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terça-feira, 26 de janeiro de 2021

GIRLS POWER: THE SLITS E O EMPODERAMENTO FEMININO

 Por Juliana Vannucchi

The Slits foi uma das inúmeras bandas que surgiram em meio ao caloroso e frutífero movimento punk inglês e, com certeza, foi uma das mais originais dentre todos esses diversos grupos pertencentes a cena.

A história do conjunto começou a ser escrita no ano de 1976 e, em 2010, a banda encerrou suas atividades. Os primeiros passos do The Slits foram dados quando o grupo acompanhou o The Clash em algumas de suas apresentações. O lendário vocalista Joe Strummer logo percebeu o potencial da banda e a incentivou a tocar com mais frequência. Depois disso, aos poucos, a carreira do The Slits simplesmente deslanchou. Durante o referido período em que esteve em evidência, o grupo lançou um total de quatro álbuns de estúdio, sendo que o Cut, de 1979, é o mais famoso deles e é considerado uma das melhores produções da vasta e preciosa história do punk rock. Nessa época, a formação base e clássica da banda era o trio Viv Albertine, Ari Up e Tessa Pollitt. A título de curiosidade, vale destacar que a bateria desse célebre debut ficou por conta de Budgie, que logo depois dessa contribuição se juntaria aos Banshees. A impactante capa do Cut, com as três integrantes da banda despidas da cintura para cima, se tornou icônica. A esse respeito, Albertine declarou certa vez ao The Guardian: “Queríamos uma postura guerreira, queríamos ser uma tribo (...) Sabíamos, como não estávamos vestidas, que tínhamos que parecer confrontadoras e duronas. Não queríamos ser convidativas ao olhar masculino”. De fato, a nudez presente na imagem do álbum não possui apelo sexual, e pode-se dizer que tem um viés essencialmente artístico, simbolizando a força e a liberdade femininas. Uma faixa em especial foi explosiva e se tonou o grande hino da banda: “Typical Girls”, cuja letra descreve o comportamento enlatado, fútil e previsível de garotas convencionais, que são as que não se rebelam, não reagem ao que lhes incomoda e gastam seu tempo com futilidades – convenhamos, o nosso mundo atual ainda está cheio de “garotas típicas”. A letra indaga: quem criou esse tipo clichê de garota? E fica a sugestão de que a invenção dessa personalidade vazia é simplesmente um intencional jogo um jogo de marketing.

Vale observar que a cena punk à qual o The Slits pertenceu, foi um movimento de contestação de tradições, quebra de tabus, rejeição das normas vigentes e que, como consequência dessas características, conseguiu desbancar o domínio masculino do rock, consolidando a igualdade sexual e abrindo portas para que as mulheres tivessem voz ativa, liderassem bandas, lutassem por seus direitos e, de modo geral, se arriscassem em projetos e iniciativas que não eram usuais para a época. A esse respeito, Ary Up, em depoimento na Dirty Laundry TV, comentou que o punk, como um todo, foi "um movimento essencialmente revolucionário que conseguiu mudar completamente o mundo culturalmente, filosoficamente, politicamente e musicalmente". É possível afirmar que nenhuma outra banda de rock da mesma época teve uma presença feminina tão intensa e marcante nos palcos e nos bastidores como o The Slits. As mulheres sempre predominaram na banda e comandaram e administraram tudo: o processo construtivo das canções criadas, a composição lírica e instrumental, a inventividade visual, dentre outros aspectos que as tornaram influentes para toda a posteridade.

 

A aclamada Ari Up.

Depois do influente Cut, que se tornou um dos discos favoritos de Kurt Cobain, dois outros álbuns foram produzidos no início dos anos oitenta e, por fim, o último veio em 2009, mas nenhum foi tão aclamado ou original quanto a produção de estreia.

Em termos estéticos, podemos considerar que a banda sempre foi especialmente audaciosa em sua criação musical, pois o The Slits era um projeto essencialmente desconstrutivo. O som alternativo que produzia era repleto de experimentalismos ruidosos, atípicos e compostos por pinceladas potentes de reggae e dub. Por isso, musicalmente falando, ainda que tenham despontado durante a eclosão do punk rock, de certa maneira romperam com os paradigmas sonoros pertencentes a esse universo e deram luz a um gênero mais peculiar, enérgico e incomum. Em suma, basicamente usaram o caos e a agitação do punk, misturando-os brilhantemente com ritmos afros. Certa vez, Viv Albertine, declarou ao The Guardian que sua banda foi mais revolucionária do que os Pistols pois eles e outros "eram bandas de rock, enquanto nós usávamos world music e reggae, filtrados pela nossa própria musicalidade".

Por todos aspectos sobre os quais refletimos, é possível afirmar com segurança que o grupo se destacou por sua relevância e contribuição nas esferas culturais, políticas, sociais e artísticas. Composta pelas mulheres mais rebeldes da era punk e que, definitivamente não era meninas típicas, o The Slits deu um passo a mais do que a maioria de seus contemporâneos e quebrou tabus. O legado da banda é composto por refutações, fúria e muita luta. Com muita justiça, podemos dizer que essa banda cravou seu nome na história do rock and roll e tem um papel importantíssimo em nossos tempos. 

 

É possível afirmar com segurança que o grupo se destacou por sua relevância e contribuição nas esferas culturais, políticas, sociais e artísticas.

 Referências:

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2013/jun/24/how-we-made-cut-the-slits

https://en.wikipedia.org/wiki/The_Slits

https://www.loudandquiet.com/interview/the-slits/

https://www.youtube.com/watch?v=rmscNdSQFzY

https://www.youtube.com/watch?v=1NLMU_xCCUA

https://www.theguardian.com/music/2013/jun/24/how-we-made-cut-the-slits

https://www.theguardian.com/music/musicblog/2016/jun/13/the-slits-cut-punk-music-vinyl-rerelease



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