho, que parecia ser o único caminho possível e, durante um tempo, ocupou vários cargos diferentes. Foi atendente em rede de fast-food, ajudante geral, trabalhou em cozinhas de restaurantes populares e também no escritório de uma metalúrgica. Nesse último emprego, porém, algo diferente aconteceu, pois Lima, em meio aos esforços e desgastes profissionais do cotidiano, conseguia encontrar um pouco de tempo para desenhar: “As pessoas com as quais eu trabalhava viam minhas ilustrações e perguntavam por que eu não trabalhava com isso”. Esse tipo de questionamento a influenciou de alguma maneira e, então, Lima passou a fazer cursos na área e, gradualmente, entregou-se cada vez mais ao universo da arte, que era a rota verdadeira e inevitável de sua vida. A Fortuna cumpria seus planos. A esse respeito, se recordou: “Primeiro fiz um curso livre, depois técnico e por fim, a faculdade. E assim fui me formando como artista, durante longos dez anos”. Nesse sentido, Lima também refletiu: “Na realidade, só tive coragem de aceitar o título de artista há alguns anos atrás, mas confesso que essa palavra ainda engasga um pouco para sair. A síndrome do impostor é muito presente entre os artistas, embora hoje eu esteja ciente de que sou uma artista visual, ilustradora e autora de livros infantis”.

As produções artísticas criadas por Angélica Lima portam um potencial catártico enérgico, que as torna elogiáveis e absolutamente dignas de admiração.

Desde então, Lima permaneceu focada na arte e, gradualmente, seu paraíso artístico foi se consolidando e ocupando um espaço cada vez maior em sua vida, até se transformar numa verdadeira empreitada profissional. Porém, embora atualmente trabalhe diretamente com suas produções, a jovem entende que, por vários motivos, o mercado de trabalho nessa área é instável e bastante desafiador: “Eu vim da periferia da grande São Paulo, mais precisamente de Itapevi e, por isso, na minha juventude se eu não tinha nem como sonhar com uma faculdade, imagina ter acesso a arte? E o mercado é muito complicado porque normalmente exige, de alguma forma, que a arte seja um produto e quando se é artista é difícil lidar com isso, porque aquilo que nós queremos fazer, a ideia que surge para nós, não é, necessariamente, o que vai ser vendido”.

No entanto, apesar dessas tantas barreiras mercadológicas destacadas por Angélica, gradualmente e cada vez mais, ela encontra espaços culturais e oportunidades que a permitam apresentar sua arte ao mundo. Lima já teve, por exemplo, alguns de seus trabalhos de aquarela expostos no Espaço Cultural Mário de Andrade, em Santana de Parnaíba, também já viu seu trabalho ser apresentado numa exposição do Espaço da Cultura, em Jandira, marcou presença em feiras de arte e artesanato do ateliê Revoada, situado na Vila Mariana, esteve na Feira Gibicon, no Butantã, e em Sorocaba viu suas obras na exposição "O jardim de Joana", no espaço cultural do Shopping Pátio Cianê, além de ter participado da Feira Colabora, da Feira Beco do Inferno e de outras atividades. Ademais, o sucesso de suas produções artísticas rompeu as fronteiras de nosso país e atualmente Lima tem algumas obras originais e cópias autorizadas no exterior. E cabe dizer que a bagagem e a contribuição cultural de Angélica Lima está além da pintura. A jovem artista também aventura no campo literário e tem dois livros infantis publicados. O primeiro chama-se "Raul, o Coelho" e o segundo, lançado recentemente, intitula-se "Niel Comeu Amora".

Mas apesar de tantas realizações e conquistas, Lima entende que ainda não construiu um legado artístico propriamente dito e, em relação a isso, de maneira humorada, refletiu: “Eu brinco dizendo às pessoas que compram minha arte, para que elas torçam para eu morrer drasticamente e de uma forma polêmica, para que a obra se torne cara. O sarcasmo mórbido e um dos meus defeitos. Outro defeito é não acreditar em mim mesma, por isso, para mim, é desafiador pensar nesse conceito de legado. Ainda sinto um certo desconforto ao me autointitular como artista”. No entanto, apesar dessas incertezas e dúvidas, uma coisa é certeza no coração de Lima. Trata-se o efeito que espera que sua arte gere nos espectadores: “Através das minhas aquarelas de fauna e flora, tenho a a intenção de levar o espectador a acessar sua criança interior, resgatar em sua vida os momentos sem telas, momentos em que achávamos incrível quando um simples inseto diferente aparecia e, então, nos atínhamos aos seus detalhes e cores, observando a forma como ele voava, andava ou pulava. Talvez minhas aquarelas sejam, portanto, uma forma de me comunicar com outras pessoas que se encantam com essas coisas, como se fosse uma espécie de código de uma gangue secreta, que diz: procura-se pessoas que amam ver pássaros fazendo ninhos”.

A arte existe como uma forma de iluminação, como um caminho divino que desperta o ser humano, sendo capaz de elevar qualquer alma e emocionar qualquer coração. E as produções artísticas criadas por Angélica Lima portam esse deslumbre, esse potencial catártico enérgico, que as torna elogiáveis e absolutamente dignas de admiração. Angélica Lima é um orgulho para Sorocaba. Precisamos abraçar artistas que alimentam a arte local e lutam pela construção de um cenário cultural amplo e fortalecido.



sábado, 7 de dezembro de 2024

MAGIA, APOCALIPSE GLOBAL E CRISES POLÍTICAS: O UNIVERSO DO KILLING JOKE

 Por Juliana Vannucchi

O Killing Joke surgiu na capital inglesa, em 1979, um ano no qual o cenário punk ainda era predominante e tomava conta dos clubes e ruas da cidade, embora já estivesse ligeiramente enfraquecido e perdendo terreno para novos grupos que despontavam e experimentavam criar estilos musicais diferentes. Composto pelo icônico vocalista e tecladista Jaz Coleman, pelo baixista Youth (que faleceu aos 46 anos, em 2007), pelo baterista Paul Ferguson e pelo inventivo guitarrista Geordie Walker (que faleceu em 2023), o Killing Joke foi, assim, um desses grupos que histórica e esteticamente sucederam o gênero punk. Desde os seus primórdios, a banda logo optou por trilhar rumos sonoros bem originais e essencialmente desapegados dos estilos vigentes mais tradicionais, tendo se tornado assim, um grupo mais associado ao rock industrial e à dark music, sendo considerados por alguns críticos, os verdadeiros pioneiros do post-punk. Porém, embora essas observações sejam cabíveis, rotular o Killing Joke é uma tarefa difícil e que carece de sentido porque, de modo geral, em sua discografia a banda oferece climas musicais muito diversificados e flerta com influências sonoras bastante variadas. Além disso, cabe dizer que nas veias de todos os integrantes, a ideologia proposta pelo movimento punk sempre pulsou e os levou a acreditar que eram capazes de fazer qualquer coisa em termos de composição. Coleman, numa entrevista concedida ao The Guardian, chegou a declarar que foi essa herança punk que o levou a não temer o fracasso. Como abandonou os estudos de maneira precoce, comentou: “O punk rock para mim era uma metáfora para a autoeducação. Na nossa banda, trocamos livros e nos educamos, e agora três de nós lecionamos em universidades quando não estamos tocando”.

Durante os anos oitenta, o Killing Joke triunfou com o lançamento de sete álbuns de estúdio, alcançado nessa década, o seu apogeu criativo. Destacam-se, nessa década, o dubut, o excelente “What's THIS For…!”, o “Fire Dances”, (1983), o “Night Time”, (1985), maior sucesso comercial da banda, e o "Outside The Gate" (1988), sendo que esses quatro últimos portam uma atmosfera obscura e dançante. Nos anos 90, a banda gravou três álbuns, mas nenhum deles de fato emplacou, especialmente porque o mundo estava dando uma atenção maior ao grunge que, com o impacto de sua novidade estilística, fazia com que os grandes nomes do pós-punk perdessem força. Em 2003, a banda surpreendeu o público com o lançamento do álbum “Killing Joke”, uma produção interessante e empolgante que fez bastante sucesso. Posteriormente, a o grupo inglês lançou mais quatro álbuns inéditos, mas nenhum teve o brilho das produções oitentistas. De qualquer maneira, entre altos e baixos na dinâmica de sua discografia, o fato é que o Killing Joke sempre foi extraordinária e esteve além do óbvio. Podemos, por isso, vê-los como uma banda vanguardista, que foi intensa no material que entregou aos fãs e que garantiu em todos os seus trabalhos uma notável dose de originalmente, sempre inundando as mentes dos ouvintes com músicas sublimes e misteriosas. Como resultado desse poder criativo que transcendia modelos e de sua força estética, a banda influenciou grandes nomes do rock como Nirvana e Metallica, nos quais reverbera de alguma maneira. Além disso, vários outros reconhecimentos vieram com o tempo, incluindo elogios de Jimmy Page ao lendário Walker, que foi o verdadeiro maestro na história do KJ, ajudando a definir o som característico do grupo. "Gordie", como era mais conhecido, manuseava seu instrumento de uma forma absolutamente incomum. Nos anos oitenta, por exemplo, afinou sua guitarra um tom totalmente abaixo do padrão. Por essas e outras razões, podemos vê-lo como um alquimista do universo pós-punk. Certa vez constatou a respeito de da potência de seu instrumento: "U'ma guitarra tem muito capacidade musical, mas tem o ritmo também, como instrumento, acho que tem o som mais agradável, o ataque, o ritmo”.

