Por: Vannucchi e Marinho
“Não me recordo ao certo quando
escutei o Death in June pela primeira vez, mas me lembro muito bem de
como as músicas da banda me impressionaram por sua tremenda força
mística“. – Juliana Vannucchi.
“Descobri
o Death in June em 2012, e gostei de imediato. Finalmente havia um
grupo que não havia medo de se expressar com sua estética duvidosa e
ambígua”. – Abel Marinho
O Death In June
é uma banda difícil de ser classificada. Digamos que, de alguma forma,
esteticamente é possível enquadrá-los em várias vertentes musicais
distintas, tal como Post-punk, Darkwave, Experimentalismo,
Pós-industrial, etc. Mas de maneira geral, a categorização não é um
aspecto muito relevante e, por isso, não vemos necessidade em nos
prendermos nesse tipo de detalhe.
O
que realmente é significativo aqui, é compreender que a banda produziu
músicas moldadas por componentes bastante diferenciados da maior parte
das gravações de sua época e é justamente por isso que não há paralelos,
modelos, clichês ou tradicionalismos envolvidos em seus materiais: o
DIJ oferece uma sonoridade única, estranha e, para muitos ouvintes,
assustadora. O que há neles, portanto, é simplesmente uma singularidade –
uma aura arquitetada em torno de músicas vanguardistas e extremamente
originais.
As canções que a banda
produz são sustentadas por uma aura profundamente sublime, cheia de
misticismo e que, de maneira geral, é bem hermética. Há enorme
sensibilidade na parte instrumental e nas letras. Enfim, tudo neles é
encantadoramente perturbador. O DIJ te agarra e te leva, quase que de
maneira imediata para um outro plano dimensional.
É preciso mencionar que a trajetória da banda também é marcada
por algumas polêmicas, em torno das quais há constantes comentários a
respeito do nazismo e do ocultismo como inspirações para criação de
músicas e álbuns. Aparentemente, há algum fundo de verdade nisso e
abaixo iremos abordar esses assuntos.
A banda inglesa deu seus primeiros passos como um trio, no ano de 1981. Porém, apenas quatro anos mais tarde, Douglas Pearce continuou com o projeto e, a partir de então, conta com a participação esporádica de diversos colaboradores musicais. Atualmente possuem uma discografia que conta com 20 álbuns de estúdio. Durante todo o tempo de estrada, o visual sempre foi um dos principais traços do DIJ: geralmente Pearce se veste de maneira bem excêntrica e sombria. Sobre as máscaras e vestimentas que usa desde que deu os primeiros passos no mundo da música, o vocalista declarou em certa ocasião:“Não queríamos fazer parte de uma coisa normal do Rock n’Roll. Garotos bonitos olhando para a câmera com pênis enormes e QI’s de um milhão… não funciona desse jeito”. As máscaras se tornaram mais evidentes após o lançamento de The World That Summer. Com a formação clássica da banda, contando com Patrick Leagas e Tony Wakeford, as vestimentas incluíam uniformes da SS e da Juventude Hitlerista.
OCULTISMO:
O interesse do vocalista Douglas Pearce
por religiões, ocultismo e espiritualidade é um fato por ele
próprio admitido e, portanto, os inúmeros comentários sobre a ligação da banda
com essa temática, de fato fazem sentido. Ainda que, no entanto, vocalista não tenha feito declarações claras sobre essa ligação, acredito que esse aspecto fica
explícito no conjunto das composições musicais do Death In June (tanto
em questões instrumentais e sonoras, quanto nas letras).
Em relação a este assunto, Pearce, certa vez, disse numa entrevista: “Eu
acho que meu interesse em ocultismo sempre esteve lá. Eu não sinto que
tive uma escolha em relação a isso. Quando criança, meus pais me
exorcizaram porque eu tinha visões de todos os tipos de horrores e nunca
dormia. Isso aconteceu por muito tempo, até eles recorrem a um curador
espiritual e as coisas ficaram mais calmas. Mais tarde, quando meu pai
faleceu, eu e minha mãe usávamos um tabuleiro Ouija”. Na mesma entrevista ainda fez outros dois comentários interessantes: “O
primeiro livro de Crowley que li foi o Livro da Lei, que David Tibet me
deu em 1983. Escrevemos She Said Destroy pouco tempo depois”, afirmou o músico. “Eu
acredito em deuses, demônios, anjos, sejam eles da psique interior,
outra dimensão ou qualquer coisa que seja. Eu os ouvi e vi. Eu até senti
eles me tocarem. Eles são um desafio e não devem ser menosprezados”, concluiu.
Nas
letras das músicas do Death In June, é possível encontrar indicativos
sobre isso, pois há uso constante da palavra “anjo”, além de letras que
carregam palavras como “Deus”, “túmulo”. Mas é claro que o misticismo da
banda não acontece apenas pelo simples emprego isolado de tais palavras
nas músicas, mas conforme citado anteriormente, encontra-se em todo o contexto
de suas produções sonoras.
As
canções, de maneira geral, possuem uma atmosfera sombria, por vezes,
assemelhando-se a rituais religiosos, e assim, mergulham no universo
sobrenatural, e abrem as portas para que os ouvintes também se insiram
nesse plano dimensional. Alguns encartes também expõe simbologias
bastante sugestivas, tal como caveiras, crucifixos e imagens religiosas
que demonstram as influências que o ocultismo tem sobre a banda. Enfim,
toda a estética do Death In June demonstra o interesse de Pearce pelo
paranormal. Por vezes, as canções soam de maneira realmente bizarra e
parecem um filme de terror.
