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Um breve questionamento e historio sobre o assunto.

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WOLF CITY - AMON DUUL II

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quinta-feira, 22 de maio de 2025

POLY STYRENE: A PEQUENA VISIONÁRIA DO PUNK BRITÂNICO

 Por Daniel Rezende

Texto anteriormente publicado no portal Rock Feminino

https://rockfeminino.com.br/2020/07/poly-styrene-pequena-visionaria-do-punk-britanico/

Se Patti Smith foi a “madrinha do punk”, Poly Styrene (nome artístico de Marion Joan Elliott-Said) merece o título de artista feminina mais relevante do auge do movimento punk.

Em 1976, a cantora de 19 anos formou a banda X-Ray Spex, maravilhada com o que tinha visto num show do Sex Pistols. A banda era composta ainda pelo guitarrista Jak Airport, pelo baixista Paul Dean, pelo baterista Paul Hurding e pela ainda adolescente Lora Logic (nome artístico de Susan Whitby), no saxofone. O grupo se distinguia pelos vocais poderosos e vulcânicos de Poly, suas letras marcantes e pelo saxofone de Lora – um instrumento antirock por excelência, que era usado de forma discordante e com efeitos surpreendentes.

Com esse line-up, a banda começou a fazer shows na emergente cena punk londrina. Em 1977, gravaram um dos grandes singles do punk, “Oh bondage up yours”, com seu famoso verso de abertura: “Algumas pessoas pensam que pequenas garotas devem ser vistas e não ouvidas/ Mas eu acho que, ah sujeição! Vá se f…”. Lora Logic saiu logo a seguir, e foi substituída por Rudi Thompson.

Em 1978, a banda conseguiu gravar o primeiro disco, Germfree adolescents. “Oh bondage up yours” não foi incluída na versão original, sendo acrescentada como parte do álbum somente no lançamento em CD na década de 1990.

Germfree adolescents é um soco no estômago. Um dos grandes álbuns não somente do punk, mas da década de 1970, ele tem um vigor e uma coerência impressionantes. Segue a cartilha do punk básico, mas consegue ir além com trechos de guitarra um pouco mais elaborados, uso eventual de sintetizadores e, principalmente, pelo saxofone onipresente de Rudi, que leva melodias, contrapõe-se às frases de guitarra e oferece minisolos imperfeitos.

 

A verdade é que o espírito visionário de Poly anteviu essas conseqüências daninhas há quase 40 anos atrás, e por isso suas músicas continuam atuais e relevantes.

No campo temático, Poly Styrene tinha uma predileção por escrever críticas à sociedade do consumo. O próprio nome artístico dela (em português, poliestireno) se refere ao material utilizado para se fazer produtos descartáveis. Poly era bem morena, com linhagem africana por parte de pai e escocesa por parte de mãe, e essa diversidade cultural lhe conferiu uma mentalidade aberta para enxergar os danos causados por uma sociedade excessivamente materialista e sanitizada. Ela viveu fora de casa dos 15 aos 17 anos e desenvolveu preferência por uma vida simples no campo, sem luxo e com ideais ecológicos.

O ataque ao capitalismo começa logo na abertura, “Art-I-Ficial”, que emula os Sex Pistols e mostra todo o domínio de Poly na arte de cravar uma estaca moral de forma inteligente: “Artificial!/Sei que sou superficial/Mas não me culpe/Eu fui criada com eletrodomésticos/Numa sociedade de consumo”.

Outro destaque é a genial “The Day the world turned Day-glo”, que prevê um futuro com tudo artificial e padronizado, em que materiais sintéticos recriam e se misturam com elementos naturais: estrada acrílica, carro de polipropileno, bolo de borracha, árvore de seda artificial.

Em ritmo frenético, “Plastic bag” oscila entre passagens lentas e trechos alucinados, e trás uma das mais brilhantes metáforas do consumismo desenfreado: “Minha mente é uma sacola plástica/Que corresponde a todas essas propagandas/Ela suga todo o lixo…”.

As críticas ao consumismo eram freqüentes no punk rock – com destaque para “Lost in the supermarket” (The Clash) e “Damaged goods” (Gang of Four). No entanto, ninguém ousou fazer um álbum quase inteiro sobre o tema, agregando ainda questões emergentes na época, como os impactos ambientais.

 “I can´t do anything”, por sua vez, é um poço de negativismo (“Eu não consigo escrever/ Eu não consigo cantar/Eu não consigo ler/Eu não consigo fazer nada/Eu não consigo soletrar/Eu não consigo nem ir para o inferno”), e toca na ferida da violência contra a mulher: “Freddie tentou me estrangular…mas eu acertei ele de volta com meu rato de estimação”. O senso de humor corrosivo não afeta em nada a capacidade de emoldurar uma mensagem, que fica ainda mais viva com a melodia pegajosa e os vocais debochados. 