 

“A bolha econômica está prestes a rebentar de uma forma que nunca vimos nas nossas vidas” (Jaz Coleman)
 

Liricamente falando, percebemos abordagens niilistas nas letras, que portam um teor crítico e são substancialmente focadas em assuntos políticos, tal como desastres globais, miséria, medo, manipulação das massas e guerras. Muitas letras do Killing Joke descrevem um futuro despótico e abordam narrativas existências apocalípticas. Para o vocalista, suas músicas possuem advertências para a humanidade e são essencialmente proféticas. De acordo com Jaz Coleman, a faixa “Empire Song”, datada de 1982, teria, por exemplo, teria previsto a guerra das Malvinas. Cabe dizer que esses aspectos de cunho geopolítico que foram tratados logo nos primeiros álbuns, agradaram fãs do punk rock que, cada vez mais, passaram a valorizar e se interessar pelo Killing Joke. Por outro lado, tais abordagens geraram polêmicas e levaram o grupo a viver momentos controversos, como quando, num de seus gigs o KJ apresentou uma imagem do Papa abençoando legiões de nazistas. Levando em consideração esse apelo político que faz parte das letras da banda, Coleman, na mesma entrevista ao The Guardian que foi citada anteriormente, observou de maneira crítica que atualmente os governos gastam mais em armas do que investem em saúde. Também refletiu: “A bolha econômica está prestes a rebentar de uma forma que nunca vimos nas nossas vidas”, disse ele, prevendo a fome, a guerra e um abismo cada vez maior entre uma elite e uma classe baixa crescente. As tensões entre as nações são outro assunto que interessa ao lead singer. Por ternvivido perto da fronteira com a Ucrânia e trabalhado com orquestras na Rússia, ele teria sentido a guerra entre essas nações se aproximando. Para Coleman, estamos sendo controlados por governos maliciosos que nos matam lentamente sem que nem ao menos possamos nos dar conta disso: “(…) Quando você começa a retirar os nutrientes dos alimentos, você tem uma população doente, e quando você começa a pulverizar alumínio no ar e a colocar flúor na água, o sistema imunológico humano entra em colapso devido ao envenenamento por fluoreto de alumínio. Eles estão tentando nos matar: é lento, mas é algo seguro.”

Magia e ocultismo são outros temas que sempre percorreram a história do Killing Joke e, de alguma forma, moldaram a imagem da banda. Nesse sentido, certa vez Reynolds chegou a dizer que uma “energia tribal obscura, difícil de definir, girava em torno do grupo”. Coleman tem interesse declarado por essas áreas. Acredita em reencarnação e garante que lembra de ter morrido na guilhotina numa vida anterior - isso explicaria as razões pelas quais, durante a infância, intrigava seus pais construindo guilhotinas. Também já afirmou ter visto sete orbes de cor alaranjada na região central de Londres, sendo que numa delas pode contemplar a imagem de uma figura (um “homem palito”). O mais curioso é que ele não acreditava em UFOs até ter passado por essa experiência que foi memorável e absolutamente inexplicável. Ademais, cabe constatar que na época em que o grupo estava sendo formado por Coleman e Ferguson, os dois, afim de encontrar os membros restantes para dar vida à banda, asseguram ter feito um ritual de magia negra. Para isso, pintaram o chão de preto, desenharam um pentagrama cujos pontos cardeais estavam alinhados e, por fim, acenderam velas para iniciar a cerimônia... Mas o resultado dessa empreitada mágica foi um apartamento em chamas. Além disso, conforme Colin contou ao The Guardian: “Eu tinha uma biblioteca ocultista considerável desde os sete anos e Geordie era um mestre Cabalista”. Nesse contexto, o vocalista ainda explicou: “Compartilhamos um interesse por todo esse lado das coisas”. Coleman já declarou que acredita na existência do divino, mas que isso não quer dizer que ele crê no conceito tradicional judaico-cristão de um deus intervencionista. Na mesma entrevista em que fez essa declaração, também citou os universos paralelos com os quais a humanidade está cada vez mais familiarizada. O músico também afirmou que nossa concepção acerca do que é o tempo provavelmente será dissolvida em breve. Essas reflexões mostram o quanto Jaz Coleman tem a mente aberta para possibilidades metafísicas e questões que estão além dos limites do plano físico. Além dos campos da magia e do ocultismo, é preciso citar que o vocalista sempre foi bastante ativo em outras atividades. Grande apreciador de Beethoven, compôs sinfonias, dirigiu orquestras e ministrou palestras sobre sustentabilidade. Mas é durante seus shows, guiando com sua voz hipnótica os outros integrantes da banda por percursos sonoros místicos, que ele mostra o quanto a magia é real. E se existem outras dimensões, o Killing Joke com certeza é a estrada espiritual mais segura para que possamos acessá-la de alguma maneira…

Referências: 

https://www.loudersound.com/features/thinking-out-loud-killing-joke-s-jaz-coleman-1 

https://thequietus.com/opinion-and-essays/black-sky-thinking/killing-joke-post-punk/

https://www.theguardian.com/music/2024/mar/18/killing-joke-jaz-coleman-geordie-walker 

https://www.kerrang.com/jaz-coleman-when-killing-joke-really-lock-in-theres-this-strange-energy-between-us-all-and-it-was-born-in-magic


https://rollingstone.uol.com.br/noticia/lider-do-killing-joke-jaz-coleman-diz-que-poderia-ter-salvo-heath-ledger/ 

https://www.brooklynvegan.com/killing-jokes-jaz-coleman-talks-40th-anniversary-next-lp-ufos-and-more/

terça-feira, 15 de outubro de 2024

UM ENCONTRO ENTRE A POESIA E A PINTURA: CONHEÇA O LIVRO "PURIFICAÇÃO: O MEDO EM VERSOS", LANÇADO PELO FANZINE BRASIL

 Por Juliana Vannucchi

O livro de poesias Purificação: o medo em versos, organizado pelo site Fanzine Brasil e mediado pela Editora-chefe Juliana Vannucchi, foi lançado em quantidade limitada no final de setembro pela Editora Viegas (MA). O projeto literário contou com a participação de sete poetisas brasileiras: a psicanalista Natália Amanda (São José dos Campos/SP), a artística plástica Ana Maria Duarte (Sorocaba/SP), a pedagoga Everilda Menezes (Recife/PE), a pintora Soraya Balera (Sorocaba/SP), a professora Maria Sílvia Vannucchi (Sorocaba/SP) e a escritora Márcia Carriel (Sorocaba/SP).

A intenção foi criar um projeto de cunho coletivo que valorizasse escritoras independentes. Levando em consideração que, historicamente, durante um longo período de tempo, as mulheres não tiveram culturalmente, socialmente, intelectualmente e artisticamente o espaço que mereciam ter, o livro foi essencialmente feito por elas. Juliana Vannucchi,organizadora e idealizadora do projeto, comentou a respeito da proposta que moveu essa empreitada cultural: “Nossa intenção foi criar um projeto de cunho coletivo que valorizasse poetas independentes. O Fanzine Brasil preza muito pelo mutualismo, e tem a reciprocidade e a ideologia D.I.Y como grandes valores. São heranças do movimento punk. Que este livro seja inspirador e capaz de purificar os corações dos leitores. Sinto que nossa produção artística é uma espécie de epifania poética”.

Purificação: o medo em versos oferece ao leitor uma teia de meditações acerca do medo, arquitetada em torno de expressões subjetivas das poetisas participantes que mergulharam em seus interiores para buscar intuitivamente aquilo que é indizível a respeito desse sentimento, e depois transformar o indizível em palavras. A psicanalista Natália Amanda, uma das escritoras que participou da produção do livro, destacou a importância do projeto: "Nos últimos tempos, percebemos que vivemos em um mundo acelerado, onde não há tempo para reflexões ou para elaborações sobre a vida e o medo. Este livro oferece uma saída alternativa para o tratamento do sentimento do medo de uma forma poética e curativa, permitindo que cada leitor experiencie essa emoção por meio do seu envolvimento com a leitura, de maneira prazerosa", declarou. 

 

Desde seu lançamento, o material tem atraído a atenção de vários leitores, uma vez que sua abordagem é um tema comum a todos: o medo.

No decorrer do processo de criação do livro, as autoras basearam-se num lema criado por Vannucchi: “A poesia é uma necessidade da alma”. Tendo essa concepção em vista, todas, por meio dos versos que elaboraram, pretendem percorrer os corações dos leitores e enfeitiçá-los com uma verdadeira epifania poética. Em relação ao efeito que espera que o livro gere nos leitores e enfatizando essa ideia da poesia como uma necessidade humana, Everilda Menzes, refletiu: "A poesia é  a palavra que compõe a história das pessoas. Que faz materializar as emoções no verso. Quem redigi o preenchimento do vazio da alma é  a inspiração do poeta e a poesia responde  a todos sem nunca tê-los  visto. A poesia é a palavra  reconhecendo o próprio  dever de existir; pleno, em um mundo de dúvidas. Se sobreviver  é uma forma de continuar existindo... a existência é uma  poesia! Logo, precisamos da poesia pra sobreviver!" 

