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segunda-feira, 24 de maio de 2021

O ELETRO-PUNK REVOLUCIONÁRIO DO SUICIDE

  Por: Juliana Vannucchi

O Suicide surgiu em meio ao agito da proeminente cena nova-iorquina dos anos setenta e logo se destacou nesse meio por sua incrível singularidade musical. A banda se tornou um dos maiores nomes do Protopunk e, consequentemente, foi fundamental para a solidificação do Punk Rock, uma vez que inspirou algumas das maiores lendas desse gênero musical. Suas músicas sombrias, arquitetadas a partir de atmosferas claustrofóbicas e de brilhantes minimalismos eletrônicos continuam sendo uma grande inspiração e ainda cativam muitas pessoas. O duo obteve sucesso e reconhecimento, especialmente devido à inventividade engenhosa com que utilizavam seus aparatos eletrônicos e pelos efeitos criados em seus sintetizadores, cuja sonoridade incomum casava perfeitamente com a voz única e sublime de Vega. O Suicide esteve presente na eclosão do Protopunk e do Punk, mas não pertence exatamente a nenhum desses dois universos. Suas músicas se rebelaram contra qualquer paradigma e, por isso, podem ser justamente caracterizadas como uma verdadeira vanguarda.

 

O Suicide em ação

 

UM SANDUÍCHE PARA O DUO E UM MARTELO NA CABEÇA DE VEGA...

A história do Suicide começou em 1971 quando Alan Vega, nascido no Brooklyn,  envolveu-se com esculturas e experimentos eletrônicos que o levaram a participar do Project of Living Artists, uma oficina localizada no centro de Nova Iorque. Por acaso, nesse mesmo dia, o jovem Martin Rev entrou nesse mesmo lugar para escapar de uma  chuva torrencial. Esse estranho e ocasional encontro que a Fortuna articulou foi responsável pelo surgimento de um dos projetos musicais mais singulares e inovadores de todos os tempos. Há uma certa lenda em torno da banda, segundo a qual Vega era apaixonado pelo HQ “Ghost Rider” e uma das edições desse comic book chamava-se justamente “Suicide”, sendo essa, portanto, a fonte de inspiração para o nome do projeto musical da dupla. Mas muitos contestam essa história. Enfim, independentemente da origem do nome, o fato é que após o primeiro encontro, o duo logo começou a se apresentar em galerias locais.

Mas quando Vega e Rev começaram a fazer música, eles estavam vivendo uma situação financeira extremamente apertada. Chegaram a passar fome nesse período e houve ocasiões em que passaram o dia à base de um único sanduíche para os dois. Devido a essa circunstância, eram incapazes de comprar os instrumentos que queriam e dos quais precisavam para colocar suas ideias em prática. Dessa forma, começaram a fazer suas músicas no único instrumento que estava disponível naquele momento: um teclado Wurlitzer de 10 dólares de Rev. A esse respeito, Vega comentou numa entrevista concedida ao The Guardian: “Por muito tempo, não tínhamos músicas como tais, então, Marty chutava repetidamente seu teclado e eu batia no suporte do microfone com uma garrafa quebrada ou fazia uns ruídos horríveis saírem de uma trombeta. Então passei a gritar e, eventualmente, isso me levou a escrever letras de verdade”.

Os geniais Rev e Vega

Durante muitos anos, os shows do Suicide foram repletos de selvageria. Intervenção política e uso de gás lacrimogêneo eram coisas corriqueiras, assim como era comum que o público arremessasse objetos na dupla, tais como moedas, sapatos, cinzeiros e copos de cerveja. Mas houve episódios mais sérios, em que jogaram um machado na direção do vocalista, assim como certa vez arremessaram uma chave inglesa. Rev, a respeito dessa habitual brutalidade presente nos shows, certa vez, brincou: “A única reação que não tivemos foi ser atacado por lobos. Mas isso é só porque você não tinha permissão para levar lobos para clubes”. Por sua vez, sobre esse ameaçador caos sempre presente nos shows, Vega contou: “Comecei a carregar uma corrente de bicicleta no palco, pensando, se você não consegue vencê-los, junte-se a eles. Se a violência ficasse muito feia, o que eu poderia fazer era quebrar uma garrafa e começar a cortar o meu rosto. Isso pareceu ter um efeito calmante na multidão. Eu acho que eles raciocinaram que eu estava tão doido que nada que eles fizessem poderia me incomodar. Eu descobri uma maneira de tirar muito sangue, mas sem ficar com cicatrizes pelo resto da vida. Eu era uma bela arte. Outra coisa que fiz foi trancar as portas de saída para que ninguém pudesse escapar!”. 