“Germfree adolescents” bebe na fonte do reggae, contando com uma linha de baixo proeminente e um sintetizador ao estilo do clássico do hard rock “Baba O´Riley” (The Who). Poly esculhamba os relacionamentos superficiais e as fobias do mundo urbano: “Sei que você é asséptico/Seu desodorante cheira bem/Gostaria de te conhecer/Mas você está congelado como o gelo”.

A crise de identidade do mundo pós-moderno raramente foi cantada com tanta propriedade quanto em “Identity”. A falta de referências sólidas e o massacre da mídia se refletem no refrão: “Quando você olha no espelho, você enxerga você mesmo?/Você se vê na tela da TV?/Você se vê na revista?/Quando você se vê, isso te faz gritar?”

Em 1979, Poly decidiu pôr fim ao grupo. Ela era hiperativa e estava desgastada com as turnês. Entrou para o movimento Hare krishna em busca dos princípios de vida em que acreditava.

Na década de 1990, o grupo se reuniu para shows eventuais e chegaram a gravar um disco, Conscious consumer, que teve pouca repercussão. A banda ainda se reuniria em 2008 para um show em que tocaram Germfree adolescents quase na totalidade. Poly morreu em 2011, devido a complicações de um câncer de mama. O X-Ray Spex cravou seu lugar entre os grandes da era original do punk, e Poly Styrene foi a pequena gigante do punk feminino britânico, liderando uma seleção de peso com nomes do calibre de The Slits, The Raincoats e Gaye Advert (The Adverts).

É de se pensar o que Poly pensaria da sociedade atual, com as redes sociais se sobressaindo às relações pessoais, as múltiplas formas de identidade virtual, as ansiedades que decorrem do uso excessivo de smartphones, o consumo desenfreado de bens baratos e descartáveis produzidos por mão-de-obra explorada e a ascensão ao poder de governantes intolerantes e que diminuem a importância da ecologia na agenda política. A verdade é que o espírito visionário de Poly anteviu essas conseqüências daninhas há quase 40 anos atrás, e por isso suas músicas continuam atuais e relevantes.

Esse texto foi originalmente publicado no meu livro “Rock feminino”, que trás resenhas de grandes álbuns de rock feitos por mulheres. Disponível para compra em:

https://www.amazon.com.br/Rock-feminino-Daniel-Rezende-ebook/dp/B07SYL8VMW

Se quiser conhecer mais sobre rock feminino e alternativo siga meu blog no instagram: @altrockbrasi
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THE BRIAN JONESTOWN MASSACRE RETRATA A GENIALIDADE DE NEWCONB

 Por Juliana Vannucchi

O rock and roll dos anos noventa foi marcado por uma frota de novidades estilísticas e experimentalismos que, de alguma maneira, tentavam se desvincular da musicalidade punk e do universo pós-punk. Essa foi, portanto, uma década convidativa para reformulações sonoras e, não à toa, nesse período surgiram vários grupos épicos que fizeram história.

E foi justamente no início dos anos noventa, São Francisco entregou ao mundo um das bandas de rock mais consagradas de todos os tempos. Com um estilo prioritariamente psicodélico a nada convencional, surgia o banda the Brian Jonestown Massacre, cujo nome é uma referêncoa a Brian Jones e ao tenebroso massacre de Jonestown. Essa história, porém, iniciou-se em meados dois anos oitenta, período em que o grupo começou a se consolidar a partir de uma curiosa fusão sonora entre o folk rock, o indie e o shoegaze. Desde seu surgimento, a BJM, liderada por Anton Newcombe, lançou um volumoso número de álbuns e EPs, ao longo dos quais seus integrantes foram constantemente trocados, fazendo com que uma grande quantidade de músicos diferentes tenha deixado seu DNA na banda. Suas variadas inspirações e influências vão desde The Velvet Underground até My Bloody Valentine. 

No entanto, apesar dessa recorrente mudança de músicos, Newcombe sempre foi o protagonista e o fio condutor do projeto,  assumindo o papel de maestro do The Brian Jonestown Massacre. O líder da banda, que já declarou tocar mais de cinquenta instrumentos, possui uma imaginação vívida e uma profunda sensibilidade, que sempre o levaram a compor com muita intensidade e facilidade. Mas apesar desse vistoso talento, algumas atitudes violentas de Newcombe marcaram fortemente a imagem da banda e mancharam sua reputação. Houve, por exemplo, uma ocasião em que ele espancou membros do grupo. Isso ocorreu em 1996, quando todos já estavam a postos num palco, prestes a iniciar um gig. Talvez, Anton Newcombe não se importe com essa fama de bad boy que foi atribuída a ele. Afinal, curiosamente, certa vez numa entrevista, refletiu: “Eu não acredito em bem e mal. Napoleão foi um grande homem. Ele não era um homem mau. Ele não era um homem bom (…) Tipo, Deus não é bom nem mau. Deus é grande."