Ademais, visando apresentar uma experiência estética ampla, além de conter uma série de poesias inéditas, o livro também possui ilustrações autorais exclusivas. Essa elegante combinação entre poesia e pintura, que foi idealizada pelas próprias escritoras, resulta num verdadeiro deleite para todos os amantes da arte, que certamente apreciarão o rico conteúdo oferecido por essa original e caprichada produção literária. Soraya Balera destacou o privilágio e a importância do livro: “O medo, como tema da nossa produção literária, é um poder capaz de transformar os ciclos de nossas vidas. Dar vazão aos sentimentos é, de fato, purificar o medo por meio de versos”.

Atualmente, exemplares do livro circulam por diferentes cidades e estados do país, podendo ser encontrado em livrarias e bibliotecas de São José dos Campos (SP), Sorocaba (SP), Piedade (SP) e Recife (Pernambuco), dentre outras localidades.

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

THE PSYCODELHIC FURS: A PODEROSA BANDA DE ART ROCK

Por Juliana Vannucchi

O ano de 1977, na Inglaterra, foi um período particularmente importante e primoroso na história do rock, uma vez que, nessa época, inúmeras bandas punks e pós-punks surgiram e/ou lançaram discos icônicos que até hoje fazem sucesso e são altamente influentes. No meio dessa produção musical massiva, encontra-se o Psychedelic Furs, banda formada na capital inglesa pelo vocalista Richard Butler e seu irmão, o baixista Tim Butler. Ao longo de sua carreira, o grupo lançou um total de oito álbuns de estúdio, sendo o debut em 1980 e o último em 2020. Os irmãos sempre foram o fio condutor da banda, embora a formação original tenha sofrido alterações ao longo dos anos.

O The Psychedelic Furs tomou rumos sonoros muito diversificados no decorrer de sua trajetória e em alguns momentos foi bastante experimental, aspecto que levou a banda, inclusive, a ser categorizada como uma representante do gênero “art rock”. Talvez esse aspecto os tenha afastado dos holofotes porque, ainda que sejam bastante conhecidos entre os fãs do punk e do post-punk, seu sucesso certamente não é o mesmo de outros remanescentes da época, como o The Cure, The Smiths, Bauhaus, entre outros, cuja imagem foi altamente comercial. No entanto, o The Psychedelic Furs merece atenção. A banda é muito original em suas composições e essas mudanças de rota sonora que foram citadas revelam o quanto os membros do grupo eram criativos e habilidosos. Em relação ao significado e à proposta musical do grupo, certa vez, Richard Butler declarou: “Gosto de música que me ajuda a compreender-me, porque quando me compreendo também consigo entender um pouco melhor o mundo lá fora”. Por meio de suas letras, o vocalista procura levar as pessoas a serem mais reflexivas e tem uma postura um tanto crítica em relação à escrita: “Não há nada que eu odeie mais do que bandas que escrevem sobre a vida na estrada, sobre rock na estrada, todas as mulheres que conseguem e todas as drogas e bebidas que obtêm por aí. Não creio que haja algo mais tedioso quanto cantar sobre a posição que se ocupa. Acho que você está realmente ficando sem ideias quando faz isso”. Butler também chegou a contestar as composições líricas de grupos famosos, como The Smiths e Echo & The Bunnymen: “Eles juntam palavras e imagens para parecer poesia, mas na verdade não têm a essência da poesia, e é um tipo de coisa perigosa. Eles afirmam ser influenciados por Rimbaud, Mallarmé e Beaudelaire, mas a meu ver eles estão apenas juntando as palavras e fazendo com que isso pareça poesia. É como se alguém pegasse um pincel e um pouco de tinta, pintasse um monte de caixas e simplesmente chamasse isso de cubismo, sem realmente olhar para o que o cubismo significava, como objetos retratados em três dimensões, apresentados em uma série de planos. Não basta alguém desenhar muitas linhas retas, fazê-las parecerem caixas e chamar isso de cubismo."

 

O Psychedelic Furs é uma banda poderosa, capaz de aquecer qualquer coração e aliviar qualquer alma perturbada.
 

A banda manteve-se firme até os anos noventa, período no qual houve uma cisão que duraria até o início da década seguinte, quando os membros voltaram a reunir-se, chegando até mesmo a fazer uma turnê mundial para celebrar a sua volta. Atualmente, o grupo figura entre os tantos que seguem sendo aclamados pelo que produziram nos anos setenta e oitenta, mas ofuscados por produções populares e comerciais. Butler segue bastante ativo, sendo que recentemente, juntamente com Martin Gore, escreveu a música "Ghosts Again", primeiro single do álbum Memento Mori do Depeche Mode, lançado no início de 2023. O Psychedelic Furs é uma banda poderosa, capaz de aquecer qualquer coração e aliviar qualquer alma perturbada. 

O pai dos irmãos Butler era químico e é descrito como um sujeito comunista e ateu. Nos anos setenta, quase se tornou embaixador científico na União Soviética. A mãe dos meninos era artista. Todos esses elementos tocaram o coração de Richard, que foi o fundador da banda, e influenciaram sua trajetória existencial e musical. Butler estudou e formou-se em artes em Londres. Atualmente, inclusive, ele é um pintor prestigiado e tem suas obras expostas com bastante frequência em diversos locais.

Referência bibliográfica: 

https://www.artistwd.com/joyzine/music/psychedelic_furs/furs.php 

https://www.spin.com/2020/07/richard-butler-on-the-psychedelic-furs-first-album-in-29-years/ 

https://www.nme.com/features/music-interviews/the-psychedelic-furs-tim-butler-david-bowie-pretty-in-pink-2808731

BALLET CLANDESTINO: UMA LENDA DO PÓS-PUNK NACIONAL

 Por Juliana Vannucchi

Em 2012, na capital paulista, despontava a banda Ballet Clandestino, que com o passar dos anos se firmaria como um dos nomes mais significativos do pós-punk nacional. Atualmente, sua formação conta com o brilhante Vinícius Primo, que comanda a guitarra e o vocal, Natan, contrabaixista e vocalista, além de Tyofrey, o talentoso baterista do grupo. A discografia do powertrio é composta por um total de 4 EPs, todos lançados em formato físico, sendo que a mais recente produção, intitulada “Ruído Que Desorganiza”, foi lançada em 2023.

 

Ballet Clandestino: uma banda perigosa ao senso comum e valiosa aos que desejam sair da caverna.
 

Todos os EPs da banda são cativantes e dignos de elogio. As músicas, instrumentalmente falando, são carregadas de pinceladas melancólicas e possuem uma atmosfera predominantemente obscura. As letras, por sua vez, são bastante poéticas, expressam um teor reflexivo e tratam de maneira profunda uma série de conflitos que tangem a realidade humana, como o caos, o absurdo existencial, a solidão, o desespero, dentre outros temas. Além desses aspectos mencionados, as letras também integram críticas sociais e abordagens de cunho político, voltando-se especialmente ao submundo que se oculta por trás do luxo e da correria dos grandes centros urbanos. Devido a tais características, o Ballet Clandestino é uma banda notavelmente singular, emergente das sombras, capaz de envolver sentimentalmente o seu público e, ao mesmo tempo, convidá-lo a contestar a realidade ao seu redor. É um grupo niilista, observador da trágica condição humana, e com uma postura não-conformista, que registra todos esses elementos em seus poemas sonoros. Trata-se de uma banda perigosa ao senso comum e valiosa aos que desejam sair da caverna. Certamente seria um dos grupos presentes na playlist de Lord Byron, que curtiria o som do Ballet Clandestino tomando uma taça caprichada de vinho! Perder-se nas músicas da banda é mergulhar nas profanas e nefastas aventuras que compõem essa estranha vida.

Por toda sua qualidade, o Ballet Clandestino, esse trio ultrarromântico pós-moderno, resiste ao tempo e permanece sendo um cultuado e lendário símbolo do pós-punk nacional, sendo sempre capaz de oferecer ao público conteúdos musicais consistentes e empolgantes.



SPACE MACHINE: A MÚSICA DO FUTURO E A NOVA ERA DO ROCK NOVA IORQUINO

 Por Juliana Vannucchi

James Fox, residente em Nova Iorque, é um sobrevivente da cena punk setentista, que o influenciou fortemente em termos sonoros e ideológicos. O músico, sempre armado com sua guitarra e abastecido por seus sentimentos, ao lado do baterista Eric Blitz, recentemente deu vida ao seu poderoso projeto "Space Machine", através do qual está trabalhando num legado musical que, invariavelmente, está fadado ao sucesso. Com um talento que pulsa em suas veias, James deseja que sua música seja capaz de reverberar na mente e no coração de seus ouvintes. 