Estranhamente, no entanto, houve um período em que a atitude do público simplesmente mudou: a plateia começou a dançar embalada pelo peculiar e hipnótico som do Suicide. Rev, ironicamente disse que quando percebeu isso, pensou: “Estamos acabados. Nossa carreira terminou”.

O MÍTICO ÁLBUM DE ESTREIA:

A postura do público se alterou e a banda passou a ter condições de incrementar suas composições e amadurecer suas músicas, pois em 1975, o duo finalmente adquiriu um outro instrumento. Rev investiu uma quantia de dinheiro numa caixa de ritmos dos anos 50. Dois anos mais tarde, assinaram com um discreto selo francês chamado Red Star. O primeiro álbum, chamado “Suicide”, gravado em apenas quatro dias, foi lançado em 1977, o ano mais lendário da história do Punk Rock. O célebre Craig Leon, que já trabalhou com grupos como Blondie e Ramones, foi um dos produtores do debut. De maneira geral, o álbum não foi bem visto nos EUA, mas recebeu inúmeras críticas positivas no território europeu. 

O faixa de maior notoriedade do álbum é a assustadora “Frankie Teartrop”, cuja letra narra a bizarra história de um trabalhador que, certa vez, surta e assassina sua família e depois tira a própria vida. Há um pano de fundo político por trás dessa história: a vida operária de Frankie o pressionou e ele se sentiu impotente para cuidar dignamente da família. A desgastante rotina fabril o devastou física e mentalmente e ele foi mandado embora. No final da letra, há uma possível alfinetada ao sistema:

Todos nós somos Frankies!
Todos nós estamos mentindo no inferno!

Rev afirmou que "Frankie Teardrop", "Johnny" e "Cheree" são músicas sobre pessoas que vivem nas ruas. E, especialmente falando sobre "Frankie", o músico já revelou que a letra foi baseada num caso real sobre o qual ele leu num jornal. 

“Frankie Teardrop” fascinou artistas como Lydia Lunch, Bruce Springsteen e Lou Reed que, inclusive, chegou a declarar que gostaria de ter sido o autor da letra. Além dessa música, todas as outras são igualmente qualificadas. É um álbum absolutamente magnífico. 

DISCOGRAFIA E MÚSICAS PÓSTUMAS: 

A banda se separou em 1980, após ter lançado dois excelentes álbuns de estúdio. Oito anos mais tarde, a dupla se reuniu novamente para a produção do terceiro disco, intitulado “A Way of Life”. Nessa tríade que compõe a fase oitentista, encontramos os melhores trabalhos do Suicide. Em 1992, deram à luz o “Why Be Blues” e, posteriormente, no começou dos anos dois mil, o “American Supreme”, com o qual encerraram suas produções originais. Ao longo de todas essas décadas de atividade, os dois músicos também tiveram carreiras solos bem sucedidas, sendo que Vega chegou, inclusive, a gravar com Andrew Eldrich, do Sisters Of Mercy. Alan Vega faleceu dormindo, em 2016, aos 78 anos de idade. Seu falecimento foi oficialmente comunicado ao público por Henry Rollins. 

Em 2021, o perfil oficial de Alan Vega no Instagram deixou os fãs da banda atônitos e empolgados ao anunciar o lançamento de um álbum perdido da banda que foi resgatado pela viúva do falecido vocalista. As faixas póstumas originais podem ser ouvidas através do perfil da gravadora “Sacred Bones”.

Referências:

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2008/aug/01/popandrock.suicide

https://www.allmusic.com/artist/alan-vega-mn0000932078/biography

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2017/jul/18/suicide-23-minutes-over-brussels-alan-vega-martin-rev-punk-riot-1978

https://web.archive.org/web/20110104193113/http://www.zerecords.com/2010/artists_biography.php?id=29

https://en.wikipedia.org/wiki/Suicide_(1977_album)

https://www.google.com.br/amp/s/amp.theguardian.com/music/2015/jul/10/suicide-review-veteran-electro-punks-barbican-centre-london

https://www.rollingstone.com/music/music-news/the-story-of-suicides-frankie-teardrop-the-most-terrifying-song-ever-96731/


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