HOMOSEXUALIDADE:
Pierce é assumidamente gay e já declarou
que gostaria que o assunto fosse abordado com mais frequência em
entrevistas, pois na opinião do músico, sua opção sexual sempre foi um
fator de extrema relevância para suas produções das músicas.
Com
certa frequência a banda entra no palco com a tradicional bandeira
“arco-íris” que representa o público LGBT e a deixa exposta durante a
apresentação. Além disso, no site oficial do Death in June, Pearce faz
questão de demonstrar apoio ao público LGBT e a bandeira também está
presente por lá.
A QUESTÃO DA IUGOSLÁVIA E AS GRAVAÇÕES EM ZAGREB:
Em
1992, o Death In June se envolveu em uma polêmica. Durante a guerra
civil na Iugoslávia, Pearce visitou a linha de frente e a HOS (Forças de
Defesa da Croácia, um ramo militar fascista). Pearce fez várias
gravações ao vivo no país e as lançou em dois CDs chamado Something is Coming: Live And Studio Recordings From Croatia que carregava a bandeira nacional vermelha e branca da Croácia. Todas as vendas foram para os hospitais militares.
Esclarecendo sua posição sobre essas ações, Pearce comentou a respeito para o jornal Rostov-On-Don, em sua primeira entrevista com um jornalista russo, em Novembro de 1999: “A
guerra começou dentro de um ano após minhas férias na Iugoslávia. Já
que eu estava ciente dos conflitos e tinha amigos nesses lugares, a
guerra que eu via na TV era muito mais real para mim. Amigos e fãs meus
estavam sendo mortos há duas horas de pegar um voo para Londres. Quando
ofereceram ao Death In June um concerto em Zagreb, na Croácia em 1992,
quando a guerra estava em seus primeiros passos, pensei que era natural
oferecer algum tipo de apoio moral e cultural”, afirmou Pearce.“Quando
cheguei, era pior do que eu esperava. Quando vi a quantidade de feridos
e mortos e o estado primitivo dos hospitais, sabia que eu devia me
envolver de alguma forma. Felizmente, as gravações dos shows vieram a
ser úteis, então decidi lançar “Something Is Coming”, que era um disco
duplo de gravações ao vivo e de estúdio do Death In June na Croácia. O
fundos arrecadados disso foram para essas clínicas que ajudaram a
reabilitação de soldados e civis que haviam perdido seus membros durante
a guerra”, completou o músico.
NAZISMO E FASCISMO:
Um
dos pontos mais abordados e mais controversos sobre o Death in June, é o
uso de diversos símbolos e camuflagens usados pela Alemanha Nazista,
como Waffen SS Autumnal Erbsenmuster, Totenkopf-6 (Totenkopf representa a
morte e 6 referente a Junho), Whip-Hand (de acordo com Pearce, o
símbolo é usado após uma expressão inglesa de poder e influência) e
Three Bars (utilizada pela 3ª Divisão SS Totenkopf).
A
banda já teve diversos protestos em seus shows, já foi banida de tocar
em Lausana, na Suíça e teve shows cancelados em outros lugares. Os
álbuns Brown Book e Rose Clouds of Holocaust
são proibidos na Alemanha; o primeiro por ter um sampler de
Horst-Wessel-Lid, o hino usado nas marchas da AS e mais tarde a música
oficial do partido Nazista, e o último por sido interpretado como sendo uma
negação do Holocausto e, mesmo Pearce tendo recorrido em 2006 para
explicar o significado das letras para o governo alemão, o apelo foi
negado. Em relação aos primeiros anos do Death in June, Pearce disse que “no
início dos anos 80, Tony (baixista da formação original do grupo) e eu
estávamos envolvidos em políticas radicais de esquerda. Em busca de uma
visão política para o futuro, encontramos o bolchevismo nacional,
intimamente ligada à hierarquia Sturmabteilung (milícia paramilitar
nazista lideradas por Ernst Röhm)”. Em outra entrevista, quando perguntando sobre seus interesses a respeito do Terceiro Reich, respondeu: “Eu
tenho um interesse em todos os aspectos do Terceiro Reich. Teve uma
influência tão grande sobre o mundo, quem consegue não ficar intrigado
com isso? No entanto, eu ainda li mais páginas do Capital do que Main
Kampf!”.
Note-se que no site oficial do Death
In June possui uma bandeira de Israel e eles já fizeram um show no país, em
2004, para um público predominantemente judeu. A banda anterior de
Pearce, Crisis, filiados a extrema esquerda que fez shows em comícios como Rock Against Racism e Anti-Nazi League, possui uma canção chamada “Holocaust”,
que acusa aqueles que negam a existência de Belsen e Auschwitz de
tentar “acorrentar a Inglaterra” e deixar “seis milhões de pessoas
morrem em vão”. Devido a essa natureza das
letras, quase sempre moldadas em tonalidades místicas e ambíguas, e devido á estética do Death in June, há mais dúvidas do que respostas sobre ele ser um simpatizante neo-nazista ou sobre usar simbolismos apenas para chocar o público (como muitos punks fizeram durante a década de 70).
Texto anteriormente publicado em: http://www.audiograma.com.br/2018/11/death-in-june-interessante-mas-dificil-de-explicar/
Muito bom texto .
ResponderExcluirAdorei, conheci a banda na adolescência. Usei algumas músicas como trilha sonora de uns vídeos experimentais. Não há muitos teriam traduzido. A estética é o som fúnebre deles me agradam. Há uma nostalgia e enigmática. Compartilha da sonoridade de algumas bandas da antiga união soviética.
ResponderExcluirÓtimo texto dissertativo.
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