 

O Space Machine ofecrece uma sonoridade distópica, alternativa, única e absolutamente fantástica, criada por um guitarrista que está em plena ascensão
 

A música sempre foi um fator necessário na vida de James, que desde a tenra idade a percebia como uma fonte de inspiração e de paixão. Ela nunca deixou de acompanhá-lo, de andar ao seu lado e de, alguma maneira, ser uma espécie de templo protetor. Mas houve um acontecimento traágico que mudou drasticamente os rumos de sua vida e o lançou de vez para um incessante processo de criação musical. Atualmente, Fox, que se apresentará em Nova Iorque no mês de setembro, festeja o simples fato de poder subir aos palcos, pois ele é uma verdadeira fênix do rock, renascida das cinzas da morte. Isso porque, numa fatídica noite de abril de 2020, logo no início da pandemia, foi vítima de um atropelamento que o deixou numa condição de saúde gravíssima, fazendo com que ficasse perto da morte. Ele teve seu rim perfurado, fraturou quatro costelas, quebrou as duas pernas e teve uma séria concussão na cabeça. James se recordou dos terrores dessa experiência: "Lembro-me literal e vividamente do som do metal quando afundei sete centímetros no capô dianteiro do carro. Lembro-me imediatamente depois da forte explosão do vidro estilhaçado do para-brisa, quando a frente da minha cabeça fez contato... sons que nunca esquecerei, seguidos pela vaga sensação de estar no ar, a última coisa de que me lembro antes de acordar". Tudo que ele vive agora, de alguma forma, está entrelaçado ao acontecimento daquela noite e à cadeia de circunstâncias que se seguiu após o acidente. Para James Fox, essa vivência não ocorreu para que ele se tornasse uma testemunha silenciosa, mas, sim, para que extraísse dela algo poderoso e sagrado que pudesse, por meio de sua sensibilidade interior, transformar-se em música. Refletindo, ao recordar-se sobre como essa experiência dolorosa modificou sua perspectiva existencial, comentou: "Agora vejo e sinto toda a beleza, a alegria, a maravilha, o mistério, desta vida e deste mundo... Mas o caminho para cima também passa... Nada muda sem reconhecimento absoluto e honestidade absoluta". Seu coração catalisou as marcas psicológicas e físicas deixadas naquele noite. E o sofrimento virou arte, assumiu a forma de melodias. A música do projeto "Space Machine" é o espectro da beleza gerada pelos horrores que foram confrontados por James, que toca guitarra com uma virtuosidade brilhante e absolutamente hipnótica. 

O "Space Machine" é um projeto musical de enorme potencial criativo e que conquistará o coração de todos os apreciadores de rock, ao oferecer um estilo musical inovador do qual nossas almas precisam para se elevar e se purificar. Nesse projeto, nós nos deparamos com o tipo de composição do futuro, que transgride fórmulas comuns e navega por mares originais e sem precedentes, nos quais pedais variados fazem com que a guitarra seja a condutora de uma mescla de space rock com punk e hard, algo vidrante - uma espécie de fusão do melhor de Johnny Thunders com o melhor do Eloy. Trata-se de uma sonoridade distópica, alternativa, única e absolutamente fantástica, arquitetada por um guitarrista que está em plena ascensão e que é uma promessa valiosa no cenário da música independente dos EUA. Nova Iorque, novas eras estão surgindo... sua história nunca terminou nos anos setenta e há novos músicos por aí, prestes a serem consagrados como tantos outros que honraram seu solo. O rock and roll para James Fox é uma missão de vida. Abra seu coração para os hits selvagens de James Fox e explore asonoridade cativante do Space Machine...

segunda-feira, 5 de agosto de 2024

THE MODERN LOVERS: A OBRA-PRIMA SETENTISTA DE JONATHAN RICHMAN

 Por Juliana Vannucchi

O The Modern Lovers é uma das bandas mais interessantes e singulares dentre as tantas que despontaram nos EUA durante a frutífera década de setenta. O principal mérito dessa lenda do proto-punk é a criatividade em termos de construção musical, uma vez que o grupo simplesmente não seguiu nenhum tipo de padrão sonoro vigente em sua época, elevando-se, assim, a um patamar totalmente inovador em termos estéticos.

A banda de Boston, cuja formação inicial contava com Jonathan Richman, guitarrista e vocalista, o contrabaixista Ernie Brooks, o tecladista Jerry Harrison e o baterista David Robinson, esteve em atividade entre 1970 e 1974, embora o debut, intitulado “The Modern Lovers”, que conta com um toque de produção de John Cale, tenha vindo à tona somente em 1976, depois da ruptura do quarteto. Durante esses quatro anos de percurso musical, o visionário Jonathan Richman sempre destacou-se como o verdadeiro maestro que manteve o selo de qualidade da banda, guiando-a por vastos e originais trilhos sonoros. Esses aspectos se evidenciaram porque Richman foi um poeta urbano de imensa sensibilidade que compunha suas canções de forma livre e espontânea, sem muitos apegos estilísticos, ainda que portasse consigo influências de bandas como The Stooges e The Velvet Underground, que despertaram seu interesse na época do ensino médio. Suas primeiras composições foram feitas justamente nessa referida época, quando tinha aproximadamente quinze anos de idade. Nessa fase incial de sua trajetória musical, o inexperiente jovem apresentava-se em locais modestos, como cafeterias e bares, nos quais, conforme certa vez se recordou, chegou a espantar o público rapidamente em função de suas dificuldades com o manejo da guitarra. Nesse momento de sua vida, em Boston, Richman foi uma espécie de poeta deslocado e aspirante musical, até que decidiu se mudar para a calorosa New York, um fervoroso palco cultural da época que o transformou por completo. Lá, o garoto observou a cena local e acompanhou de perto a atividade de gênios como Andy Warhol. Todo esse cenário deixou uma marca artística grandiosa cravada no espírito de Richman que, então, voltou para Boston e, em sua terra natal, juntou-se com outros músicos para fazer nascer o The Modern Lovers. A respeito desse período vivido em NYC, refletiu: "Eu saía com algumas pessoas daquela cena tarde da noite e só ia a lugares para dançar, sempre adorei dançar. E então percebi que queria formar uma banda e voltei para Boston". Foi então que Richman prometeu para si mesmo que a música, em sua vida, pulsaria sempre como arte e que se em algum momento isso se tornasse um trabalho e fugisse da esfera underground, ele desistiria da empreiatada, pois, conforme certa vez afirmou "não acredito na música assim".

 

O The Modern Lovers foi um grupo de vanguarda que em seu único álbum conseguiu ser altamente revolucionário.
 

Mais tarde, com a banda consolidada, o visionário Richman basicamente gravava a declamação de suas poesias - por vezes, produzindo uma espécie de spoken word com resquícios de lamento e melancolia e em outros momentos, cantando com certa velocidade - e as preenchia com espetaculares e precisas linhas de guitarra que normalmente asseguravam aos singles um clima fundamentalmente psicodélico. Numa ocasião, durante uma entrevista, a respeito de seu apreço por poesia, declarou: “Poesia, se você a ama, ela entra em suas conversas e em tudo que você faz”. Também disse gostar de Rumi e “de um cara chamado José de la Espronceda, do século 19 (…) Poetas italianos, franceses. Hum… Chuck Berry era poético”. Somado a esse notável talento poético, estavam os demais integrantes do The Modern Lovers, que possuíam uma refinada habilidade instrumental e davam seus toques glamourosos às aventuras líricas de Richman. Jerry Harrison, em particular, ao fazer bom uso do órgão em certos singles, faz com que, em determinados momentos, o grupo soe ligeiramente semelhante ao The Doors.

O The Modern Lovers é o tipo de banda capaz de conquistar qualquer ouvinte que flerte com o rock and roll. Foi um grupo de vanguarda que em seu único álbum conseguiu ser altamente revolucionário em termos de composição e estilo e, dessa forma, deixou uma herança musical incontestável e requintada, que foi e permanece sendo imensamente influente.

Referências: 

https://www.theguardian.com/music/musicblog/2011/aug/10/modern-lovers

https://pitchfork.com/reviews/albums/10645-the-modern-lovers/

https://web.archive.org/web/20151007012937/http://synthesisweekly.com/interview-with-jonathan-richman/





THE EDWOODS BRILHA NA EUROPA

 Por Juliana Vannucchi

O The Edwoods, duo paulistano formado por Andy, vocalista e baterista e pelo guitarrista Eron, é parte de um vasto grupo de artistas nacionais que luta pela música independente e, com resistência, faz com que a cena autoral brasileira permaneça sólida. Musicalmente, a dupla se destaca especialmente por seus criativos experimentos sonoros que flertam com os gêneros psycobilly e garage rock, sendo essa mescla maravilhosamente complementada com uma aura barulhenta e essencialmente underground. 

Entre maio e junho de 2024, o The Edwoods realizou sua primeira turnê internacional, chamada “Plan 9 European Tour”, composta por mais de dez apresentações feitas em palcos de diversos países do continente europeu, que estremeceu com a presença alucinante de Andy e Eron. Em sua página oficial no Instagram, os Edboys declararam que a turnê foi especial e revelaram terem vivido  “momentos selvagens e inesquecíveis nas estradas e palcos, além de terem conhecido pessoas loucas e maravilhosas por lá”. 

 

A turnê europeia da dupla foi épica e encheu os fãs brasileiros de orgulho ao revelar que nosso país tem músicos talentosos que estão escrevendo um lindo capítulo na história do rock nacional.
 

