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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

TALES FROM TOPOGRAPHIC OCEAN – YES:

Por: Vannucchi

"Assim como pomos de lado uma roupa usada e vestimos uma nova, assim o espírito se desfaz da sua indumentária de carne e se reveste de uma nova”. – Trecho de uma escritura Hindu.

Para compreender o conceito e motivação que levaram o álbum “Tales From Topographic Oceans” a ser produzido, é interessante que voltemos no tempo, precisamente para o dia 5 de janeiro de 1893. Nesta data, na índia, nascia Paramahansa Yogananda, um guru que, ao longo de sua vida, popularizou-se ao torna-se um dos primeiros líderes espirituais a transmitir sabedorias orientais no mundo ocidental. Seus ensinamentos e práticas meditativas, buscavam resgatar a essência divina do homem e conectar este aspecto divino universal, com a consciência individual.

Elvis Presley, George Harrison e Steve Jobs foram algumas das celebridades que se interessaram pelos ensinamentos de Yogananda. Além deles, outro admirador do indiano, foi Jon Anderson. Durante a turnê do álbum “Close To The Edge”, o músico recebeu um exemplar do livro “Autobiography of a Yogi”, que havia sido lançado em 1946. Foi a partir deste fato, que nasceu o Tales From from Topographic Oceans. Ao lado do guitarrista Steve Howe, Anderson começou a estudar o livro e, juntos, os dois foram dando forma ao disco.

As letras que compõe o Tales From from Topographic Oceans parecem tratar da jornada espiritual de um personagem que busca o autoconhecimento. Neste ponto, lembro-me de um popular aforismo inscrito nas ruínas do Templo de Delfos (Grécia): “Conhece-te a ti mesmo”. Não sabe-se ao certo quem proferiu ou escreveu essa frase. Mas certamente, ainda hoje, ela é capaz de causar bastante impacto. Diversas doutrinas religiosas e filosóficas concordam que o autoconhecimento é fundamental para a evolução do espírito. Afinal, é no mínimo, muito positivo o fato de tentarmos nos compreender, tanto fisicamente quanto mentalmente. De que valeria e/ou seria possível, concentrarmo-nos em entender o que nos cerca, ou as outras pessoas, se não temos consciência nem daquilo que somos nós próprios? 

Essa busca por nossa(s) verdade(s) individual, parece presente em trechos da faixa The Revealing Science Of God (Dance Of The Dawn). A letra narra o primeiro passo de um herói em suas buscas pela evolução pessoal. Aparecem incertezas neste momento, mas também grande confiança, que é ocasionada pela presença de forças de seres iluminados e superiores, que estão ao redor do protagonista. 

Fale com o autor da chamada luz solar (…)
Devemos ter esperado toda a nossa
vida por isso momento (…)
Vocês, buscadores da verdade, aceitando aquela razão, ficar aliviados (…)



Mencionar que o conceito do álbum aborda a jornada de um personagem, remeteu-me a uma importante obra literária chamada O Poder do Mito, escrita por Joseph Campbell, renomado especialista em Mitologia. O autor, certa vez, refletiu sobre o que denominou como sendo “A Jornada do Herói”, uma sequência cíclica de fatos que estruturam diversas histórias mitológicas. Este, é também um caminho para que pode se fazer presente na vida de qualquer indivíduo. A base da Jornada do Herói é bastante simples: começo, meio e fim, mas essa fórmula é complementada por 12 estágios, que seguem abaixo. Note-se, que tal sucessão, pode ser encontrada na história do álbum, em narrativas mitológicas (conforme já citado previamente), em roteiros de filmes, desfechos de livros e, claro, na sua própria vida como um todo, ou com fatos e acontecimentos específicos.

– Mundo Comum – O mundo normal/cotidiano do herói.

– O Chamado da Aventura – Surge um chamado.

– Reticência do Herói ou Recusa do Chamado – O herói recusa ou demora a aceitar o chamado, com medo de sair de sua zona de conforto.

– Encontro com o mentor ou Ajuda Sobrenatural – O herói encontra um mentor que o ajuda a aceitar o chamado e o auxilia no que o segue.

– Cruzamento do Primeiro Portal – O herói abandona o mundo comum para adentrar num mundo mágico.

– Provações, aliados e inimigos – Aqui, aconetcem testes, encontra-se aliados e eaparecem também os inimigos.

– Aproximação – O herói consegue as provações positivamente.

– Provação difícil ou traumática – A maior crise da ciclo. 

– Recompensa – O herói enfrentou a morte, e vence o medo, recebendo uma recompensa, que consiste num elixir.

– O Caminho de Volta – O herói precisa retornar ao mundo comum.

– Ressurreição do Herói – Outro teste aparece, e é preciso encarar a morte. É preciso colocar em prática o que foi aprendido.

– Regresso com o Elixir – O herói volta para casa tento seu “elixir”, e pode usá-lo para auxiliar as pessoas no mundo comum.

A jornada segue durante todas as quatro faixas, sempre mencionando elementos místicos (feitiços, magia, deuses…) e elementos da natureza (dentro os quais, sol, folhas, cordeiro, inverno, e outros). Por fim, na última música, aparentemente, o protagonista sente-se encorajado e confiante por sua trajetória. Esses sentimentos podem ser notados nos seguintes trechos:

Abra as portas que encontramos em nosso caminho… Nós olhamos, vemos, nós sorrimos, nós olhamos, vemos, nós sorrimos (…)
Na medida que a vida parece ser, a vida parece ser uma lutar, lutar, lutar

(…)

Nós flutuamos nas sombras e claro, o nosso caminho de volta para casa
… voando para casa, indo para casa

(…)

É possível entendermos que o herói atingiu o estado de iluminação que procurava. “Voltar pra casa”, parece indicar o número 12 da Jornada de Campbell. E vê-se em “fluamos nas sombras”, que os medos se foram e as dificuldades estão superadas. O personagem irá retornar com seu elixir, e talvez ajudar outros seres que busquem este caminho. E não seria o elixir, o próprio álbum? É possível entendermos que sim, e que o Yes nos legou esta obra como portas de entrada para para um universo espetacular em termos musicais, e que carrega reflexões intensas em cada uma das músicas. É um verdadeiro convite à jornada espiritual.

Agora, vamos à capa, pois também é emblemática. A imagem capta muito bem o tema místico das músicas. A arte é de autoria de Roger Dean, e mosyta a Pirâmide de Kukulcán (México), que foi edificada pelos Maias. Além disso, é possível notar o Macaco de Nazca, uma das instigantes grafias existentes no Peru. Estas duas figuras representam duas das civilizações mais brilhantes que já existiram, e que até hoje deixam mistérios no ar, além de muitas vezes nos induzirem à reflexões e especulações acerca de suas tradições e de seus feitos.

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