Numa ocasião, Greg Shaw, que é presidente da Bomp Records, de Los Angeles, comentou a respeito da personalidade complexa do líder da banda: “Ele se vê como uma espécie de sufi, então vamos nessa. Ele é como um desses personagens espirituais errantes do Oriente Médio que aparecem na sua cidade e começam a falar sobre Deus ou qualquer coisa enquanto tece um tapete. E depois contam as histórias.” Apesar de tudo, Newcombe é um músico engenhoso e de uma rara inesgotabilidade criativa. Ele próprio já se definiu como um "maníaco" em relação ao seu processo criativo: costumar entrar em estúdio, escrever durante cerca de oito horas e ficar imerso em suas gravações até que tenha em mãos a música que desejava criar.  É um gênio diferenciado. Gosta de arte conceitual, se interessa pelas emoções humanas e entende que é existe em si uma "espécie de coisa xamânica que canaliza" sabe-se lá de onde para trazer ao mundo. Inclusive, Courtney Taylor-Taylor, lead singer da banda Dandy Warhols, certa vez o descreveu como "o músico mais doido e mais talentoso que eu já conheci". Em 2004, um documentário controverso sobre o BJM, chamado “Dig!”, reforçou essa má reputação do vocalista mostrando inúmeros momentos de tensão vividos pela banda e o estilo de vida boêmio de seus integrantes. Essa produção fílmica foi responsável por banda transformar a banda num icone cult, popularizando-a em diversos cantos do mundo sendo que até hoje, muito do que os fãs sabem ou querem saber sobre sua história seus integrantes, encontra-se disponível nesse material que é tão precioso, quanto polêmico. 

O álbum mais consagrado do grupo e que mais atrai fãs é o Their Satanic Majesties' Second Request, uma obra-prima irretocável que explora diferentes texturas sonoras e esbanja brilhantismo do início ao fim. Ele, por si só, valeria a carreira inteira da banda. Aliás, se alguém tem dúvidas a respeito da genialidade de Newcombe , basta escutar o apaixonante Their Satanic Majesties' Second Request. É a produção de estúdio que mais de destaca na supreendentemente imensa discografia do BJM, composta, em geral, por trabalhos notavelmente consistentes e qualificados. 

O The Brian Jonestown Massacre é uma banda majetosa e singular, que tem o poder de transportar qualquer ouvinte para outra dimensão. Atuamente, não ninguém mais fazendo o tipo de som que esse poderoso grupo faz. São realmente únicos. Seus álbuns são refinados e sempre profundos - um deles, só inclusive, contou com um total de mais de vinte instrumentos diferentes para ser produzido. De modo geral, os discos da banda carregam um clima etéreo, solos de guitarra distorcidos e sedutores, e são uma espécie de paraíso psicodélico. Além disso, é sempre válido mencionar que o BJM é um grupo essencialmente autárquico, que opera nos moldes do DIY, administrando sua própria gravadora e estúdio. Também nunca ligaram para fama e sucesso, sendo sempre integralmente undergrounds. Enfim, é uma banda fascinante, com músicas catárticas e poéticas e é, certamente, um dos poucos expoentes famosos de rock noventista que conseguiu sobreviver em alta por tanto tempo, sempre firmes diante de uma indústria musical que tanto mudou no decorrer desse longo período.

O BJM é, sem dúvida, uma das bandas mais originais e inventivas dos anos noventa.
 
Referências:

https://www.latimes.com/archives/la-xpm-2004-oct-17-ca-anton17-story.html#:~:text=A%20lot%20of%20people%20close,politesse%20probably%20don't%20either.

https://www.theguardian.com/music/2023/feb/10/brian-jonestown-massacre-anton-newcombe-interview

https://www.psychedelicbabymag.com/2019/05/interview-with-anton-newcombe-of-the-brian-jonestown-massacre.html

https://www.theguardian.com/music/2025/feb/03/the-brian-jonestown-massacre-review-anton-newcombe-de-la-warr-pavilion-bexhill-on-sea

https://www.thetimes.com/culture/music/article/life-with-the-brian-jonestown-massacre-each-day-i-go-into-battle-9pxqfhgq6



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