Nesses memoráveis gigs intercontinentais, o The Edwoods fez enorme sucesso e chamou a atenção do público em todos os locais pelos quais passou. A dupla foi amplamente elogiada e teve sua performance comparada com as apresentações do The Cramps. Com shows cheios e contando com um público bastante fiel, os meninos se entusiasmaram e esperam poder repetir a dose, passando novamente pelo continente assim que possível.  O The Edwoods cumpriu bem o seu papel: transformou acalmados palcos europeus em verdadeiros hospícios.  O rock and roll raiz, vibrante e enérgico de Andy e Eron, não há dúvida, conquistará todos os cantos do globo... O duo certamente dominará o mundo com sua música trash e seu trejeito psicótico.

quinta-feira, 20 de junho de 2024

SIDAN ROGOZINSKI LANÇA NOVO EP: VALE MUITO A PENA ESCUTAR

Por Juliana Vannucchi

No início de junho, Sidan Rogoziński, talentoso músico do interior paulista, anunciou o lançamento do EP “Steatmeant”, que encontra-se disponível integralmente no Spotify. Com um total de sete faixas, dentre as quais encontram-se canções inéditas e singles antigos, Sidan, munido de seu violão e de sua potente voz, conduz os ouvintes através de uma sonoridade que os leva de volta ao melhor que os anos noventa ofereceu. Mas o EP não se restringe somente a essa espécie de viagem pela aura grunge. Ele conta também com experimentos musicais que, em alguns momentos, dialogam com o punk rock, como é o caso da faixa “Heart’s Ain’t Enought”, que é crua, veloz e minimalista, mas ainda assim, capaz de fisgar o ouvinte com seu refrão enérgico. Vale a pena destacarmos o hit “OH MAN!”, que consiste num verdadeiro e poderoso hino alternativo do universo musical de Sidan Rogoziński. Não é exagero algum dizer que essa faixa figuraria nas paradas globais dos anos noventa. "Sal" e "I Don't Hate You" são as mais sensíveis e tocantes do EP, as duas encantam e são capazes de agradar qualquer ouvinte que possua um gosto musical minimamente refinado. "Pequena Canção Para Pêssego Dormir" é uma ótima faixa e está entre as antigas que foram selecionadas para o EP. Por fim, temos o single "Outro Lugar", que é uma verdadeira ode poética.

 

O “Steatmeant” figura entre as mais empolgantes produções independentes do ano.
 

Cabe dizer ainda que Sidan, que atualmente trabalha como radialista, tem um passado musical elogiável e acumula um currículo vasto nesse meio. Ao longo de seu percurso, já ministrou aulas de violão e já fez parte de diversas bandas, como a “Divastrabica”, a “Medrar” e também a “Madreperola”, sendo que foi com esta que, em 2020, havia lançado sua última leva de produção musical inédita. E apesar de todas as suas contribuições com esses respectivos grupos terem terem sido admiráveis, podemos dizer que seu maior acerto está realmente no “Steatmeant”, que figura entre as mais empolgantes produções independentes do ano. Neste trabalho, de modo geral, Sidan Rogoziński mostra-se um artista mais maduro, criativo e confiante.

Para sorte dos amantes do bom e velho rock e dos fãs da cena musical independente, Sidan nos garantiu que há mais material para ser lançado. O músico, que acredita no potencial da arte, em seu alcance e valor, refletiu: “Arte é a expressão mais íntima de uma pessoa, suas visões e perspectivas. Quando uma peça de arte é feita com essa entrega ela se torna eterna, um monumento”. Aguardaremos ansiosamente os novos materiais desse brilhante artista brasileiro cuja voz, mesmo que desacompanhada de qualquer instrumento, já é por si, uma verdade obra de arte.


domingo, 9 de junho de 2024

ALICE BAG: LUTAS FORA DO PALCO E LEGADO HISTÓRICO

 Por Juliana Vannucchi e Pedrinho Sangrento

Alice Bag começou sua carreira musical muito cedo, liderando uma banda importante, a The Bags, da qual foi vocalista e compositora e que a levou a obter um prestigioso destaque na cena do punk rock norte-americano do final dos anos 70. Junto a ela, na formação inicial da The Bags estavam presentes duas outras lendas punks transgressoras, Alicia Armendariz e Patricia Morrison. O período de atividade do grupo foi curto, iniciando-se em 1977, ano consagrado em que inúmeras bandas punks emergiram nos EUA e na Inglaterra, e encerrando-se quatro anos mais tarde, em 1981.

Antes, porém, de travar contato com o universo musical e obter reconhecimento nesse meio, a vida de Alice foi marcada por momentos sombrios repletos de dificuldades. Ela cresceu no leste de Los Angeles com sua família, composta pela mãe, pelo pai e por sua meio-irmã, todos nativos do México. Nesse cenário, Alice teve uma relação um tanto complicada com o progenitor, pois ele agredia sua mãe diante de Alice. Em contrapartida, em partes ele à apoiava muito - possivelmente porque, cabe dizer, ela era sua única filha legítima. A mãe, por sua vez, era muito boa com Alice e com sua irmã. Bag, contudo, se incomodava com o postura passiva da mãe em relação aos atos de violência cometidos pelo pai e relatou até mesmo já tê-la confrontado seriamente a respeito de um possível divórcio, porém, alegando pensar no bem-estar de suas filhas, a mãe recusou prontamente sua sugestão, o que deixou Alice se sentindo um pouco culpada. Além dessas dificuldades domésticas, em sua adolescência, a jovem e tímida Alice foi vítima de bullying quando estava no Ensino Médio, e isso a levou a um estado de isolamento social, no qual contava apenas com a companhia de seus heróis musicais, como Elton John e David Bowie. Nesse âmbito, podemos entender que a música - tanto ouvida, quanto produzida por Alice - foi uma garantia de salvação e uma tranquilizante válvula de escape de sua conturbada realidade. Alice, certa vez declarou que nesse período, cultivou sentimentos de autossuficiência e independência, o que a levou, numa certa ocasião, a se vestir como David Bowie para ir à escola. Esse tipo de postura excêntrica se reflete bastante na persona energética e cheia de atitude que era Alice Bag  nos palcos.

Além disso, fora do universo musical, Bag, ao longo de sua vida, se afeiçoou por outras áreas, graduando-se em Filosofia, além de também ter trabalhao como professora, ministrando aulas de inglês. Na verdade, sua aptidão por cultura e o deslumbre de sua postura intelectual iniciaram-se na juventude, pois Alice,  quando ainda frequentava o Ensino Médio, decidiu aprimorar seu vocabulário e aperfeiçoar seu inglês, utilizando palavras extremamente sofisticadas no seu dia-a-dia e tentando as pronunciar da maneira mais clara possível.

 

"O punk nos permite falar o que pensamos". (Alice Bag)
 

Certa vez, num evento de cunho social no qual participou como ativista, declarou que o lugar do punk no movimento feminista consiste em manter-se sempre desafiador, chamando a atenção para coisas erradas que estão, infelizmente, enraizadas na sociedade. Nesse sentido, com bravura, Bag declarou: "O punk nos permite falar o que pensamos".  Ademais, vale citar que em sua admirável trajetória, já publicou alguns livros. Cabe nos atermos especificamente a um deles, chamado “Violence Girl” no qual, dentre outras abordagens, Bag comenta sobre como o caso de violência doméstica acima citado a fez envolver-se com o feminismo e querer lutar contra a opressão sofrida pelas mulheres. 

Além de tudo que já foi mencionado, a incansável Alice Bag tem bastante destreza com a pintura e, inclusive, já teve algumas de suas telas expostas. Também criou e ministra um acervo digital no qual há entrevistas com diversas mulheres que marcaram presença na primeira onda da cena punk do sul da Califórnia na década de setenta. É um arquivo composto por materiais históricos vastos e preciosos, no qual há conteúdos sobre diversas personalidades, como fotógrafos, músicos e escritores que fizeram parte dessa geração.

Alice Bag, como podemos ver, nos oferece uma herança inspiradora e de enorme importância que não se restringe ao meio musical. É uma mulher militante que carrega em si um brilho artistico e cultural verdadeiramente digno de admiração.

sábado, 25 de maio de 2024

THE SECRET DOOR: UM MERGULHO NO UNIVERSO POÉTICO DE CYNTHIA ROSS

 Por Juliana Vannucchi

A poesia é um movimento necessário da alma, por meio do qual exprime-se o indizível. É uma linguagem que escapa à razão e algumas pessoas, como Cynthia Ross, possuem o dom de despertar para esse fabuloso universo poético e assim, transformar o invisível em palavras. Foi isso que ela fez ao longo de todo seu percurso musical, durante o qual foi contrabaixista e também a principal letrista da cultuada banda canadense The 'B' Girls, que transformou em melodias memoráveis muitos dos poemas escritos por Cynthia Ross. Atualmente, ela vive em Toronto, sua terra natal. Está distante dos palcos e mais focada em escrever poesias, sendo esta uma atividade indispensável em sua vida e que desde a juventude fez parte da sua trajetória. Cynthia nos contou que na época do Ensino Médio, já tinha uma forte conexão com a música e com a arte. Nesse período, praticava balé, adorava desenhar, dançar e ler livros: “Fazia qualquer coisa que proporcionasse uma saída criativa e servisse como oportunidade para explorar o mundo da imaginação”. A respeito, particularmente de sua habilidade poética, refletiu: “A poesia é minha voz interior ou a voz dos anjos ou mesmo de outros seres. É o inconsciente universal que flutua ao nosso redor em reinos superiores. Geralmente escrevo de manhã, antes que as distrações do dia assumam o controle. Minhas inspirações são experiências… passadas, presentes e imaginadas, e também as emoções que são desencadeadas por tais experiências”.  
 

