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segunda-feira, 17 de março de 2025

HOWARD DEVOTO: DO BUZZCOCKS AO MAGAZINE

 Por Juliana Vannucchi

Sabemos que a Inglaterra é um país especial na história do rock, afinal, foi lá que surgiram alguns dos maiores expoentes desse gênero musical, tal como os The Beatles, Pink Floyd, Led Zeppelin, Sex Pistols e inúmeras outras bandas clássicas. Em meio a esse cenário inglês efervescente e tão prospero para o rock, a cidade de Manchester, localizada no noroeste do país, foi um ambiente particularmente excepcional, no qual nasceram grupos de grande importância que alcançaram sucesso mundial e que se tonraram inesquecíveis, como, por exemplo, Joy Division, The Smiths, Oasis e Magazine. Essa última banda, a mais peculiar e original do punk setentista, liderada pelo primoroso vocalista Howard Devoto, uma das personalidades mais emblemáticas do punk-rock britânico, que também foi o frontman do Buzzcocks. Devoto nasceu na cidade de Scunthorpe, mas foi apenas quando viveu em Leeds que sua vida musical começou a ser moldada. Lá, enquanto estudava no Leeds Grammar School, conheceu um sujeito chamado Richard Boon que, mais tarde, se tornaria empresário do Buzzcocks. Eles chagaram a ter uma banda que, na qual Howard tocava piano e que, conforme certa vez declarou, era muito "boba". 

Os anos setenta foram particularmente revelantes para Howard. Em 1973,  matriculou-se na Universidade de Bolton afim de estudar Psicologia. Largou o curso após um primeiro período de estudos absolutamente desastroso e passou a estudar Humanidades - área que engloba a Filosofia, a Religião, a Literatura e, em suma, disciplinas de humanas. Foi na faculadade que conheceu mais duas personalidades fundamentais  que faria parte de seu destino no universo do rock, Pete Shelley e Ben Mandelson. Ao lado de ambos, em 1976, tendo o Sex Pistols como fonte de inspiração, deu vida ao Buzzcocks, embora tenha abandonado a banda precocemente, em 1977, após o lançamento do EP Spiral Scratch e depois de fazer somente doze shows. Estava insatisfeito com o punk, que segundo ele, havia se tornado um "movimento", o que significa que havia tendências musicais específicas a serem seguidas e Devoto não compactuava com isso. Conforme declarou ao The Guardian, sentia-se, assum deslocado no Buzzcocks e precisa "explorar outros lugares". Devoto  continuava sendo um reduto elevado de criativiadade poética e talento que precisavam se expressar de alguma forma. Assim, dois meses após sair do Buzzcocks, na tentativa de produzir faixas mais distantes de um formado mais tradicional de rock, fundou o Magazine após conhecer o estudante de Artes, John McGeoch (que mais tarde, se destacaria amplamente com os Banshees). uma banda praticamente incassificável,  de cunho experimental e nada ortodoxa, que uniu cinco músicos geniais, no momento exato do tempo e espaço em que eles estavam inspirados e em plena sincronicidade. Howard Devoto já declarou que suas maiores inspirações são provenientes do glam, não do punk. As grandes influências estéticas de Devoto foram Bowie, Alice Cooper e The New York Dolls. Isso parece evidenciar-se no Magazine. As composições da banda tomaram um caminho oposto ao que era comumente produzido naquele período onde, muito gradualmente, o punk rock perdia um pouco de força no cenário musical. Assim sendo, é difícil de categorizar o grupo, pois ele não se enquadra diretamente nos moldes do punk rock, nem do universo dark, nem exatamente do pop, nem precisamente da wew wave. E eis que é neste aspecto que reside o seu grande valor: na criatividade, no fato de que, em essência, ele escapa aos padrões estabelecidos ao apresentar aos ouvintes uma vertigem niilista absolutamente única. É demasiadamente prazeroso embarcar nessa engenhosidade mística da banda e se perder no timbre assustador e deslumbrante da voz divina de Howard Devoto, que nunca sabemos para onde irá nos conduzir. Após lançar dois álbuns aclamados nos anos setente, o debut Real Life e o Secondhand Daylight, e dois na década seguinte, o The Correct Use Of Soup e o Magic, Murder And The Weather, a banda se dissolveu, voltando somente em 2011, com o inédito No Thyself, último álbum de estúdio. 

 

Devoto sempre será uma das figuras mais extraordinárias do rock, tanto pelo legado punk arquietado com o Buzzcocks, quanto e especialmente pela originalidade das músicas criadas com o Magazine.

Howard Devoto, mais tarde, chegou a se aventurar numa carreira solo que pouco ingrenou e  elaborou um projeto musical com o multi-instrumentatista Noko, chamado Luxuria que, apesar de ser interessante, também não implacou. Seu ápice enquanto artista, sem dúvida se manifestou vigorsamente com o Buzzcoks e se consolidou de maneira triunfante e definitiva com o Magazine. Cabe observar que em ambas as bandas, a composição lírica enigmática de Howard chama atenção. Certa vez, numa entrevista, em relação a tal aspecto, Devoto meditou: "As palavras existem para tentar fazer as pessoas aguçarem os ouvidos e agitarem os seus hormônios, e deixá-las preocupadas ou para obter um pouco de eletricidade. Isso não é apenas o som das palavras, vem do significado, é claro, do mar de significados – ou significados". Ateu, quando lançou seu último álbum inédito com o Magazine, Howard comentou que a religião foi um dos temas abordados nas letras e contou sobre seu passado religioso: "Fui criado na Igreja da Inglaterra, então, embora meus pais frequentassem regularmente a igreja, não havia aquela... vantagem... que uma educação católica pode ter (...) Sempre me interessei muito em saber de onde vem o impulso religioso na humanidade. Como ateu, olho para muitas práticas religiosas e penso: ‘Ooh, de onde vem tudo isso, todas essas coisas estranhas?". O músico ainda acrescentou que vê a religião como uma ferramenta de controle social. Mas suas abordagens, no geral, abarcam outras dimensões temáticas e variadas influências. Quando fundou o Magazine, por exemplo, lia obras de auotores como Proust e Dostoiévski.

Devoto sempre será uma das figuras mais extraordinárias do rock, tanto pelo legado punk arquietado com o Buzzcocks, quanto e especialmente pela originalidade das músicas criadas com o Magazine. Talvez, no entanto, o mundo nem sequer esteja suficientemente preparado para compreender e atribuir o devido valor à obra-prima deste vanguardista atípico. Sua carreira musical é um sucesso inconstestável e aliás, de acordo uma declaração do próprio vocalista, "sucesso é ter a mente em paz"...

Referências:

https://www.theguardian.com/music/2008/dec/12/magazine-howard-devoto

https://thequietus.com/interviews/magazine-howard-devoto-interview/

https://faroutmagazine.co.uk/howard-devoto-brought-punk-to-manchester/ 

https://en.wikipedia.org/wiki/Howard_Devoto

https://louderthanwar.com/howard-devoto-and-steve-diggle-of-buzzcocks-on-spiral-scratch-interview/

https://www.audiograma.com.br/2020/02/review-magazine-real-life/

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