Fanzine Brasil

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

DORMENTE: UMA EXPERIÊNCIA ALUCINANTE

 Por Juliana Vannucchi

Victor Fortes e Ítalo Riber bateram um papo com o Fanzine Brasil e contaram sobre a trajetória da banda Dormente e sobre o álbum “Abismo de Informação”, lançado em 2022. Com uma estética futurista, o duo se destaca pela originalidade de suas composições que mescla uma atmosfera sonora oitentista, com psicodelismo eletrônico e um toque temático surrealista. 

Era o primeiro sábado de dezembro. Seria um dia praticamente normal no SESC, em Sorocaba, se naquele sábado chuvoso, meus ouvidos e minha alma não tivessem sido cativados e dominados pelas músicas da banda Dormente.

Na ocasião, eu os escutei pela primeira vez quando ainda passavam o som e se preparavam para uma apresentação que aconteceria no começou início da noite. Felizmente, nesse dia eu estava acompanhada por Imira Rando, aluna de música erudita no conservatório de Tatuí que, além de ter um conhecimento musical refinado, mais cedo havia comentado comigo que uma banda talentosa tocaria no Sesc e que ela conhecia um dos músicos e também a mãe dele. Assim foi mais fácil me aproximar do Victor Fortes e trocamos algumas palavras cerca de dez minutos subir aos palcos.

Nesse encontro, eu não conseguia esconder o meu entusiasmo em relação às músicas da banda e as primeiras palavras que dirigi a ele foram uma série de elogios, além de fazer uma comparação um tanto ousada entre a música dele e o Krautrock alemão. Ousada, mas não incorreta. Definitivamente, a Dormente lembra um pouco de Tangerine Dream. E Can e Eloy e... Devo! Sim: Devo. Eles são punks também, mas somente no espírito e na atitude, pois, afinal, a banda é pautada pelo D.Y.I. Victor me contou, inclusive, que ele é responsável pela criação dos clipes produzidos pelo duo:  Todos os clipes do Parestesia, exceto o de Não tá Okay, que roteirizamos juntos, fui eu que fiz. Além de música, eu sempre gostei de mexer com audiovisual, design e animação. Muitas dessas coisas eu aprendi a fazer só para conseguir usar com as minhas músicas, pois é algo muito caro de produzir (e com razão), por todo o trabalho que demanda, então teve um momento em que eu me dediquei bastante a estudar isso e, dessa forma, a banda conseguiu economizar bastante. A maioria dos vídeos não tem um roteiro certo, apenas um conceito em que eu tento experimentar o máximo possível e ver o que sai dessas experimentações, tudo com baixíssimo orçamento.

 

A banda é capaz de tirar qualquer um desta realidade. 

A pedido meu, Victor me acompanhou até a frente do palco e, gentilmente, me mostrou os instrumentos e equipamentos que ele e Ítalo usariam no show. Eu fiquei encantada ao ver aqueles aparatos e logo suspeitei que estava ao lado de um verdadeiro gênio musical – a suspeita, posteriormente, foi confirmada. Perguntei sobre a preferência pelo sintetizador e Forts explicou que é um instrumento acessível para produção de música, pois basta instalar uns programas de synth digital no computador e já dá para usar. Mas nas palavras do músico: “É um instrumento bem caro, isso foi um dos motivos de a gente demorar tanto para começar a se apresentar”. Naquele momento, mentalmente o comparei com o Alan Vega, mas preferi não externar. E vale dizer que apesar do gosto pelo experimentalismo eletrônico, Victor comentou que o instrumento que mais domina e com o qual mais se sente familiarizado é a guitarra, embora também toque baixo e esteja aprendendo bateria. Logo depois, ele se despediu e foi ao camarim a fim de se preparar para o show.
 

"O objetivo principal da banda é fazer a galera se divertir, dançar e curtir a vibe, o resto é lucro”.
 

Alguns dias depois, tive a oportunidade de conversar com ele novamente e perguntei sobre a experiência de ter tocado no Sesc: “Foi nossa segunda participação no evento, na primeira ainda estava rolando a pandemia, então participamos do preamp e não tocamos, mas recebemos uma assessoria muito legal de uma galera foda; agora, nessa edição, tivemos a oportunidade de apresentar o nosso som ao vivo pra galera, foi nosso segundo show, ainda acertando algumas questões técnicas, mas já rolando legal”. Victor contou que a banda nasceu, sobretudo, a partir de influências provenientes de música eletrônica experimental. Na época em que começou a esboçar a primeira música, ele escutava frequentemente Boards of Canada: “Senti vontade de tentar fazer um som diferente, não igual ao dessa banda, mas tão diferente quanto. No início, era só um desafio que eu me impus, mas eu gostei tanto do primeiro resultado que saiu, que foi a música “procrastinação”, que eu mostrei ela para o Ítalo (na época era ela bem mais crua que a versão atual do álbum), ele curtiu bastante, e nisso começamos a conversar na possibilidade de criar um projeto nesse estilo, então passei semanas compondo uma música atrás da outra”. Ítalo Riber é um músico experiente, tão brilhante quanto Victor. É o tipo raro de músico “mágico” capaz de fazer qualquer projeto e produção funcionarem. Encaixa-se em tudo e dá conta de tudo. Riber me contou que a banda Dormente é bastante peculiar: Com certeza, é o trabalho mais incomum do qual já fiz parte. É a primeira vez que tive que me preparar por algum tempo em um instrumento ainda não explorado por mim, o sintetizador. Além disso, eu ainda toco ao mesmo tempo a bateria e canto algumas músicas junto com o Victor. É uma delícia sentir a independência do meu corpo quando as músicas já estão rolando. No começo dá aquele suadouro, parece que não vai dar certo, no fim tudo se encaixa e a coisa toda funciona. A superação de barreiras é uma delícia. Lembro que quando comecei a dirigir, eu precisava desligar o som para fazer uma baliza, agora nem percebo mais. A mesma coisa acontece na banda, no começo eu mal respirava, agora já consigo até pensar em outra coisa enquanto executo as músicas”. Ítalo também comentou a respeito do processo criativo da dupla e de como o estilo sonoro foi definido: “O formato de duo só veio no final do processo de produção do álbum Parestesia, que foi todo composto e gravado pelo Victor. Eu sempre contribuí com seleção de repertório, direção artística e musical, e o Victor, com a direção criativa”.

Victor também refletiu sobre o significado do intrigante nome da banda e sobre o tipo de efeito que espera que as músicas causem nos ouvintes: “Dormente é quando nos sentimos meio sonolentos, pra baixo, insensíveis. As letras são um pouco sobre isso, sobre inseguranças, frustrações, como se fosse um desabafo. Ao mesmo tempo, o instrumental é algo que te desperta, te faz dançar e sentir, então é sobre essas contradições, você despertar ouvindo Dormente. O objetivo principal da banda é fazer a galera se divertir, dançar e curtir a vibe, o resto é lucro”. Para finalizar, quero dizer, antes que eu esqueça, que esse objetivo do Victor é alcançado com sucesso e que, sem dúvida, as pessoas se perdem nas melodias psicodélicas da banda que, com suas músicas, parece conseguir romper as barreiras convencionais do tempo e do espaço, lançando os ouvintes para os universos mais fantásticos possíveis. É de tirar qualquer um desta realidade.  

Até o momento, a banda lançou dois álbuns de estúdio, “Parestesia”, de 2020, e “Abismo Informação”, de 2022. No próximo ano, pretendem viajar e tocar com mais frequência, não apenas no Brasil, mas, se possível, também no exterior.
 


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