Cynthia Ross: "Muitas vezes me disseram que escrevo o que as pessoas sentem, mas não conseguem expressar em palavras". (Foto: Rick McGinnis)
 
Recentemente, durante uma turnê de leitura de poesias realizada em abril, Ross anunciou o lançamento de seu inédito álbum solo de spoken word, intitulado "The Secret Door", que está sendo comercializado em formato de CD e LP. Com isso, vemos que agora, a b-girl tornou-se uma verdadeira "beat girl poet", uma vez que nessa produção, a talentosa poetisa canadense faz leituras e também canta alguns de seus mais famosos poemas, sendo acompanhada pelo brilhante multi-instrumentista Tim Bovaconti, responsável pelos envolventes arranjos musicais nos quais encontramos uma  atmosfera sonora parcialmente misteriosa e caprichosamente complementada por um clima que flerta com traços do pós-punk e com elementos sonoros psicodélicos. Após esse lançamento, perguntei a Cynthia que tipo de efeito ela espera que sua poesia cause nos leitores e também quais são suas principais referências literárias. Ela declarou que seu processo criativo é livre e não envolve pretensões ou expectativas: “Muitas vezes me disseram que escrevo o que as pessoas sentem, mas não conseguem expressar em palavras. Não escrevo com nenhuma expectativa. Eu apenas escrevo o que vem”. E revelou que lê com bastante frequência e tem preferência por Leonard Cohen, Rumi, Sylvia Plath, Langston Hughes, Robert Frost, Irving Layton, todos os poetas da Geração Beat, Ginsberg, Nikita Gill, dentre outros. 
 
 
O "The Secret Door" abre portas novas e mágicas ao ouvinte.
 
Ao escutarmos esse prodigioso álbum, vivemos a experiência mágica de abrir novas portas que nos lançam para um universo diferente, no qual encontramos fragmentos do coração, das ideias, dos pensamentos e das histórias de vida de Cynthia Ross que, com uma imensa sutileza, descreve as tantas faces que moldaram sua realidade. Contudo, também encontramos a nós próprios em suas palavras e nas expressões de seus sentimentos e emoções. Dessa forma, as poesias de Cynthia Ross são capazes de penetrar nosso espírito e servir como espelhos metafísicos nos quais somos capazes de nos decifrar. "The Secret Door" é um trabalho competente que oferece ao ouvinte um conteúdo intenso e apaixonante.

sábado, 11 de maio de 2024

"ARTE NÃO É COMODIDADE": PAUL TALBOT REFLETE SOBRE SEUS DESENHOS E SOBRE O UNIVERSO ARTÍSTICO

 Por Juliana Vannucchi

Paul Talbot, residente de Piedade, uma singela e fria cidade localizada no interior paulista, é um talentoso desenhista e quadrinista que ao longo dos últimos anos, viu suas produções artísticas lhe renderam cada vez mais destaque e reconhecimento. Em sua vasta bagagem, acumula participações em diversos eventos culturais, como o Ilustra Comic Fest, ocorrido em 2023, o Gibi SP, que também aconteceu no ano passado, além de ter marcado presença no Palco Livre, em sua cidade natal, no Sesc Sorocaba, e na XXVII Feira do Beco do Inferno, que também ocorreu em Sorocaba, em 2024. E aliás, foi justamente nesse último evento citado que eu conheci o trabalho de Paul Talbot. Na referida Feira, que reuniu uma quantidade volumosa de diferentes e habilidosos artistas da região, o universo visual criado por Paul e sua forma de expressão artística, atraiu particularmente a minha atenção. Foi justamente essa experiência que deu vida ao presente texto. Lembro-me claramente que no instante em que me deparei com as criações de Talbot, percebi de imediato que seus desenhos pareciam captar a atmosfera sombria das histórias de Edgar Allan Poe e misturá-las com os elementos fantásticos de Lovecraft. Como resultado, suas ilustrações me pareceram verdadeiros portais que se abrem para um mundo paralelo, no qual encontramos criaturas mágicas e ambientes despóticos. Conversando com o artista, fui capaz de compreender melhor suas perspectivas sobre a arte e as propostas que pairam por trás da  originalidade de suas ilustrações, que nos transportam tão facilmente para além dos limites habituais do espaço e do tempo. 

 

Paul Talbot entende que um dos principais significados da arte é o espírito de revolta que ela desperte no ser humano.

A arte entrou na vida de Paul por meio da escola e através de programas televisivos. A partir disso, desde a tenta idade, ele passava horas imerso em seu processo criativo e sempre se empenhava em aprimorar suas técnicas. Os anos se passaram e Talbot nunca parou desenhar, nutrindo sempre uma imensa paixão por essa atividade. O quadrinista entende que a arte, sua eterna companheira, deve ter espaço na vida de todas as pessoas, pois assim como ela sempre foi relevante para ele, pode ser também prazerosa e transformadora para qualquer um: “Penso que a importância da arte para o ser humano e para a sociedade em si, é algo imensurável. Até mesmo boa parte daquilo que é consiste na arte mainstream, muitas vezes teve em sua origem numa fonte que demandou criatividade, ou seja, exigiu um modo novo de produzir. Por mais, é claro. que seja um saco ver o corporativo "capitalizar" em cima dessas coisas, é de suma importância existir essa autenticidade... Essa postura de não se curvar diante da indústria mainstream, de não perder sua identidade mediante as cobranças que ela faz, evitando contaminar-se por ela. O artista seguiu sua reflexão sobre o tema: “Eu mesmo não vejo problema algum no fato de eu não viver da minha própria arte e tê-la apenas como hobby, como uma paixão, contanto que ela permaneça autêntica ao invés de se tornar um “produto” que visa seguir tendências específicas. Acho que foi o David Lynch que certa vez disse que “viver a vida artística é uma vida de trabalho".

 

Paul ostenta um brilhantismo estético especial em suas produções que são, na maior parte das vezes,  permeadas por elementos fantásticos, pelo horror e por referências a símbolos e criaturas mística.
 

A partir das considerações e diálogos acima, perguntei a Talbot se ele acredita, levando em conta o atual contexto da realidade brasileira, ser possível viver apenas de arte. A esse respeito, o ilustrador respondeu, de maneira meditativa: “Bem... Dar aula de arte é viver de arte, por mais que não consiste numa venda direta da obra artística em si? Ou, então, viver de arte seria viver da arte sem "comprometer" a visão artística? Ou poderíamos aceitar nesse sentido alguns desenhos feitos sob encomenda? Isso sem contar a necessidade de correr atrás de projetos culturais e eventos para participação e venda da arte, além de divulgação e etc. Então, em suma, acredito que seja possível... Mas não há uma "fórmula" específica para isso; há caminhos, meios. No campo artístico é preciso dar “os pulos” (risos) e mesmo assim, não há segurança ou garantia”.

Paul ostenta um brilhantismo estético especial em suas produções que são, na maior parte das vezes,  permeadas por elementos fantásticos, pelo horror e por referências a símbolos e criaturas místicas. Tudo isso se expressa através de detalhes impressionantes e de uma enorme variedade de cores. Nesse sentido, o ilustrador nos contou que, embora trabalhe com fan-art, também dá vida aos seus próprios personagens: “Crio tanto obras originais, quanto fan-art. Fan-art, no caso envolve esboçar um determinado personagem que já existe, contudo, eu faço isso sempre dentro do meu próprio estilo de desenho, valorizando os meus traços. A ideia dos personagens, cenários e etc. sempre está alinhada com algo que quero contar. Muitas vezes ocorre, portanto, uma espécie de simbiose para fazer a narrativa funcionar. Às vezes, basta eu pensar numa "imagem" ou "fala" para começar a construir uma história ao redor disso”. O artista revelou ao Fanzine Brasil que por meio dessas abordagens, pretende surpreender e também articula-se para gerar um certo desconforto naqueles que contemplam seus desenhos: “Tento fazer algo que cause uma espécie de "impacto visual" capaz de misturar o belo e o grotesco. Uma repulsa atraente, eu diria”. 

 

"Sempre tive interesse em desenhar os arcanos maiores porque adoro a estética de tais cartas" (Talbot)
 

Um dos legados mais autênticos do jovem ilustrador e que chama a atenção pela engenhosidade, é seu baralho de tarot. A esse respeito, nos contou: “Foi meu projeto do Inktober de 2022. Sempre tive interesse em desenhar os arcanos maiores porque adoro a estética de tais cartas. A ideia de fazer a temática horror industrial/mecânico veio do filme "Tetsuo: O Homem de Ferro". Porém, eu busquei transmitir a ideia do ser humano sendo usado como matéria prima para uma indústria comandada por uma inteligência artificial. Até mesmo os números e nomes das cartas, além da forma habitual, também são descritos com código binário e código baudot, respectivamente. Que é pra dar mais ainda essa impressão de ser a "máquina" no comando de tudo. O código baudot foi uma homenagem ao conto "I have no mouth, and I must scream" do Harlan Ellison. 

Para encerrar nossa produtiva conversa, Paul Talbot também discorreu sobre o significado arte e sobre a importância do espírito de revolta que ela envolve, podendo, a partir de tal estado, libertar o ser humano das tantas amarras que o cercam: “Arte não é comodidade. É preciso acreditar na visão, no processo. Deve haver revolta… e que essa revolta sirva como fonte de inspiração”. Artistas como Paul impressionam pelo modo através do qual brincam com suas imaginações e, dessa forma, conduzem os espectadores para caminhos inusitados, diferentes do convencional. Por isso, podemos seguramente afirmar que o dom de arte corre nas veias de Talbot, que possui maestria em sua habilidade, além de carregar em si um notável e inesgotável ímpeto de criatividade.

quarta-feira, 1 de maio de 2024

FEMINISMO, ARTE E SONIC YOUTH: A VIDA REVOLUCIONÁRIA DE KIM GORDON

Por Juliana Vannucchi

Acho que é possível dizer que o Sonic Youth sempre tentou desafiar as expectativas das pessoas”. (p. 151, 2015).

Após um casamento de quase 30 anos, em 2011, Kim Gordon e Thurston Moore anunciaram o divórcio e decretaram com isso o fim do Sonic Youth. Alguns anos mais tarde, a baixista da banda alternativa mais importante dos anos oitenta publicou um livro biográfico que em português foi intitulado “A Garota da Banda”, no qual Gordon compartilha com os leitores alguns dos momentos mais marcantes e decisivos de sua vida. Ela aborda em detalhes o fim trágico de seu casamento, marcado por uma traumática traição do marido, além de tecer comentários sobre bastidores de álbuns, músicas e videoclipes da banda norte-americana.

Sabemos que ao longo de sua trajetória, Kim destacou-se especialmente como baixista do Sonic Youth, e geralmente a conhecemos somente sob tal rótulo. Contudo, acabamos por nos limitar se a considerarmos apenas por essa perspectiva, pois ela também merece ser lembrada pela sua carreira como artista visual. Aliás, cabe dizer que numa entrevista concedida em 2022, Gordon chegou a dizer que sempre se reconheceu mais como artista do que musicista. E em sua biografia, fala que se sentia limitada como cantora, sendo que justamente por isso optou por fazer uso de uma abordagem vocal falada e rítmica. Embora nunca tenha se visto como uma boa cantora ou musicista, lembra aos leitores que (...) desde o início, o rock and roll nunca teve base em formação musical ou técnica, assim como o punk rock nunca teve a ver com ser um bom músico”. (p. 137, 2015). Ainda nesse contexto, explica: “O melhor tipo de música vem quando você é intuitivo, inconsciente de seu corpo, perdendo a cabeça, de certo modo (...)”. 

"O detalhe é importante, pois ele praticamente se torna a própria obra quando se trata de arte conceitual”. - Kim Gordon

   
Desde a juventude, Gordon sempre nutriu um forte interesse pela arte e decidiu que esse era o caminho profissional que desejava trilhar. Nesse período de sua vida, o irmão de um amigo chegou a confrontá-la a respeito de sua escolha: “Artista? Como vai virar artista? E se você falhar? Você tem um plano B?”. Mas Kim estava convicta a respeito de seu destino e de seu desejo: “Nunca me ocorreu que eu poderia falhar”. Em sua biografia, ela releva que no universo das artes, seu primeiro mentor (conforme ela mesma define) foi um artista conceituado chamado John Knight. Segundo Gordon (p.83, 2015), ele a ensinou “que qualquer coisa - um carro, uma casa, um gramado - poderia ser vista e analisada em termos estéticos”. Ele também lhe mostrou que “toda arte deriva de uma ideia”.  “Discutíamos em detalhes qualquer coisa que aparecesse ou estivesse ali por acaso - que tipo de fonte uma máquina de escrever usava, por exemplo. Uma mais previsível ou mais rebuscada?”. E completa Kim: “Isso pode parecer trivial, mas mostra que o detalhe é importante, pois ele praticamente se torna a própria obra quando se trata de arte conceitual”. Vale observar que esse referido contexto artístico certamente influenciou de alguma forma a estética e a sonoridade do Sonic Youth, banda que abusou de experimentalismos melódicos, de ruídos e de dissonâncias.  

 

"As mulheres são anarquistas e revolucionárias naturais". -  Kim Gordon
  

No final dos anos setenta, Kim Gordon estudou no Otis Art Institute. Sua primeira exposição foi realizada poucos anos depois, em 1981. Cabe dizer que ela contribuiu com inúmeros campos culturais diferentes, como moda, design, cinema, pintura, etc. A título de curiosidade, vale dizer que antes de seguir sua carreira artística, trabalhou como ajudante de garçom e assistente de escritório.
    
No livro, Kim também conta o quanto a convivência com Keller, seu irmão esquizofrênico, foi dramática e deixou marcas na artista, embora ela também assuma sua consideração e carinho por ele. Keller sempre foi inteligente e apresentou autores importantes para Kim (como Nietzsche, Balzac e Sartre, por exemplo), porém, também fazia brincadeiras agressivas e um tanto perturbadoras. Uma vez, por exemplo, pulou nu na cama da irmã. Keller se formou na Universidade da Califórnia e fez mestrado em clássicos na Universidade de Berkeley , sendo que foi nessa época que teve seu primeiro surto psicótico completo. Depois desse episódio, piorou bastante e precisou ser internado numa casa de repouso. Keller faleceu no início de 2023.
    
Em uma de suas fotos mais icônicas, vemos Kim vestindo uma camiseta verde na qual está escrito em letras pretas discretas: "Girls invented punk rock, not England". De fato, o punk não nasceu na Inglaterra, ele apenas amadureceu, desenvolveu-se e teve seu auge no país. E as mulheres, em sua própria natureza, talvez tenham, de fato, inventado o punk rock. Certa vez, Kim fez a seguinte declaração: “As mulheres são anarquistas e revolucionárias naturais, porque elas sempre foram cidadãs de segunda classe e tiveram que fazer o seu próprio caminho”. Na biografia, a baixista, que sempre mostrou envolvimento com o feminismo, comenta que em geral as mulheres não têm realmente permissão para “mandar ver”, para agir como gostariam e ser o que desejam. A esse respeito, escreve: “(...) Culturalmente nós não permitimos que as mulheres sejam tão livres quanto elas gostariam e isso é assustador. Nós ou rejeitamos essas mulheres ou as consideramos loucas (...) No final do dia é esperado que as mulheres sustentem o mundo, não que o aniquilem”. (p. 137, 2015). Kim também alfinetou Lana Del Rey, ao expressar sua indignação com a banalização do feminismo e das lutas das mulheres: “Hoje temos pessoas como Lana Del Rey que nem sabem o que é feminismo, que acreditam que as mulheres podem fazer tudo o que quiserem, o que, em seu mundo, é flertar com a autodestruição, seja dormindo com homens mais velhos nojentos ou sendo estuprada por um grupo de motociclistas". A crítica se refere a um polêmico videoclipe em que Del Rey aparece sendo violentada sexualmente e também serve, sobretudo, como resposta a uma entrevista concedida certa vez pela cantora pop, na qual disse: “Não estou interessada em feminismo. Minha ideia de uma verdadeira feminista é uma mulher que se sinta livre o bastante para fazer o que quiser”. Kim ainda indagou nesse trecho do livro: “Se ela realmente acredita que é bonito quando os músicos desaparecem numa espiral de drogas e depressão, por que ela não se mata?”. No mesmo ano, Gordon disse também que Lana Del Rey “não sabe nada sobre feminismo” e que é popular porque faz música fácil, convencional e que “apela para bases genéricas”, razões pelas quais a cantora conseguiu tornar-se famosa. O eixo das críticas de Kim consiste na ideia de que há uma indústria machista por trás de imagens e lutas banais do feminismo e, portanto, é preciso que haja cautela e atenção para que ações aparentemente de cunho feminista no universo musical não estejam, na verdade, alimentando fantasias masculinas e discursos machistas. Ela está certíssima em relação a isso. Às vezes, afinal, conceitos ilusórios de liberdade e de luta apenas nos escravizam ainda mais e alimentam os detentores do poder.
    
Kim Gordon é muito mais que uma baixista. Ela é um verdadeiro ícone cultural e provavelmente é a artista mais intelectual surgida do universo punk. É fundamental que a vejamos sob essa perspectiva que não se limita aos palcos. Precisamos de músicos militantes, pensantes, ousados e criativos como Kim. As tais bases genéricas que fomentam a indústrias musical saturam e são fracas. Nossas mentes prezam por um alimento mais profundo, por um estímulo sonoro mais desafiador, capaz de dialogar com a nossa alma e fazer nosso corpo responder automaticamente a isso. Precisamos muito do Sonic Youth! 

Referências:

GORDON, Kim. A garota da banda. Rio de Janeiro: Fábrica231, 2015.

terça-feira, 16 de abril de 2024

VIDAS, VOZES E VULTOS: A IMPORTÂNCIA CULTURAL DO HOTEL CHELSEA NA HISTÓRIA DO ROCK

 Por Juliana Vannucchi

“Eu adorei esse lugar, sua elegância miserável e a história que ele guardava de forma tão possessiva... Muitos escreveram, conversaram e tiveram convulsões nessas casas de bonecas vitorianas. Tantas saias haviam balançado naquelas desgastadas escadas de mármore. Tantas almas transitórias se casaram, deixaram uma marca e sucumbiram aqui.”

Patti Smith

Construído entre os anos de 1883 e 1885 e inaugurado em 1884, o imponente Hotel Chelsea, que possui um total de doze andares e localiza-se na 222 West 23rd Street, figura entre os prédios mais antigos de New York, Atualmente, é considerado um importante ponto turístico. Na realidade, desde a época de sua construção, o hotel já despertava a atenção popular por ter sido o primeiro prédio comercial da cidade, por estar entre os mais altos e também por ser, desde os primórdios, visualmente expressivo. O espaço tornou-se especialmente conhecido por ser um dos locais mais emblemáticos da história do rock and roll, sendo palco de incicentes trágicos, zona de inspiração e abrigo para ícones deslocados do mundo da música. Ao longo do tempo, marcaram presença no Chelsea algumas das lendas mais prestigiadas da história do rock, como Iggy Pop, Jim Morrison, Patti Smith, Iggy Pop, John Cale, Patti Smith, Greatful Dead, Alice Cooper, Pink Floyd, Jeff Beck, Dee Dee Ramone, Leonard Cohen, Phil Lynott, Janis Joplin, Sid Vicious, Jimi Hendrix e muitos, muitos outros,  além de ter hospedado alguns dos nomes mais influentes da literatura mundial, como Allen Ginsberg, Mark Twian, Jack Kerouac, Arthur C. Clarke (que, inclusive, escreveu o o clássico “2001: Uma Odisseia no Espaço” num quarto do hotel) o casal de intelectuais Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre & muitos outros célebres escritores.  Ademais, cabe citar, ainda que brevemente, que muitos pintores, cineastas, fotógrafos, atores e atrizes dos mais conceituados tiveram passagem pelo Hotel Chelsea, dentre os quais, destacam-se Stanley Kubrick, Al Pacino e Dennis Hopper – mas a lista é muito mais extensa. Á título de curiosidade, vale dizer também que sobreviventes do Titanic passaram um tempo hospedados lá... 

O hotel em si, histórica e brevemente falando, oscilou entre momentos de ostentação e glória e de enfrentamento de crises. Durante os anos setenta, a maioria de seus ocupantes eram moradores fixos e, nesse período, o ambiente começou a entrar em situação declínio, tendo ocupações muito precárias e uma alarmante infestação de baratas. Isso, no entanto, não impediu, por exemplo, que estrelas do teatro e do cinema vivessem por lá. Foi um momento real de crise, mas que foi insuficiente para afastar a atenção pública. Na verdade, a aura decadente, de certa forma, apenas tornou o espaço mais interessantee charmoso para algumas pessoas, sendo que foi justamente no decorrer dos anos setenta que o ambiente se tornou propício e popular entre músicos e bandas de rock. Na época em questão, o uso indiscriminado de drogas e bebidas passou a imperar descontroladamente no hotel e um bordel operava em suas instalações. Era um ambiente, genuinamente perigoso, repleto de assalto, roubos, suicídios, morte e violência. Enfim... condições que muitos evitam e tantos outros buscam... 

Aliás, nesse ponto de nossa abordagem, é preciso mencionar também que há um lado bastante sombrio em relação à história do hotel, uma vez que várias mortes brutais aconteceram por lá, rendendo ao local a fama de mal-assombrado! A morte mais conhecida do hotel, sem dúvida foi a de Nancy Spungen, companheira de Sid Vicious, mítico baixista dos Sex Pistols, que encontrou o corpo da namorada debaixo de uma pia de banheiro, na manhã do dia 12 de outubro de 1978. Ela havia sido violentamente esfaqueada no abdômen. Sid confessou que eles tiveram uma forte discussão na noite anterior e, em desespero, após encontrar Nancy sem vida, tentou limpar a faca usada para matá-la. Ele foi acusado pelo crime sangrento e chegou a ser preso, mas sua fiança logo foi paga e o músico normalmente negava a autoria do crime, embira algumas fontes aleguem que tenha admitido em certas ocasiões. Vicious veio a óbito poucos meses depois do ocorrido, antes mesmo que acontecesse o julgamento do caso.  Rockets Redglare, um fornecedor de drogas que frequentava o local também foi acusado e aparentemente, assumiu o crime em círculos de amigos. Porém, de modo geral, devido a todos esses aspectos, até hoje, o assassinato de Spungen permanece sendo um evento nebuloso e envolto em mistérios.  Falando nesse lado obscuro, Dee Dee Ramone, famoso baixista do Ramones, chegou a escrever um livro chamado “Chelsea Horror Hotel” no qual relatou como foi a experiência de viver no Chelsea e, em seus registros, fala a respeito da presença de demônios e de energias atípicas. Entretanto, essas pinceladas sobrenaturais, parecem ter sido apenas uma cartada usada por Dee Dee para tornar seu livro mais atrativo.

O Hotel Chelsea foi um espaço cultural de extrema importância. Foi palco de incidentes, zona de inspiração e abrigo para ícones do rock and roll.

Reflitamos: Qual outro lugar no mundo foi capaz de atrair tantos espíritos talentosos e geniais, de áreas tão diferentes? Parece que tudo aconteceu naqueles quartos e corredores, habitados por uma clientela diversificada, pelos quais cambaleavam diariamente personalidades boêmias e transitavam figuras excêntricas, aspirantes a artistas, almas eufóricas, talentosas, depravadas e elegantes, que transformaram o espaço num campo minado decadente de drogas e álcool e ao mesmo tempo, num verdadeiro polo artístico no qual ocorriam experimentos de vanguarda. Desde seus primórdios, o hotel recebeu inquilinos muito variados, de ocupações e classes sociais bem distintas – e na maior parte das vezes, todos “juntos e misturados”. E, o mais importante é que o hotel sobreviveu a todo tipo de mudança. Leiamos e pensemos nas observações feitas pelo jornalista Pete Hamill sobre o público tão variado que passou por lá: "Radicais na década de 1930, marinheiros britânicos na década de 40, Beats na década de 50, hippies na década de 60, poseurs decadentes na década de 70". Ainda, dentro desse âmbito, é válido citar uma menção datada de 1993, publicada pelo The New York Times: "Teimosamente resistente à mudança, o Chelsea está - ainda - na moda." O repórter em questão ainda ilustrou o hotel da seguinte maneira: “É uma Torre de Babel de criatividade e mau comportamento que, no entanto, permaneceu um sucesso”. No contexto específico do rock and roll, enfoque de nosso texto, podemos considerar que o hotel serviu como um verdadeiro abrigo para almas marginalizadas, desajustadas e deslocadas. Foi um espaço quer surgiu de passagem ou mesmo residência para artistas que estavam existencialmente perdidos e/ou que precisavam de um ambiente confortável para poder produzir sua arte com maior liberdade. Nesse sentido, o Chelsea Hotel deixou como legado inúmeras histórias interessantes para os fãs do rock, como, por exemplo, o fatídico encontro entre Leonard Cohen e Janis Joplin, ocorrido num elevador, que acabou tornando-se um breve romance, cuja história foi imortalizada na canção “Chelsea Hotel #2”, na qual Cohen relata momentos íntimos vividos com a amante e expõe seus sentimentos de maneira honesta, eloquente e crua.

Joplin foi uma das tantas personalidades lendárias que marcou presença no Chelsea.

Andy Warhol, brilhante artista norte-americano, grande mestre da pop-art e guru do punk rock, usou o Hotel Chelsea para suas ousadas criações artísticas. Lá, em 1966, ao lado do coprodutor Paul Morrisey, ele gravou parte do filme “Chelsea Girls”, produção que mostra a vida cotidiana de algumas mulheres conhecidas por Andy e que viviam no local. É um longa de cunho experimental, bastante exótico, gravado com pessoas reais que interpretaram a si mesmas, e conduzido de maneira bem peculiar (vemos, por exemplo, imagens sendo mostradas na tela dividida ao meio, sendo um lado da tela em P&B e outro colorido). É um filme um pouco difícil de ser digerido e por isso, foi um tanto mal interpretado, recebendo bastante crítica negativa. Contudo, foi uma produção libertadora e que influenciou muitos cineastas de gerações seguintes. Curiosamente, cabe destacar que o título do filme inspirou o nome do primeiro álbum solo de Nico, ex-Velvet Underground, chamado “Chelsea Girl”.  Aliás, muitas músicas de alguns dos mais renomados mitos do rock foram influenciadas por vivências no local, ou fazem até mesmo alusões diretas ao hotel. É o caso da famosa “Third Week In The Chelsea”, de Jefferson Airplane, “We Will Fall”, clássico soturno do The Stooges, da balada “Midnight In Chelsea”, de Bon Jovi e tantos outros hinos atemporais. Além disso, o clip oficial da espetacular faixa “Edie (Ciao Baby)”, do The Cult, foi gravado nas intermediações do local e, assim, em certa medida, a música e o vídeo são uma verdadeira homenagem ao hotel.

Como pudemos observar, o Hotel Chelsea foi um recanto cultural que rendeu ao mundo incontáveis e brilhantes produções artísticas. Lá, pessoas imensamente talentosas sentiram-se suficientemente acolhidas e encontraram a atmosfera ideal para colocar suas ideias em prática e vivenciar suas liberdades criativas. Ademais, o Hotel Chelsea também foi um ambiente que ajudou particularmente a subcultura punk a se consolidar no cenário norte-americano, uma vez que vários músicos memoráveis que participaram do movimento em questão viveram e/ou se hospedaram no local. Por todos os aspectos listados e mencionados, esse solo consagrado, que também é caracterizado pela magia de sua bela arquitetura, se tornou, de modo geral, um point expressivo para a própria história social, ideológica e estética do rock and roll.

Referências:

https://aventurasnahistoria.uol.com.br/amp/noticias/vitrine/historia-hotel-chelsea.phtml

https://veja.abril.com.br/comportamento/um-icone-renovado-o-retorno-do-chelsea-hotel-apos-11-anos-de-hiato/mobile

https://en.wikipedia.org/wiki/Hotel_Chelsea

https://www.vanityfair.com/culture/2013/10/chelsea-hotel-oral-history

https://www.kidsofdada.com/blogs/magazine/17972221-inside-the-chelsea-hotel

https://cademeuwhiskey.wordpress.com/2017/05/26/chelsea-historias-e-lendas-do-hotel-favorito-do-rock-nroll/

https://www.vanityfair.com/culture/2013/10/chelsea-hotel-oral-history

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